Já não é de hoje que as empresas conclamam por mudanças no escoamento de seus produtos: uma pesquisa da CNI realizada em 2022 mostrou que para 28,5% das indústrias, a ferrovia seria a peimeira alternativa para escoamento dos produtos se houvesse condições de infraestrutura adequadas.
Essa pauta está na mira do ministro dos Transportes, Renan Filho, que avalia que o principal desafio em relação às ferrovias é viabilizar novos negócios, em escala compatível com o crescimento do Brasil como exportador de commodities. Renan Filho falou sobre esse assunto em entrevista à Revista Indústria Brasileira.
“Nossa malha ferroviária ainda é pouco expressiva se comparada com a dos países desenvolvidos, o que exige esforços conjuntos para o salto de qualidade que se espera. A meta é chegar a 40% da carga transportada por trilhos até 2035”, afirma.
Confira a entrevista na íntegra:
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - O orçamento do Ministério dos Transportes neste ano é de, aproximadamente, R$ 20 bilhões, quatro vezes mais que a média dos últimos anos. Isso indica que o investimento público federal na infraestrutura de transportes será retomado?
RENAN FILHO - Ao assumirmos o Ministério dos Transportes, encontramos a maior parte da malha federal sob administração estatal coberta por contratos de manutenção, mas sem recursos para executar a conservação das estradas, além de diversas obras em ritmo lento ou paradas. A recomposição do orçamento, discutida com o Congresso Nacional ainda na transição, permitiu recuperar a capacidade de investimento pelo Estado.
Por mais que possamos ser entusiastas das concessões, o setor privado sozinho não consegue fazer frente a todos os gargalos da infraestrutura brasileira. O país é muito grande e complexo. Então, o investimento público, feito com eficiência e critério, é fundamental. Começamos o governo a todo o vapor, investindo na recuperação, na construção e na retomada de obras rodoviárias. Vamos impulsionar a operação e a expansão da malha ferroviária.
A prioridade é investir em obras estruturantes, importantes para o desenvolvimento regional, e nos principais corredores, cruciais para a nossa logística. Vamos avançar na integração dos quatro modais. Planejamos equilibrar a matriz de transporte de carga, tornando-a menos dependente das rodovias, para reduzir custos e aumentar a nossa competitividade.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Em janeiro, o senhor anunciou investimentos de R$ 1,7 bilhão nos primeiros quatro meses de governo, como parte do plano de 100 dias da pasta. O que já foi efetivamente investido em obras rodoviárias e ferroviárias?
RENAN FILHO - Até o começo de abril, já superamos a meta para os primeiros cem dias. A execução ficou acima de R$ 2 bi até o começo de abril. Também conseguimos retomar ou intensificar mais de mil contratos entre duplicações, adequações, pavimentação e revitalização. Entregamos: a restauração da ponte internacional Getúlio Vargas-Agustín Pedro Justo, entre as cidades de Uruguaiana (RS) e Paso de Los Libres (ARG), na BR-290/RS; a duplicação de sete quilômetros do lado norte da BR-101/SE, obra parada desde 2019; 15 quilômetros de duplicação da BR-116/RS, entre Camaquã e Cristal, no Rio Grande do Sul; 11 quilômetros de duplicação da BR-135/MA, entre Bacabeira e Santa Rita, no Maranhão; e 7,3 quilômetros de duplicação da BR-428/PE, em Petrolina, na saída para o Recife, em Pernambuco. Isso apenas nos primeiros cem dias. Ainda temos muitas obras por fazer. O desafio do poder público, e temos gente capacitada para isso, é executar bem os recursos, com eficiência, critério, integridade e transparência.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Quais são os novos projetos de concessão de rodovias e ferrovias federais e quando devem ser feitas as licitações? Qual é a expectativa de investimentos nesses projetos?
RENAN FILHO - Todos os projetos de concessão seguem o seu trâmite normal e todos são passíveis de ajustes naquilo que entendermos, em conjunto com o Tribunal de Contas da União (TCU) e com a sociedade, ser o melhor para o país sob o ponto de vista estratégico, dos investimentos e do interesse público. Posso assegurar que vamos fazer novas concessões. Também estamos estudando modelos de Parcerias Público-Privadas (PPPs), especialmente para ferrovias e rodovias menos atrativas para o mercado.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - O que será feito neste ano e nos próximos para aumentar a participação do setor ferroviário no modal de transporte de cargas brasileiro?
RENAN FILHO - Antes de pensarmos em investimentos, precisamos recompor a capacidade da União de financiar seus projetos prioritários. Por isso, dois temas hoje se destacam na agenda econômica: a reforma tributária e o novo arcabouço fiscal. Essas duas agendas são importantes para que o país volte a crescer com mais recursos para investir no setor de infraestrutura, sem deixar de lado a responsabilidade fiscal.
Somente com a aprovação da reforma tributária e da nova âncora fiscal, que já está bem encaminhada, teremos capacidade de investimento em 2024, 2025 e 2026 no mínimo igual ao orçamento de 2023, hoje de aproximadamente R$ 20 bilhões para ferrovias e rodovias. O principal desafio com relação às ferrovias será a viabilização de novos negócios em escala compatível com o expressivo crescimento do Brasil como exportador de commodities.
Nossa malha ferroviária ainda é pouco expressiva se comparada com a dos países desenvolvidos, o que exige esforços conjuntos para o salto de qualidade que se espera. A meta é chegar a 40% da carga transportada por trilhos até 2035. Hoje, esse percentual representa menos de 15%. Vamos tentar atrair o capital privado para concessões e PPPs.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Como os investimentos em transportes podem contribuir para melhorar a mobilidade urbana?
RENAN FILHO - Uma rede de rodovias planejadas, bem conservadas e sinalizadas, traz mais segurança e melhora a mobilidade das pessoas e a conectividade entre as cidades, regiões e até países, reduzindo o tempo de deslocamento, o que aumenta a eficiência do transporte e reduz custos para o setor produtivo. Nesse sentido, o Ministério dos Transportes trabalha em conjunto com o Ministério das Cidades, responsável pelas políticas de mobilidade, para buscar soluções em prol do avanço da infraestrutura e da segurança no trânsito no país.