Revisão do marco regulatório pode atrair investidores para o setor de gás natural, diz professor da UFRJ

Edmar Almeida afirma que redução do preço do combustível depende do aumento da concorrência em todas as etapas da cadeia de produção, transporte e distribuição do combustível

O aumento da produção de gás natural e da concorrência no mercado do combustível estimulará o desenvolvimento da indústria e da economia brasileira. A avaliação é de Edmar Almeida, do professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador do Instituto de Energia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ).

Ele destaca, no entanto, que são necessários grandes investimentos em infraestrutura para levar o gás das plataformas em alto mar até a indústria e outros consumidores.

 “Por isso, é necessário organizar o mercado para que os investidores tenham confiança para fazer os investimentos em gasodutos de escoamento, em plantas de tratamento de gás e gasodutos que levem o gás até o consumidor”, diz Almeida nesta entrevista concedida à Agência CNI de Notícias.

Leia a entrevista:

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS - Com a expansão da exploração da exploração do pré-sal, o Brasil tem chances de ser um grande produtor mundial de gás natural?

EDMAR ALMEIDA - O pré-sal já transformou o Brasil em um grande produtor de petróleo. A produção que hoje é de 3 milhões de barris por dia e vai aumentar ainda mais e deve alcançar 5 milhões de barris por dia. Até 2030, o Brasil pode até dobrar a produção. Isso também aumentará a produção de gás natural, pois o petróleo tem gás natural associado. A questão que fica é o que será feito com esse gás natural. O gás associado pode ser reinjetado nas plataformas para produzir mais petróleo ou levado até o mercado por meio de gasodutos.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS - Quais as vantagens do aumento da produção de gás natural?

EDMAR ALMEIDA – Hoje, o Brasil é importador de gás natural e o combustível tem uma participação muito tímida na matriz energética brasileira. Em resumo, o Brasil consome pouco gás e um gás caro, porque precisa importar. Isso penaliza o desenvolvimento do país e de vários segmentos da indústria, como o siderúrgico e o petroquímico, que precisam do gás natural como fonte energética ou como matéria-prima.  Então, o aumento da produção é uma chance de promover o desenvolvimento desses setores e do país.  

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Quais os obstáculos para a expansão da produção de gás natural no Brasil?  

EDMAR ALMEIDA – Não há dúvidas que a produção de gás natural aumentará. Mas para o gás ser produzido na plataforma em alto mar, a 200 quilômetros da costa, e chegar até uma indústria em São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro ou outro estado, é precisa fazer muitos investimentos em infraestrutura. Esses investimentos são altos e precisam ter garantia de mercado. Por isso, é necessário organizar o mercado para que os investidores tenham confiança para fazer os investimentos em gasodutos de escoamento, em plantas de tratamento de gás e gasodutos que levem o gás até o consumidor.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Quais são os principais desafios da regulamentação do Novo Mercado de Gás Natural? 

EDMAR ALMEIDA - O Novo Mercado de Gás Natural é uma tentativa do governo de mudar a regulamentação do setor para criar um ambiente de competição que dê segurança aos investimentos na infraestrutura para levar o gás natural até o consumidor por outros agentes. Hoje a empresa que faz isso é a Petrobras. A indústria de gás no Brasil se desenvolveu a partir dos investimentos feitos pela Petrobras. A estatal foi responsável pelos investimentos na infraestrutura de escoamento, nos gasodutos de transporte e até na distribuição. Mas desde 2014, a Petrobras decidiu, seja por crise financeira ou por estratégia, não investir mais neste segmento.  Então é preciso rever o arcabouço regulatório do setor para que outras empresas se sintam seguras para entrar neste mercado.  Hoje a percepção de risco de quem pretende colocar dinheiro nessas infraestruturas é muito grande. Eles não têm certeza de que poderão vender o gás para os consumidores. Então, o grande desafio é rever o marco regulatório para viabilizar esses investimentos.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – A redução de 40% nos preços do gás natural prevista pelo governo é factível?

EDMAR ALMEIDA - Com certeza.  O preço do gás natural vendido no Brasil é muito alto quando comparado ao dos outros países. Isso tem a ver com o monopólio setor. Além de conceder a um único produtor o poder de mercado para fixar preços, o monopólio é ruim porque cria uma série de ineficiências. Na medida em que se criar um ambiente de competição, haverá pressão para baixar custos ao longo da cadeia. Em um ambiente de competição, as margens de distribuição serão reduzidas. Também haverá uma preocupação para reduzir os custos de transportes, porque quem tiver preços muito altos perderá mercado. Acho fundamental introduzir a concorrência para buscar a meta de redução dos preços.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Qual o papel dos estados na queda dos preços do gás natural?

EDMAR ALMEIDA – O papel dos estados é fundamental porque a distribuição e a comercialização do gás natural para a indústria e os consumidores são monopólios dos estados. Se os estados não promoverem a competição neste mercado, todo o esforço do governo federal será em vão, pois a competição se materializa na venda ao consumidor. É fundamental permitir que outras empresas disputem esse mercado, não apenas a distribuidora que hoje têm o monopólio da comercialização.

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