Saiba como empresas brasileiras investem na transformação digital para aumentar a produtividade

Conheça a jornada de grandes empresas que adotaram uma série de tecnologias nas rotinas industriais para tornar processos mais rápidos e eficientes

Instituto SENAI de Inovação em Biossintéticos e Fibras - Utilização do equipamento denominado Glove Box, Utilizado para o preparo de catalisador em síntese polímera

Produzir mais com menos recursos ainda é um dos maiores desafios da indústria brasileira. Para aumentar a produtividade nas empresas, um dos caminhos é a transformação digital, cujas tecnologias proporcionam eficiência e mudam processos, produtos e modelos de negócios.

Em 2021, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostrou que 86% das grandes empresas brasileiras já utilizavam tecnologias digitais, capazes de aumentar a competitividade. WEG, Tupy e Natura são algumas das empresas que, nos últimos anos, mergulharam em uma jornada de investimento em tecnologias da Indústria 4.0:

As três têm experiências próprias nesse caminho, mas têm semelhanças:

  • São brasileiras
  • Foram fundadas há mais de 50 anos, e
  • Passaram por um processo gradual de adoção de tecnologias 

Veja como as empresas estão investindo em tecnologias:

Em vez de transformação digital, a multinacional WEG fala em “evolução digital”, que se intensificou nos últimos quatro anos. “Acreditamos que melhorias se fazem por meio de evolução. A gente nunca se transformou digitalmente, a gente foi evoluindo: experimentando um robô, por exemplo, vendo como funciona”, explica Carlos José Bastos Grillo, diretor-superintendente de digital e sistemas da WEG, fabricante de equipamentos elétricos com presença em 15 países e que faturou R$ 32,5 bilhões em 2023.

Para evoluir digitalmente, a empresa, que tem 40 mil colaboradores, sendo 4.700 deles engenheiros, se debruçou sobre os conceitos da Indústria 4.0 e começou por introduzir produtos digitais nos produtos tradicionais que a WEG já fabricava, o que acelerou o processo na direção da digitalização.

Inicialmente, a empresa investiu, principalmente, em robôs autônomos, simulação de engenharia, integração de softwares e sistemas, big data, internet das coisas, manufatura aditiva, realidade aumentada e cibersegurança.


“A adoção gradual dessas tecnologias costuma ter um retorno efetivo. O processo de digitalização às vezes passa a ideia de uma complexidade adicional, mas não é isso que queremos quando se busca simplicidade. Acredito que para as empresas menores, por exemplo, esse caminho possa até ser mais interessante”.


A aplicação dessas tecnologias, para ele, acontece de forma heterogênea devido às diferenças entre os profissionais e entre as atividades industriais no que diz respeito à aptidão para a automação.

“Alguns operadores podem até ficar reticentes por uma aversão à tecnologia, já outros podem se adaptar facilmente. A própria empresa vai encontrando seus caminhos. Mas uma coisa é certa: não dá para esperar. E vemos que algumas adiam o começo por acharem que precisam ter um sistema fantástico e grande. Então podem começar a encontrar desafios como pessoas, capacidade financeira para investir, tempo. A melhor forma, portanto, é começar pequeno, mas começar já”.

Grillo dá o exemplo do sistema Manufacturing Execution System ou MES, um sistema de gestão da execução da manufatura que abarca todas as informações, como melhoria contínua e tempos de operação, o que proporciona uma base de dados relevante para tomadas de decisão.

“É um sistema simples e obrigatório para a parte administrativa da empresa. Na indústria, à medida que ela vai ganhando maturidade, é um sistema fundamental. Se você não tem dados, você não gerencia”, explica.  

Custos e ganhos

Grillo afirma que o investimento da WEG, que produz 19 milhões de motores por ano, nas tecnologias habilitadoras da Indústria 4.0 que estão mais ligadas à engenharia de produto, por exemplo, como softwares de simulação e virtualização de produtos, têm custo maior. “Nesse caso, a empresa deve gastar em torno de 10% a 15% do seu custo de engenharia para se manter atualizada nesse sentido. No caso da engenharia são custos maiores, mas inevitáveis”. 

Já na manufatura, segundo ele, o investimento em tecnologias digitais é menor. “Por exemplo, aplicar internet das coisas para medir a vibração dos motores dos equipamentos. Esse custo equivale a 1% de investimento em uma operação industrial”, conta. 

Investir na digitalização, segundo ele, traz ganhos por proporcionar visibilidade aos processos industriais, um dos pilares da Indústria 4.0. “Na WEG, desenvolvemos produtos em prazos muito curtos porque conseguimos fazer a simulação. Então, vemos a performance ainda no ambiente virtual. O que se monitora já se melhora. Se você não tem visibilidade sobre o que está acontecendo você não tem informação, apenas palpite”, compara.

homem de casaco azul, usa relógio e óculos
Carlos José Bastos Grillo, diretor-superintendente de digital e sistemas da WEG | Foto: Weg/Divulgação

Outro exemplo é aplicar um sensor no motor elétrico de uma máquina para saber se está em processo de superaquecimento ou se está em baixa operação. “Colocar sensores na máquina já aumenta a visibilidade. Então, podemos dizer que, hoje, nossas fábricas estão monitoradas e temos visibilidade para acompanhar o que está acontecendo na operação da indústria”. Em um processo de manutenção de equipamentos da fábrica de fios, por exemplo, a empresa reduziu 23% do custo de manutenção com a adoção de sensoriamento e softwares de diagnóstico antecipado de falhas. 

Além da visibilidade, Grillo cita as vantagens da adoção da inteligência artificial em atividades da empresa que exigem análise para tomada de decisões, como as áreas de vendas, de processos industriais e de marketing. “Essas ferramentas de IA estão empoderando os profissionais. Diante de uma solicitação do mercado, por exemplo, equipes de vendas conseguem encontrar em uma lista um produto que se encaixa na demanda. Isso por meio da varredura de informações que as ferramentas de IA oferecem. A IA aprende com a gente e acelera o nosso tempo de resposta”. 

Para o diretor de Tecnologia e Inovação da CNI, Jefferson Gomes, a transformação digital é quase obrigatória para as empresas industriais brasileiras e vai ao encontro da Nova Indústria Brasil (NIB), apresentada em janeiro deste ano.


“Transformar digitalmente as empresas significa aumentar a produtividade, modernizar a produção e melhorar a qualidade de produtos e serviços, o que impacta diretamente a competitividade das empresas para participarem de cadeias globais de fornecimento”, afirma.


Tupy: dados e conexões

Para a Tupy, que desenvolve produtos e soluções para aplicação em máquinas, veículos e equipamentos de diversos setores, a transformação digital é sobre tecnologia e pessoas.

Com 20 mil colaboradores em seis plantas, a multinacional estruturou um time de transformação digital com 100% das pessoas que já trabalhavam na empresa como uma aposta estratégica. A equipe de transformação digital, que é responsável por todas as plantas, é formada por colaboradores que já trabalhavam na empresa, mesmo que em outras áreas.  

“Nosso time de transformação é polivalente: tem profissionais da TI, da automação, da operação, profissionais que trabalham na fábrica. Então, quando se desenvolve uma ferramenta digital já se sabe como conectar com o operador, com o supervisor, por exemplo. Isso ajudou a superar barreiras”, conta o diretor de tecnologia e inovação da empresa, Daniel Moraes. 

Ao todo, a Tupy conta com três plantas no Brasil (Joinville, em Santa Catarina, São Paulo e Betim, em Minas Gerais). Também há uma planta em Portugal (Aveiro) e duas no México (Saltillo e Ramos Arizpe). 

A jornada de transformação digital na Tupy se intensificou nos últimos cinco anos e, para adotar as tecnologias habilitadoras da Indústria 4.0, Moraes conta que a empresa montou um comitê de Indústria 4.0, com duração de um ano. Para isso, a empresa convidou clientes de várias áreas e definiu pilares de transformação digital.


“Identificamos oito áreas de enfoque para gerar valor. Por exemplo, operações e equipamentos, até porque no Brasil temos muito mais retrofit, que é pegar uma máquina e torná-la inteligente do que comprar uma máquina zerada”, diz.


Outros pilares, segundo ele, foram gestão de ativos, manutenção, parte administrativa, clientes, desenvolvimento de pessoas, que envolve conhecimento, treinamento e formação. Além de ESG e liderança de capital aberto.

“Esses pilares são construídos por tecnologia. Quero entregar qualidade. Então, do que preciso? De redes, de conectividade, de capacidade de coletar dados. Então preciso de internet das coisas industriais. Nesse caso, revisamos nossas conexões de campo para podermos fazer as máquinas se conectarem. Ou seja, agora que eu tenho dados preciso transformar esses dados em informação”, explica.

homem escreve em quadro com pincel colorido
Daniel Moraes, diretor de tecnologia e inovação da Tupy

Graças a essa reestruturação para a jornada de transformação digital, atualmente, os processos industriais da empresa contam com uma diversidade de tecnologias. Uma delas é o reconhecimento virtual de imagens. “É barata e promissora. E, quando você pega qualquer câmera, consegue fazer a imagem e transforma em dado, pode aplicar para controle de processos e para segurança do trabalho, por exemplo”, detalha.  

Para mergulhar na transformação digital, Moraes diz que há dois caminhos. Um oferece uma adoção das tecnologias com ações bem focadas e com resultados de curto prazo. O outro, que foi a escolha da Tupy, é gradual. “O primeiro caminho é mais limitado porque fica dentro do processo, da máquina. O outro caminho é fazer de forma mais estruturante, que é pegar toda a fábrica, a infraestrutura básica de comunicação, conectar todas as máquinas adequando-as de forma estruturada e começar a gerar dados que são guardados em bancos de dados. Tendo essa conexão tem-se uma estrada”, relata.

Segundo o diretor, não há certo nem errado, mas ele acredita que o caminho da convergência de tecnologias proporcione resultados mais elevados, embora exija mais tempo. “Ou é uma corrida de 100 metros rasos ou uma maratona de 42 quilômetros”, diz.  

O melhor caminho para as empresas se transformarem digitalmente é o da simplicidade, para Moraes. “Simplifique o tema. Tire a pressão de que sua empresa só será digital se for indústria 4.0. A tecnologia não é um fim, é um meio, e ela tem que estar a serviço da empresa. O ideal é ir aos poucos, coletando dados. Além disso, encontrar parceiros. Os grandes saltos tecnológicos que tivemos foram fruto de parcerias com universidades, centros de pesquisa e ICTs”, finaliza.

Natura&CO: robôs colaborativos e impressoras 3D

A caminhada da Natura&CO, multinacional brasileira empresa cosméticos, também se intensificou na direção de se tornar uma indústria altamente digitalizada. A empresa, que conta com 16 mil colaboradores na América Latina, apostou no uso intensivo de tecnologias como internet das coisas e computação em nuvem.

“Isso permitiu integração e análise de dados sem precedentes em nossa cadeia produtiva. A implementação de uma variedade de sistemas interconectados nos permite operar com maior segurança, agilidade e produtividade”, diz a diretora de Manufatura e QSE América Latina, Denise Leal.

Denise destaca que, nos últimos anos, a empresa passou pela digitalização completa do processo produtivo, desde os parâmetros operacionais e controles até especificações de qualidade e geração de indicadores de desempenho.

“Todas as informações são digitalizadas e acessíveis de maneira democrática dentro da empresa. Isso não apenas melhora a transparência e a comunicação entre as equipes, como também nos permite tomar decisões baseadas em dados em tempo real”, conta.  As três fábricas da Avon, incorporada à Natura&CO em 2020, também iniciaram, no mesmo ano, essa jornada de transformação digital. 

Entre as tecnologias da Indústria 4.0 nas quais a empresa de R$ 27 bilhões de receita (dados referentes à América Latina em 2023) investiu e que já estão integradas aos processos estão robôs colaborativos e sistemas de visão de alta precisão nas linhas de embalagem de produtos. Segundo a empresa, essas tecnologias aumentam a precisão e a velocidade, além de garantirem a segurança dos colaboradores. 

“Também utilizamos impressoras 3D para a confecção de peças de reposição sob demanda, o que reduz significativamente o tempo de inatividade das máquinas e aumenta a confiabilidade dos equipamentos. Os simuladores de processos produtivos são outra ferramenta valiosa, que nos permite modelar e testar novos projetos com alta precisão antes de implementá-los, otimizando os resultados e reduzindo os riscos”, explica Denise.

A diretora também conta que a empresa investiu em planos de manutenção impulsionados por dados, o que permite realizar intervenções específicas com base em necessidades reais. “Isso aumenta a eficiência e reduz o tempo de inatividade. Os sistemas de planejamento de linha aproveitam esses dados para otimizar os setups de máquinas e melhorar a produtividade, ajustando-se dinamicamente com base nas informações de estoque e desempenho”.

Além disso, para o controle de qualidade, a empresa avançou no monitoramento remoto da vida útil de moldes junto a fornecedores estratégicos, o que permite prever e prevenir paradas de produção e, assim, garantir a continuidade e a eficiência dos processos.


“Concluímos que a integração dessas tecnologias da Indústria 4.0 não só otimiza nossos processos produtivos, mas também reforça nosso compromisso com a segurança, qualidade e sustentabilidade, o que prepara a empresa para os desafios futuros do mercado e da produção industrial”.


Mas, assim como na Weg e na Tupy, a jornada de digitalização da empresa foi gradual e começou com a conscientização e a compreensão das tecnologias da Indústria 4.0.

Segundo Denise, ao investir em transformação digital a empresa eliminou tarefas repetitivas, aumentou a confiabilidade e acelerou a velocidade de resposta, o que proporcionou mais agilidade nas tomadas de decisões.

“Esse aprimoramento contínuo dos processos resultou em um aumento da produtividade e uma operação mais eficiente, gerando maior valor para o negócio de maneira sustentável. Além disso, a transformação digital tem um impacto profundo na competitividade da empresa, pois nos permite responder mais rapidamente às mudanças do mercado e às necessidades dos clientes”.

Missão 4: Transformação Digital

A missão 4 da Nova Indústria Brasil (NIB) trata da transformação digital da indústria para ampliar a produtividade nas empresas. Segundo o Comitê Gestor da Internet no Brasil, de 2021, somente 23,5% das empresas industriais são digitalizadas.

Entre os desafios da missão estão ampliar o uso de plataformas digitais nacionais em vários setores. A meta para 2033 é transformar digitalmente 90% das empresas industriais brasileiras. 

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