Indústria defende a inclusão de mais de 60 milhões de hectares de terras devolutas em concessões florestais

CNI apoia o uso sustentável de áreas públicas sem destinação. Esses territórios são os mais suscetíveis à grilagem e ao desmatamento ilegal

A indústria madeireira Madeflona, que gera uma média de 366 empregos ao ano, é pioneira em concessões de florestas públicas

O setor industrial defende a inclusão, em processos de concessões florestais, de mais de 60 milhões de hectares de terras devolutas – áreas públicas sem destinação pelo poder público, mais propensos à ação de grileiros e, consequentemente, ao desmatamento ilegal. Ao todo, são quase 30 milhões de hectares de terras federais e aproximadamente 34 milhões de hectares de áreas estaduais.

A Lei 11.284, que trata de gestão de terras públicas, é de 2006. Segundo Davi Bomtempo, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o aprimoramento das regras para a concessão florestal deve contemplar modificações que reflitam aprendizados adquiridos ao longo dos últimos 15 anos.

Conforme ele, entre os principais pontos de melhoria da legislação, está a ampliação das áreas disponíveis e o aumento da atratividade econômica das concessões florestais voltadas à exploração madeireira sustentável, o que é fundamental para manutenção da floresta em pé ao mesmo tempo que gera riquezas para comunidades locais.

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“Ao ampliar a escala de sistemas de manejo sustentável de florestas nativas, as concessões florestais contribuem para o cumprimento da meta estabelecida pelo Brasil no Acordo de Paris”, declara Davi Bomtempo. “Além disso, a manutenção da floresta em pé é importante para regularizar o ciclo das chuvas, fundamental para a segurança hídrica”. 

Regras adequadas à realidade podem ajudar a atrair novos investimentos

A atual legislação sobre gestão de florestas públicas traz amarras que desestimulam novos investimentos e, em alguns casos, inviabilizam negócios de produtos de base florestal. Para se ter ideia, dos mais de 4 milhões de hectares disponíveis para concessões florestais, de acordo com o Plano Anual de Outorga Florestal 2021 (PAOF 2021), pouco mais de 1 milhão foram concedidos até o momento.

Paulo Henrique Carneiro, diretor de Concessão Florestal e Monitoramento do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), explicou que ao longo dos anos o órgão foi adequando os processos licitatórios para atrair mais investimentos ao setor florestal. Segundo ele, as exigências eram muito maiores nas primeiras concessões, sem análise de mercado e viabilidade econômica.

Entre as questões estavam a obrigatoriedade de exploração mínima de espécies e de contratação mínima de pessoal. “Depois, observou-se que não havia mercado para todas as espécies de madeiras”, diz Carneiro. “Também não se levou em consideração nos editais a evolução tecnológica do setor com a contratação de menos pessoas para algumas etapas do processo produtivo”, destaca.

Do total de 19 contratos de concessão florestal realizados até agora, houve duas desistências e um está com indicativo de rescisão. Todos dos primeiros anos de implementação da lei, em que os editais traziam mais requisitos eliminatórios que, aos poucos, foram substituídos por critérios classificatórios. Além disso, houve um processo licitatório, em 2012, em que nenhuma empresa concorreu.

Dos mais de 4 milhões de hectares disponíveis para concessões florestais, pouco mais de 1 milhão foram concedidos até o momento, de acordo com o Plano Anual de Outorga Florestal

Esforço para reduzir a burocracia e dar racionalidade às concessões florestais

Hoje o SFB avança em duas frentes para eliminar a burocracia e atrair novos negócios. A primeira está em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e empresas para apoiar na estruturação de projetos de concessão de oito florestas públicas, que totalizam 2,3 milhões de hectares. “Essa estruturação de projetos é complexa e o intuito é ampliar a força de trabalho do SFB”, completa Carneiro.

A segunda frente é trabalhar para alterar o marco legal para reduzir a burocracia no processo de concessões, com a possibilidade de inversão de fases no edital – permitindo a análise de preço vir antes da avaliação técnica –, e prazo maior que um ano para a elaboração do plano de outorga florestal, o que permitirá que os profissionais do SFB se dediquem mais à execução do plano e à gestão dos contratos.

Além disso, o setor industrial propõe que também seja possível unir a operação de áreas contíguas de concessões que tenham o mesmo concessionário para permitir um planejamento e uma execução de forma integrada. “É importante ainda permitir o desenvolvimento de projetos de carbono nessas áreas, diversificando os serviços e aproveitando o imenso potencial de cobertura florestal voltados à perenidade do manejo florestal em áreas de concessão florestal”, completa Deryck Martins, presidente do Conselho de Meio Ambiente da Federação das Indústrias do Estado do Pará (FIEPA).

Martins também ressalta a necessidade de dar agilidade à emissão de autorização de exportação de madeira de áreas de concessões públicas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

SFB firmou parceria com BNDES e empresas para estruturar projetos de concessão de oito florestas públicas, que totalizam 2,3 milhões de hectares

Gestão integrada e informações mais detalhadas de territórios

A Benevides Madeiras, que emprega em média 290 pessoas por ano, possui duas concessões em uma área de 124 mil hectares na Floresta Nacional de Caxiuanã, no Pará. Ela conhece bem a complexidade e os custos significativos de ter de gerir dois contratos diferentes para um mesmo território.

“É trabalho dobrado que não faz o menor sentido: são dois planos de manejo, dois estudos técnicos e o sistema logístico tem de ser separado, com dois pátios para colocar as madeiras de cada concessão”, explica o proprietário Gustavo Betzel.

Outro ponto que dificulta para as empresas é a falta de informações detalhadas sobre os territórios frutos de concessão nos editais. Segundo Betzel, as empresas correm mais risco e têm mais trabalho quando não se têm informações. “Escolhemos participar da licitação porque conhecíamos a região porque trabalhávamos na área vizinha à concessão e o pessoal de inventário florestal da empresa foi conhecer antes”, relata o empresário.

Concessões florestais são instrumento para desenvolvimento econômico e social da Amazônia

A indústria madeireira Madeflona, que gera uma média de 366 empregos ao ano, é pioneira em concessões de florestas públicas. Em 2008, quando foi inaugurada, foi vencedora do processo de licitação da primeira concorrência pública florestal do país, realizada na Floresta Nacional do Jamari, em Rondônia. Ao todo, foram concedidos 17 mil hectares à madeireira.

Evandro Muhlbauer, engenheiro florestal da Madeflona, diz que é possível ver evolução significativa do processo de concessões florestais ao longo dos anos e isso é reflexo das mudanças no mercado de madeira. “Há dez anos, algumas espécies de madeiras e produtos como o alburno (parte periférica do tronco das árvores) e madeiras com menos de dois metros de comprimento não tinham mercado e hoje têm”, conta.

Segundo Muhlbauer, nas concessões florestais, a prática de manejo florestal sustentável, que ajuda na proteção da fauna, da flora, do solo e de recursos hídricos, também garante a geração de emprego e renda em cidades, sobretudo da Região Amazônica, com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). “Ele promove a inclusão social das pessoas em uma atividade sustentável não só do ponto de vista ambiental, mas econômico e social, pois a atividade madeireira é perene.” Entenda a técnica de manejo florestal sustentável no vídeo.

Muhlbauer destaca ainda que, embora a madeira seja o foco dos contratos de concessão, a floresta oferece diversidade de outros produtos e serviços, como óleos, açaí, castanha, além de ecoturismo e esportes de aventura.

Modernização da lei de concessões deve vir acompanhada de fortalecimento de órgãos ambientais

A empresa RRX Mineração e Serviços Ltda, que gera aproximadamente 400 empregos diretos e indiretos, assumiu o primeiro contrato de concessão em terras públicas em 2013. Hoje atua tanto com concessões públicas em nível estadual quanto federal. Possui três unidades de manejo florestal, com 91,5 mil hectares, na Floresta Estadual do Paru, e duas unidades na Floresta Nacional de Altamira, com quase 153 mil hectares, ambas no Pará.

Segundo o diretor de gestão florestal da RRX, Guilherme Stucchi, a forma de fazer a gestão de concessões florestais nas duas esferas de governo é diferente, o que traz um desafio maior às empresas. “Na concessão estadual, a insegurança jurídica é maior que na federal”, aponta.

Uma outra questão a ser fomentada seria a maior estruturação dos órgãos ambientais, como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), para dar mais segurança nos territórios onde há concessão. “Quando há atividades ilícitas (roubo de madeira, garimpo ilegal) em concessões, caberia a esses órgãos exercer o poder de polícia e a fiscalização. Dessa forma, a estruturação dos órgãos e estímulo as ações de fiscalização em campo são fundamentais para dar segurança jurídica nas áreas de concessões florestais” diz Stucchi.

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