Deu no NY Times: jovem mostra o caminho para estudar fora do Brasil com bolsas de estudo

Trajetória de Juan Teles, 17 anos, demonstra o potencial transformador da educação, mesmo diante de negativas e adversidades

Olhando em retrospectiva, a vida de Juan Teles parece ter muito mais do que 17 anos. Pasme comigo: ele fundou um clube de relações internacionais na escola, se tornou pesquisador pelo CNPq, fez intercâmbio na Argentina, ganhou bolsa de estudos do New York Times e, mais recentemente, despachou a mala e a coragem para concluir o Ensino Médio em uma prestigiada escola em Varsóvia, capital da Polônia. Ele é o primeiro brasileiro a entrar na Akademia High School com bolsa integral, de mais de R$ 500 mil. A meta é ser diplomata, se possível formado em Columbia, uma das melhores universidades dos Estados Unidos.

A história de Juan deixa pouca margem para questionar o quão longe a educação pode te levar. Na outra ponta, também ilustra como encontrar e agarrar as oportunidades, sobretudo se você vem de uma família simples no Brasil, é um trabalho hercúleo, uma prova de resistência, uma dedicação quase integral. Mas funciona assim se você tem um sonho. Pelo menos pra ele.

Pode ser o entusiasmo da juventude falando, claro. Pode também ser a inesperada sabedoria de um garoto de 17 anos.

Juan nasceu e foi criado em Salvador (BA) por duas mulheres: sua mãe, Clícia Andrade, e sua avó, Rute Boaventura. Essa vontade de conhecer o mundo falou pela primeira vez quando ele tinha uns 10 anos. É uma conta difícil de fechar se, para fazer um intercâmbio no exterior, como desejam quase metade dos brasileiros entre 15 e 29 anos, é preciso desembolsar entre R$ 35 mil e R$ 500 mil, segundo uma pesquisa da Infomoney.  

E então, aparece o SESI

As janelas começaram a se abrir quando ele entrou para a escola de Retiro do Serviço Social da Indústria (SESI), em Salvador, no 9º ano. Ali, fundou o 1º Clube de Relações Internacionais da escola e participou de algumas das maiores conferências estudantis da ONU.

Mas o divisor de águas, mesmo, foi ter entrado no grupo de pesquisa SMOTES (Sistema de Monitoramento do Tempo e Estudos Socioespaciais), considerado por ele um passo importante para ganhar bolsas de estudos no exterior posteriormente. “Em todos meus processos, disseram que o projeto de pesquisa foi o que me tornou destaque para ser aceito, com certeza fazer pesquisa mudou minha vida”, explica.

Com o SMOTES, Juan se tornou bolsista pelo programa de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O professor de Geografia da Escola SESI Retiro e orientador do projeto, Anderson Rodrigues, deixa claro que os jovens enfrentam o mesmo rigor exigido de outros pesquisadores do CNPq. 

Um olho na sardinha, outro na bolsa de estudos

O projeto de Juan se dividiu em duas frentes: solução econômicas e visibilidade às realidades sociais. Foi no Porto de Sardinhas, da Bahia, que o estudante conheceu a história de mais de 2,7 mil mulheres tratadoras de sardinhas, que trabalham duro, muitas vezes mais de 12 horas, para tirar um sustento que pode nem chegar a um salário mínimo”.  

“Elas vendem o quilo do peixe a menos de R$ 1,60, o que significa que para conseguir R$ 1 mil por mês, precisam tratar 1 tonelada de sardinha”, explica Juan. O projeto contou com uma parceria com o SENAI CIMATEC para encontrar uma solução para o resíduo do manuseio das sardinhas, que, segundo ele, pode chegar a 10 toneladas diárias. O grupo desenvolveu uma farinha proteica que pode ser utilizada pela indústria PET, na composição de rações. O resíduo também pode ter potencial para a indústria cosmética, pelo óleo, e para o setor de energia, pelo biogás.

“Redigi um artigo científico que explicava as duas frentes da pesquisa. Primeiramente, chamar atenção para as condições trabalhistas e trazer uma solução econômica e sustentável para o desperdício da sardinha”, afirma o estudante.

Deu no New York Times

Além dos projetos de pesquisa e das atividades curriculares obrigatórias, cumpridas com excelência, Juan aprendeu três idiomas – inglês, espanhol e francês.

Entre janeiro e fevereiro, deste ano, em um programa de desenvolvimento de língua espanhola, organizado pela Universidade Nacional de Córdoba, Juan passou um mês na Argentina, com uma bolsa parcial de estudos.

Pelo programa, ele teve aulas em espanhol e participou de um projeto de voluntariado, com foco em imersões culturais. “O curso era voltado em desenvolver o espanhol de forma fluente, com nativos. Conheci pessoas de vários lugares e era a única pessoa de 16 anos”, relembra.

O conhecimento é fundamental para quem, como ele, busca uma chance de estudar no exterior. E não faltaram inscrições pra Juan até aqui. “Não” é uma palavra que pouco o intimida.

“O que posso dizer para qualquer pessoa que sonha em ser aprovado em um programa no exterior é: não desista na primeira tentativa. Poderia listar todos as rejeições que recebi, o que importa no processo é se esforçar e continuar”, comenta o estudante.

Se Juan teve inspiração pra seguir em frente, certamente sua mãe, Clicia Nascimento de Andrade, e sua avó, Rute, são duas delas. Técnica em Segurança do Trabalho, Clicia ela se desdobrou pra fazer o filho ter as melhores oportunidades.

Quando o “sim” começou a aparecer, veio escrito em letras MAIÚSCULAS. No primeiro semestre de 2022, Juan se tornou o único brasileiro aprovado no programa de verão de 3 semanas do The School of the New York Times, para o qual recebeu uma bolsa integral para cobrir os R$ 50 mil reais do programa.

Entre julho e agosto, Juan viveu em Nova York, onde teve aulas nas principais universidades da cidade, como Columbia e Fordham University, e estagiou na redação do maior jornal americano e um dos mais prestigiados de todo o mundo.

“Nos EUA, eles têm muito a cultura de dupla graduação, então deram vários insights sobre focar em outros cursos e depois em um mestrado de jornalismo”, explica. A experiência ajudou a jogar luz na escolha de carreira e ele pretende cursar relações internacionais. Além do certificado, Juan voltou com excesso de bagagem: novos conhecimentos, amigos e ainda mais vontade de atravessar o mundo. 

A Polônia é logo ali

Em um processo seletivo que demorou mais de um ano, em 2022, Juan foi aceito na Akademia High School, em Varsóvia (Polônia), com uma vaga para concluir o ensino médio em uma das melhores escolas de Ensino Médio da Europa. Ele desembarcou em setembro na instituição, preparatória para as universidades mais bem ranqueadas do mundo. Agora a meta é ser admitido Columbia.

Seus professores atuais se formaram em escolas de prestígio, como Oxford e Harvard. A grade da escola incluiu as disciplinas básicas, mas também aulas eletivas, como a de direito. “Fico impressionado com o currículo de todo mundo, especialmente dos professores, é algo que não me acostumei ainda. Eles são extremamente simpáticos e têm me ajudado muito com a adaptação”, diz.

A simpatia, no entanto, não tolera atrasos, ao contrário da cultura brasileira.  “Se eu atrasar 2 minutos, isso vai para o histórico escolar, o que está me fazendo ter muito mais controle da minha rotina e horário”, garante.

Além da vaga superconcorrida, Juan também recebeu uma bolsa integral de quase R$ 500 mil reais, convertido ao valor da Złoty – moeda do país.  Mais uma vez, ele se tornou o primeiro brasileiro a entrar na escola com bolsa completa de estudo.

Isso inclui a hospedagem, em um internato da Akademia. “É muito engraçado, porque moro com outros 25 estudantes, tenho um quarto só pra mim e acesso à lavanderia, academia e cozinha. É estranho falar que moro num hotel, mas tá sendo bem divertido”, comenta.

“Eu sinto saudade e certo medo, sabe? Apesar de me sentir sozinho algumas vezes, também me sinto muito orgulhosos de mim e grato por tudo. É uma mistura de emoções. Tem dias que não tenho vontade de levantar da cama com saudade da minha família e amigos, mas eu saio na rua e vejo o que tô vivendo, eu sei que fiz a escolha certa!”, conta.

A mãe concorda.

“A saudade é tanta que não sei nem descrever, mas quando falo com ele e vejo aquele sorriso, aquela empolgação, vejo que fiz a coisa mais certa do mundo.”

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