Capacitando para transformar: conheça iniciativas do SENAI para os quilombolas

O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial tem várias ações para impulsionar a criação de empregos e melhorar a vida das comunidades quilombolas espalhados pelo Brasil

“A nossa realidade como quilombola foi sempre de luta e resistência.”

A declaração é de Maria da Penha Gonçalves da Silva, moradora do quilombo Pedra D’Água, na Paraíba, e descreve a dura realidade desses povos, desde a fuga da crueldade da escravidão até o esquecimento dessa comunidade por parte das autoridades.

Os quilombolas estão espalhadas por todo o Brasil, mas as dificuldades no acesso à saúde e à educação unem todos eles. Maria da Penha explica que existe um médico que vai até Pedra D’água uma vez por mês, mas a visita é insuficiente para tanta demanda. Para se consultar, ela enfrenta uma caminhada de duas horas até o distrito mais próximo, há 20 km de distância.

“Para ir ao médico, saio de madrugada e vou até Pontina para preencher uma ficha pedindo a consulta. Ainda tenho que voltar outro dia para agendar, e mais outro para encontrar o médico”, relata.

Até hoje o quilombo Pedra D’Água não tem escola. Maria diz que estão construindo uma unidade e que a comunidade aguarda ansiosamente: “A gente vai se encher de orgulho e esperança. Não estávamos acreditando mais que haveria uma escola, uma escola do quilombo”, comemora.

A quilombola trabalha há três anos como costureira, fazendo modelagem e criando peças por encomenda. Ela não imaginava que iria seguir essa profissão. Conta que tudo começou quando resolveu abraçar a oportunidade que o Serviço Nacional da Indústria da Paraíba (SENAI-PB), em parceria com o Instituto Alpargatas, ofereceram: um curso gratuito de modelagem de vestuário.

“O SENAI nos acolheu de braços abertos. Ele não quis saber a nossa origem, a nossa cor de pele. Lá, adquirimos conhecimento e habilidade no corte e na modelagem. Depois de concluir o curso, apareceram várias pessoas querendo fazer parceria com a gente aqui da comunidade”, relata.

Maria hoje faz da costura o seu sustento e a perspectiva por dias melhores: “Agora que ganho meu próprio dinheiro, vou construir uma casa para morar com meu filho, e focar no meu crescimento pessoal”, conta.

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Depois de fazer um curso no SENAI-PB, Maria começou a trabalhar como costureira e hoje tira o seu sustento da nova profissão

Inovação para seguir em resistência

Alagoas é o estado que abriga o mais famoso povoado de resistência negra no país: a comunidade quilombola de Palmares, localizado há 80 km de Maceió. Para incentivar o turismo e o empreendedorismo no estado, o SENAI-AL lançou o programa Mocambos na região dos Quilombos, em dezembro de 2022.

“O Mocambos é, basicamente, um programa de estímulo ao empreendedorismo inovador, no qual a gente ajuda empreendedores locais, aquelas pessoas que tem ideias de negócios inovadores. O SENAI vai oferecer todo apoio por meio de mentorias, capacitações ou orientações técnicas e disponibilização de ambiente tecnológico, para que eles tirem a ideia do papel e saiam do programa com seus protótipos”, explica Maicon Lacerda, gerente executivo de Inovação e Tecnologia do SENAI-AL.

Das mais de 50 inscrições na última edição do programa, 15 foram selecionadas para participar da capacitação do SENAI, com duração de seis meses. Os cinco melhores projetos vão receber um prêmio de R$ 20 mil cada.

Djalma Roseno Filho, quilombola da comunidade Jussara-AL e professor de empreendedorismo turístico da escola estadual Rocha Cavalcanti, é um dos participantes. O projeto dele mescla culinária local com história e ancestralidade. “No Sabores do Quilombo a gente faz cocadas com sabores exóticos: gengibre, pimenta, cacau, café e maracujá. Cada cocada traz o nome de um personagem histórico do quilombo, como Zumbi dos Palmares”, explica.

Para Djalma, participar do programa Mocambos é uma oportunidade de crescimento e disseminação da cultura dos quilombos. “A grande maioria dos quilombolas vivem da agricultura familiar. Exportar a nossa história e cultura é um dos propósitos desse projeto. E o SENAI tem ajudado a alimentar a nossa expectativa e a superar os nossos limites”, conta.

A sede do projeto fica em União dos Palmares. O SENAI, por meio da parceria com as prefeituras municipais, oferece um carro para os participantes saírem de suas comunidades e irem até o local da mentoria.

A equipe Sabores do Quilombo vai até União dos Palmares uma vez por semana para receber a consultoria, e uma vez por mês eles vão até o Hub SENAI de Inovação e Tecnologia, em Maceió, para estudar e conhecer novas formas de aperfeiçoamento do produto.

Djalma orienta quatro alunos com o projeto Sabores do Quilombo

“Eu vejo esse trabalho como um resgate da identidade afro-brasileira. Na nossa sociedade ainda é difícil enxergar e reconhecer o papel de personagens históricos que são negros. Quando trabalhamos, aqui no caso na cocada, certos líderes da nossa história, como Zumbi foi, cria-se no estudante uma outra visão do que é ser negro”, pondera.

Capacitando para transformar    

Wesley Trindade mora na comunidade quilombola de Juquiri, no município paraense de Moju, há 130 km de Belém. Ele cursava Química Industrial na Universidade Federal do Pará (UFPA), mas precisou pausar os estudos por causa da distância e falta de recursos para assistir às aulas na capital.

Mesmo para fazer um curso no SENAI, Wesley precisaria se deslocar até a sede de Moju, pegar um ônibus até Abaetetuba (21 km) e então outro meio de transporte para Barcarena (36 km), onde fica a unidade mais próxima - um percurso de quase duas horas de ônibus.

A oportunidade bateu à porta quando o SENAI-PA, em parceria com a empresa de alumínio Hydro, ofereceu cursos profissionalizantes na própria comunidade quilombola do Juquiri. Wesley recebeu seu certificado de Operador de Munk em dezembro do ano passado.

“Para conseguir uma formação dessas, eu precisaria fazer uma longa viagem e arcar com os custos. Assim, eu consegui fazer de graça e aqui no nosso espaço. Foi uma experiência bastante nova para mim e tenho certeza de que vai trazer muitos benefícios para a minha trajetória profissional”, comemora.

Formação de alunos quilombolas no município de Moju como parte do Programa de Capacitação Profissional, iniciativa da Hydro em parceria com o SENAI

Foi assim que Wesley se tornou um dos cem alunos quilombolas a receber o certificado no município de Moju pelo Programa de Capacitação Profissional para promover o desenvolvimento sustentável e autossuficiência financeira dessas comunidades.

“A Hydro criou o Programa de Capacitação Profissional e contratou o SENAI para executar os cursos de capacitação. Nesse processo foram oportunizadas 140 contratações. A partir dessa formação, o profissional estará qualificado para o mercado, podendo atuar em empresas de diversos segmentos da economia”, explica Eduardo Bustamante, gerente de Diálogo e Engajamento da Hydro.

Para Dário Lemos, diretor regional do SENAI-PA, a parceria com a empresa foi um dos muitos exemplos de trabalhos desenvolvidos no âmbito da responsabilidade social. “Não medimos esforços para promover qualificação profissional de excelência, impulsionar a criação de emprego e renda e, consequentemente, melhorar a vida das pessoas, sempre respeitando seus valores e singularidades, como no caso das comunidades quilombolas de Moju”, afirma.

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