Escola deve usar a mídia para desenvolver cidadania nos alunos, sugere educador italiano

Durante o Seminário Internacional SESI de Educação, Pier Cesare Rivoltella argumentou não ser possível ter “tecnopessimismo”, pois a tecnologia pode ser meio de aprofundamento de aprendizado dos estudantes

A escola pode usar a tecnologia para ampliar o tempo de aprendizagem do aluno brasileiro

“Uma das coisas mais lastimáveis para o ser humano é não pertencer a seu tempo”. Com base na frase do educador Paulo Freire, o professor adjunto da Universita Cattolica del Sacro Cuore di Milano, Pier Cesare Rivoltella, argumenta que é preciso inserir a mídia na escola para trazê-la à contemporaneidade e desenvolver a cidadania nos alunos. Segundo ele, não é mais possível ter “tecnopessimismo”, ou seja, ver apenas os problemas gerados sem considerar as oportunidades abertas pela tecnologia, como o aprofundamento do aprendizado dos estudantes. 

Rivoltella foi um dos participantes, nesta terça-feira (10), do painel “Tecnologias Educacionais: a experiência de aprender no mundo 4.0 (tecnologias educacionais, metodologias e relacionamento)”, durante o 2º Seminário Internacional SESI de Educação - Educação para o Tempo Presente. O evento, realizado em parceria com a Fundação Roberto Marinho e o Canal Futura, vai até sexta-feira, sempre das 17h às 19h no Youtube do Serviço Social da Indústria (SESI)

De acordo com o especialista italiano, as escolas precisam utilizar os veículos de mídia – rádios, TVs, jornais e redes sociais – para estimular os alunos a produzir suas próprias ideias e comunicá-las de forma concreta, assim como desenvolver neles o pensamento crítico.


“Temos de colocar a mídia na escola, seja como ferramenta, seja como ambiente de aprendizagem, seja como forma de cultura. Há necessidade de colocar a mídia na sala de aula, trabalhar com a mídia, porque a aula diz respeito a uma escola que é contemporânea a seu tempo”, argumentou.


Para ele, mais do que apenas usar o conteúdo midiático como recurso pedagógico, os professores devem buscar entender a lógica por trás da mídia para que os estudantes tenham autonomia no pensar. “A comunicação sempre tem relação com poder. E hoje é sobretudo poder de quem se apropria dos nossos dados e por meio dos dados aprende a conhecer sempre melhor o que gostamos e nossos jeitos de atuar. Isso quer dizer imaginar, prever qual podem ser os nossos desejos, nossas ideias e controlar, no final, nosso jeito de pensar”, justificou. 

Pandemia acelerou acolhida da tecnologia

Na avaliação de Rivoltella, a pandemia do novo coronavírus fez pais e professores despertarem para a importância da tecnologia, mas é preciso avançar nesse campo com criação de conteúdos específicos para os meios digitais. “A pandemia conseguiu mais em um mês do que 30 anos de livros que eu escrevi. A pandemia acelerou muito a acolhida da tecnologia pelas escolas, mas isso não quis dizer que as escolas inovaram. Inovação é problema sério. É preciso reprojetar, reimaginar e trabalhar de forma completamente nova”, explicou ele, segundo o qual não é possível simplesmente digitalizar a aula tradicional. 

“Temos de colocar a mídia na escola, seja como ferramenta, seja como ambiente de aprendizagem, seja como forma de cultura" - Pier Cesare Rivoltella

A diretora-presidente do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB), Lucia Dellagnelo, que também participou do painel, argumentou que a escola pode usar a tecnologia para ampliar o tempo de aprendizagem do aluno brasileiro, que é baixo em relação a outros países. “A escola deve ser capaz de usar a tecnologia para oferecer o ensino híbrido, integrando os momentos presenciais e remotos mediados pela tecnologia para ampliar o tempo de aprendizagem do aluno”, defendeu ela. “Alunos brasileiros passam pouco tempo na escola comparados com outros países e precisam de meios para estar engajados em atividades educativas em outros momentos que não necessariamente dentro da sala de aula.”

Dellagnelo alertou, porém, que a simples existência de estrutura tecnológica nas escolas não é suficiente para ter impacto na aprendizagem dos estudantes. É essencial capacitar o professor para que ele utilize a tecnologia como prática pedagógica; como instrumento de cidadania, ao debater suas implicações éticas e sociais; e para seu desenvolvimento profissional. “O papel do professor é o grande diferencial do uso da tecnologia para a aprendizagem e para a qualidade e equidade da aprendizagem. A tecnologia colocada na mão do professor transforma a prática pedagógica, que é como a gente consegue alguma mudança qualitativa da educação. A simples presença da tecnologia na escola não tem impacto direto na aprendizagem”, explicou. 

Com base em ferramenta de autoavaliação disponibilizada pelo CIEB, a especialista relatou que a tecnologia está se inserindo nas redes públicas de todo o país, mas ainda não é elemento de transformação do ensino. Segundo ela, mesmo diante da precariedade de infraestrutura básica em muitas escolas, o Brasil precisa investir em recursos digitais para que a tecnologia não seja mais um fator de aprofundamento da desigualdade econômica e social.

“Existe um falso dilema de pessoas que perguntam: há escolas que não têm nem banheiro e vamos investir em tecnologia? Vamos sim. É um paradoxo: a tecnologia pode criar mais igualdade, equidade, mas pode agravar as desigualdades. É importante que a tecnologia na escola seja um fator de igualdade, que se possa atingir os alunos mais vulneráveis, que possamos dar a eles o “kit igualdade” do século 21”, defendeu ela.

Tecnologia é meio para formar o profissional da Indústria 4.0

O uso criativo das tecnologias para resolver problemas reais da sociedade também deve estar no foco da escola brasileira, defendeu ainda, no debate desta terça-feira, a gerente de Educação Tecnológica do SESI, Kátia Marangon. Para ela, a escola não deve apenas responder às necessidades do mercado de trabalho, mas é preciso considerar que as crianças e jovens também precisam de formação para serem profissionais produtivos, bem sucedidos e realizados com a profissão que escolherem. 


“A rede SESI de educação oferece educação de qualidade pensando na organização e formação de profissionais para atender a indústria, para que a pessoa que passa pelo percurso escolar possa também estar apta a vivenciar  o mundo profissional. Se a gente tem gerência maior na utilização de tecnologias, podemos pensar em aumento de produtividade, criação de novas vagas de emprego e qualificação da força de trabalho”, relatou Kátia.


“Para isso, precisamos de ações que sejam acessíveis, que favoreçam a conectividade das empresas e que sejam democráticas”, complementou. 

Durante a pandemia, mencionou a gerente, 400 equipes de alunos do SESI participaram do Desafio Covid-19 de Robótica, criado para incentivar a criatividade dos jovens e auxiliar no combate ao novo coronavírus. “É uma nova construção e a gente sabe que isso é prazeroso, contribui para que realmente o aprendizado seja significativo, porque o aluno tem contato com a prática, conhece o emprego do conhecimento colocado para ele”, explicou. “Essa oportunidade de construção por projetos, e a gente vê isso muito na robótica, é uma construção coletiva, que desenvolve também habilidades socioemocionais, como o trabalho em equipe e a solução de problemas do mundo real. A gente precisa concatenar essas habilidades com as profissões que teremos no futuro.”

Até sexta-feira, especialistas nacionais e internacionais debatem temas fundamentais da escola do século 21, que estimule o envolvimento ativo dos alunos com experiências da vida real, por meio da solução de problemas, da investigação, da descoberta e da inovação. Nesta quarta-feira, especialistas debatem a necessidade de mudança na arquitetura dos espaços escolares para garantir aprendizagem. Confira a programação completa.

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