O Mercosul não funciona para o Brasil, diz o professor de comércio internacional e investimento da Universidade de Harvard, Robert Lawrence. Ele explica que a união aduaneira mantém o país amarrado, mesmo com as mudanças recentes na posição da Argentina, menos hostil ao comércio exterior. Segundo Lawrence, quando há vizinhos difíceis é muito complicado ter uma união. O professor participou do Fórum Comércio Exterior, promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pela Folha de S. Paulo na terça-feira (25), em São Paulo. Em entrevista exclusiva à Agência CNI de Notícias, Lawrence fala dos desafios da economia mundial, como as mudanças estão afetando as políticas internacionais e as implicações sobre o Brasil. “Mas é importante que vocês tenham claro que é preciso fazer uma escolha. Se o Brasil optar pelas forças do mercado, os acordos comerciais fazem sentido. Se optar pela intervenção do estado e protecionismo, não tem porque falarmos em acordos”, diz. Acompanhe:
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Qual seria a melhor estratégia para o Brasil aumentar sua participação no mercado internacional?
ROBERT LAWRENCE – O desafio começa em casa. Mas o Brasil tem que escolher: quer dar forças ao mercado ou quer um governo intervencionista com medidas protecionistas? Se vocês escolherem a força do mercado, os acordos de livre comércio fazem diferença. Se você rejeitarem isso e disserem ‘queremos o governo intervindo’, não faz sentido. A primeira escolha deve ser qual sistema doméstico vocês querem ter. O crescimento do Brasil é lento, o setor manufatureiro não está indo bem e vocês precisam se perguntar: mais concorrência é melhor? Um outro ponto é que vocês precisam investir mais em educação, especialmente no ensino médio. As universidades públicas brasileiras são muito boas, mas apenas as elites têm acesso a elas. O Brasil precisa pensar na população mais pobre, porque elas também precisam de habilidades para o mercado de trabalho.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – É o momento de o Brasil negociar novos acordos?
ROBERT LAWRENCE – O Mercosul não funciona para vocês. É uma união aduaneira que mantém as mãos do Brasil atadas. Se vocês têm vizinhos difíceis, é muito dificil ter uma união aduaneira. A Argentina está mudando e eu acredito que será o melhor. Mas se eu fosse o Brasil, eu estaria buscando a Aliança do Pacífico, pelo menos para ver o que eles estão fazendo e se é possível se juntar a eles. Infelizmente a América Latina está dividida geopoliticamente em Atlântico e Pacífico. Precisamos de uma América única. O Brasil me parece global, o que é bom, mas precisa ter relações regionais mais fortes.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Qual seria o efeito de relações regionais mais fortes?
ROBERT LAWRENCE – Os efeitos são enormes principalmente para as pequenas e médias empresas. O comércio global pode ser importante para o crescimento delas e é mais fácil negociar com quem está no nosso continente do que ir para a Ásia, por exemplo. E o Brasil não precisa escolher se quer negociar com a União Europeia ou com a América Latina. O acordo entre o Canadá e os Europeus quase não saiu, por causa da Bélgica. E as negociações de vocês estão bem atrasadas. Mas o Brasil tem o potencial de aumentar suas exportações para a Europa, especialmente em agricultura. Então vocês devem negociar em várias frentes, mas a política na região tem que ser a de se estar conectado.
FÓRUM COMÉRCIO EXTERIOR
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AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – E um acordo com os Estados Unidos? Como fica a relação Brasil-EUA pós eleições?
ROBERT LAWRENCE – Não é um bom momento para se negociar com os Estados Unidos. Nós fizemos diversos acordos de livre comércio nos anos de 1990 e 2000, acabamos de fechar a Parceria Transpacífico e não estou certo de que poderemos negociar com o Brasil agora. O que vai acontecer pós-eleição é difícil de dizer. Se você observar o Donald Trump, ele faz a negociação de acordos parecer uma competição. E não é. Se impusermos barreiras aos produtos estrangeiros, vamos encarecer os nosso insumos, o que é nocivo para o comércio em geral e incluiria o comércio com o Brasil. A Hillary Clinton tem uma inclinação pela economia global, mas o partido democrata é contra o livre comércio. Não sabemos o que vai acontecer nem com a Parceria Transpacífico, que deve ser renegociada. E esse período de negociação vai passar por um momento de extrema incerteza.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – O senhor fala do protecionismo do Brasil, mas, no momento, as economias desenvolvidas estão se fechando. O que está acontecendo com o comércio global?
ROBERT LAWRENCE – O comércio global está crescendo mais ou menos igual às economias. E isso não era assim. Há cinco anos, o comércio crescia bem mais do que os PIBs. E a rodada Doha não parece que vai acontecer, porque há grandes diferenças de posição entre as economias desenvolvidas e em desenvolvimento. Atualmente, na rodada Doha há uma clara divisão do que os desenvolvidos devem fazer e o que os países emergentes devem fazer. Precisamos de uma nova abordagem na OMC.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Qual deve ser o novo papel da Organização Mundial do Comércio para favorecer o comércio global?
ROBERT LAWRENCE – O embaixador Roberto Azevêdo (diretor-geral da OMC) é um bom líder que está procurando novas ideias. Nós devemos aprender com o que está acontecendo em mudanças climáticas. Nesse tema, os países assumem responsabilidades conforme suas condições. Não há divisão entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Na OMC, devemos considerar que os países não querem ir adiante em determinados temas, então que se negocie em grupos. Uns podem avançar em investimento, então discutam investimento, outros querem acordos de serviços, que tratem dos serviços, mas que tudo seja feito dentro da OMC e não fora.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – O senhor quer dizer que o fortalecimento dos acordos plurilaterais devem ser uma alternativa aos mega-acordos regionais como o Parceria Transpacífico?
ROBERT LAWRENCE – Isso mesmo. Os plurilaterais são o caminho para fortalecer a OMC e, depois, negociamos as exceções.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – O Brasil deve continuar apostando na OMC?
ROBERT LAWRENCE – Sim, mas deve negociar acordos regionais também. Mas é importante que fique claro que o comércio cria vencedores e perdedoras, por isso, quando falamos em acordos de livre comércio há resistência. É preciso tempo para as pessoas se ajustarem e uma política de apoio para lidar com aqueles que vão perder. No fim, as empresas e indústrias vão ter que mudar e se adptar à nova realidade de que na economia global não é preciso ser bom em tudo, por isso os países devem conhecer e investir nas suas vantagens comparativas. Vocês não devem ficar inseguros, só ter a humildade de que muitas tecnologias precisam ser importadas. Mas tudo isso é dificil de ser feito num ambiente de crescimento lento. Quando a economia está crescendo, as pessoas podem encontrar outros empregos. Por isso, quando falamos em acordos de livre comércio, planejamento e esclarecimentos são importantes.
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