A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e sua congênere argentina, a União Industrial Argentina (UIA), assinaram, nesta segunda-feira (23), uma declaração conjunta que sugere aos respectivos governos ações prioritárias para avançar nas agendas econômica e comercial bilateral e regional. O documento, firmado em nome do Conselho Empresarial Brasil-Argentina (Cembrar), foi entregue aos presidentes Lula e Fernández em encontro entre empresários e os chefes de Estado, na Casa Rosada, em Buenos Aires.
Entre as ações prioritárias estão a necessidade de acelerar o processo de negociações externas com mercados estratégicos à indústria, como o avanço na conclusão formal do Acordo União Europeia-Mercosul; a eliminação de barreiras comerciais e o progresso na implementação de iniciativas de convergência e cooperação regulatória; a colaboração bilateral em direção a uma economia de baixo carbono; a promoção de investimentos para estimular o fornecimento de energia, infraestrutura e conectividade entre os dois países e na região; e a celebração do protocolo de facilitação do comércio e desburocratização.
“Brasil e Argentina são parceiros comerciais estratégicos. Quase 90% da corrente de comércio é composta por bens da indústria de transformação, principalmente, produtos de maior tecnologia e maior valor agregado. O fortalecimento das relações trará ganhos mútuos para as economias dos dois países, com ganhos para emprego e renda da população”, afirma o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade.
A participação do Brasil e da Argentina nas exportações mundiais de bens industriais, no entanto, está aquém do potencial produtivo de ambos os países. Além disso, Brasil e Argentina têm perdido participação no comércio entre si para outros países. Em vista disso, é importante que os dois países intensifiquem a agenda bilateral para fortalecer suas relações econômicas.
Ações estratégicas devem promover crescimento sustentável dos países
Para reverter esse cenário, o Cembrar destacou, na declaração, a importância de um entendimento entre a Argentina e o Brasil para desenhar, “de forma imediata e pragmática”, uma estratégia conjunta de ações que revitalizem a agenda de integração bilateral e regional, com uma visão de inserção global e desenvolvimento da produção e da indústria. As ações, segundo o setor industrial, possibilitarão o crescimento econômico sustentável de ambos os países, com geração de emprego e mais qualidade de vida da população.
Além disso, CNI e UIA reafirmaram o compromisso com a democracia e ressaltaram a intenção, como representantes do setor produtivo industrial de ambas as economias, em colaborar ativamente no diálogo e na articulação institucional público-privada que permita avançar nas questões prioritárias listadas. Nesse sentido, sugerem a revitalização e o fortalecimento da Comissão de Produção e Comércio Brasil-Argentina – que atua na busca de soluções para a fluidez do comércio e dos investimentos entre ambos os países.
“Estamos em frente ao desafio de estabelecer, em um novo contexto global, um caminho de crescimento para ambos os países e de melhoria da competitividade e da integração das nossas economias. As ideias originais do Mercosul, de se beneficiar do mercado ampliado, ganhar escala e melhorar a qualidade de nossos produtos para aumentar a nossa participação nas exportações mundiais, especialmente de produtos industriais, permanecem válidas e devem ser o objetivo comum”, diz o documento.
Para as representantes do setor industrial, a pandemia de Covid-19 e o conflito entre Ucrânia e Rússia aceleraram as tendências anteriores de reorganização das cadeias globais de valor e aumentaram ainda mais a importância da integração regional – processo que abre novas oportunidades para expandir a participação do Brasil e da Argentina no comércio mundial.
Conheça as ações prioritárias listadas na declaração conjunta entregue aos governos
1. Estabelecer uma estratégia comum para impulsionar o investimento produtivo com base em um crescimento econômico estável
Para favorecer a integração das estruturas produtivas dos dois países, é necessário um contexto econômico e institucional que possibilite o investimento. Os desequilíbrios macroeconômicos e a mudança de orientação política interferem na existência de um horizonte de planejamento e provocam a redução do investimento, da atividade econômica, do comércio, além do aumento do desemprego e da pobreza.
Assim, é preciso recriar as condições para reverter essa situação, definindo um horizonte de crescimento sustentável com políticas estatais ativas em relação à promoção industrial e científico-tecnológicas que permitam ampliar as exportações bilaterais e globais, além de manter o equilíbrio nas contas externas das duas economias. A expansão do Sistema de Moeda Local (SML) no comércio bilateral pode ser uma ferramenta de curto prazo para avançar nessa direção.
2. Promover investimentos para estimular o fornecimento de energia, infraestrutura e conectividade entre os dois países e na região
Implementar melhorias na infraestrutura e na conectividade é essencial, e a indústria tem o papel fundamental na realização de obras que permitam o desenvolvimento energético e a agregação de valor local. As medidas promovem uma integração equilibrada de cadeias produtivas regionais de grande dinamismo recente – como alimentos, farmacêuticas, automotivas, químicas e petroquímicas, plásticos, metalúrgicas, têxteis – e impulsionam a demanda de outros setores da economia.
Também é importante se concentrar nos investimentos necessários para uma maior integração da capacidade logística e de transporte que melhore a conectividade e o escoamento das exportações, considerando a conectividade de telecomunicações e das redes para promover capacidades tecnológicas voltadas à digitalização e à eficiência produtiva e comercial. Um exemplo neste sentido é a situação da Ponte Internacional Uruguaiana-Paso de Los Libres, que liga Brasil e Argentina, onde são necessários esforços imediatos para definir uma solução.
3. Eliminar barreiras comerciais e avançar na implementação de iniciativas de convergência e cooperação regulatória
Além dos compromissos no âmbito do Mercosul, existem várias medidas restritivas e licenças entre os dois países que não apenas prejudicam o comércio bilateral e o acesso a bens e insumos, mas também inviabilizam a integração produtiva entre Brasil e Argentina. Na área regulatória, os produtos e serviços enfrentam uma gama crescente de regulamentações, com uma diversidade considerada onerosa e diferenças desnecessárias na regulamentação que constituem mais um obstáculo à integração econômica a longo prazo.
A partir dos compromissos regionais já estabelecidos, é possível avançar em direção a um entendimento bilateral de convergência regulatória em setores específicos, tornando compatíveis precauções e requisitos e criando marcos regulatórios comuns que colaborem para a integração das cadeias de valor e das economias.
O Cembrar está construindo uma série de propostas de cooperação regulatória focadas em setores industriais específicos, para fornecer soluções concretas para a convergência regulatória em relação a regulamentos e requisitos técnicos, certificações, reconhecimento mútuo de avaliação da conformidade e outros.
4. Aprofundamento dos compromissos de facilitação do comércio e desburocratização
A simplificação e a redução da burocracia no comércio bilateral podem ser melhoradas, considerando que os procedimentos formais de importação e exportação no Brasil e na Argentina seguem complexos quando comparados às melhores práticas internacionais. Embora os dois países tenham compromissos multilaterais e regionais nessa área, a relevância da relação econômica mostra que fortalecer essa agenda bilateral teria um potencial ainda maior para alcançar a redução de tempo e custos e promover o aumento dos fluxos comerciais entre as duas economias.
O Cembrar avançou na identificação de pontos de melhoria nesta área e entende que é essencial concluir um protocolo de facilitação do comércio Brasil-Argentina que inclua, entre outras questões, a implementação completa da janela única para o comércio exterior dos dois países, com diretrizes de interoperabilidade, o reconhecimento mútuo dos programas de Operador Econômico Autorizado (OEA)e uma maior cooperação entre as alfândegas, com foco na gestão coordenada de fronteiras.
5. Acelerar o processo de negociações externas, em bloco, com mercados estratégicos à indústria
A integração internacional e a necessidade de ampliar a cobertura dos acordos comerciais para além do Mercosul são pontos comuns entre Brasil e Argentina, mas é importante que a estratégia seja realizada em conjunto, dentro do bloco regional, priorizando mercados onde há benefícios de expansão e diversificação do comércio.
O Cembrar considera fundamental e urgente avançar na conclusão formal do Acordo União Europeia-Mercosul, uma vez que proporcionará benefícios para os dois países e permitirá avançar em direção a uma relação equilibrada entre as duas regiões.
6. Promover a cooperação em direção a uma economia de baixo carbono, incluindo temas como transição energética, mercado do carbono, economia circular e conservação florestal
A agenda ambiental está ganhando espaço em todo o mundo e, diante dos compromissos globais, surgem novas exigências de acesso a mercados. No Cembrar, há um forte compromisso com a sustentabilidade e a maioria as empresas está implementando compromissos voluntários e melhorias para reduzir o impacto ambiental de suas atividades. Assim, há espaço para acelerar com a agenda conjunta entre as duas nações, que avance na implementação de normas e padrões de forma tempestiva e de abrangência regional.
O compromisso deve ser de valorizar, de forma competitiva, as vantagens e o espaço de oportunidade na transição energética, de forma a equilibrar o compromisso com os objetivos do desenvolvimento produtivo, do bem-estar social e da redução da pobreza. Além disso, é importante abordar as questões ambientais sem criar barreiras indevidas ao comércio, de modo que os compromissos globais relativos aos fluxos de financiamento para esses fins sejam cumpridos.
7. Promover programas conjuntos de digitalização e Indústria 4.0
Nos últimos anos as mudanças tecnológicas aceleraram, e as empresas industriais – especialmente as de pequeno e médio porte – enfrentam o desafio de acessar e implementar novas tecnologias, principalmente para identificar suas necessidades e avançar no caminho certo da digitalização e da melhoria da produtividade. Por isso o Cembrar trabalha em ações de cooperação para enfrentar o desafio, ciente de que a região já apresenta desequilíbrio em comparação com os mercados concorrentes.
A questão central para a competitividade dos países precisa fazer parte da agenda bilateral, com programas conjuntos que promovam o investimento, a pesquisa e o desenvolvimento do uso de tecnologias digitais avançadas para a produção, com ênfase na transição para atividades produtivas mais sustentáveis. Também é preciso incluir o desenvolvimento de cadeias de valor, com economias baseadas no conhecimento, com maior potencial de exportação.