Desafios do afastamento e retorno ao trabalho

Segundo gerente-executivo de Saúde e Segurança na Indústria do SESI, Emmanuel Lacerda, a redução dos afastamentos é fortemente afetada pela qualidade das ações de prevenção da incapacidade para o trabalho

Os afastamentos causados por acidentes e doenças relacionados ao trabalho são um grande desafio para o governo, para as empresas e para os trabalhadores no Brasil. Considerando apenas o impacto nos custos previdenciários, que giram em torno de R$ 11 bilhões ao ano, a questão já merece uma atenção especial.

Para as empresas, a ocorrência de afastamentos, especialmente aqueles de longa duração, implica na perda, temporária ou permanente, de trabalhadores muitas vezes capacitados para o exercício de funções específicas. Além disso, há responsabilidade do empregador por encargos e custos adicionais como o pagamento do salário nos primeiros quinze dias após o afastamento, a contratação de substitutos e o ônus no seguro contra acidentes de trabalho. 

Já os trabalhadores afastados por um período muito extenso têm redução na renda familiar, uma vez que, na maioria dos casos, os valores dos benefícios são menores que sua remuneração. Há ainda grande risco de implicações psicossociais associadas à inatividade.

Diante desse cenário, cresce a necessidade de uma atuação integral, coordenada e tempestiva junto ao trabalhador, com o objetivo de reduzir os afastamentos e promover o rápido retorno ao trabalho. Estudos internacionais revelam que o tempo de afastamento é a variável chave nesse processo. A probabilidade de retorno reduz-se a 50% para os afastamentos maiores do que 90 dias. 

No caso do sistema previdenciário brasileiro, o tripé de serviços de proteção contra acidentes de trabalho – benefícios, reabilitação clínica e profissional e prevenção de acidentes e doenças – é de alta complexidade operacional e com baixa articulação entre os diferentes atores. Isso resulta em aumento dos custos no pagamento de benefícios e na não redução dos trabalhadores afastados. 

Entre 2014 e 2016, o número de benefícios concedidos por doença, acidente ou morte no ambiente laboral ficou praticamente estável, em torno de 821 mil. Já a reabilitação profissional, outra atribuição do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), que visa reinserir segurados acidentados ou doentes no mercado de trabalho, entre 2006 e 2013, teve sua efetividade reduzida de 55,5% para 48,2%. No período, houve aumento de 121% no número de trabalhadores em reabilitação, totalizando 57.956 beneficiários.

As instituições públicas envolvidas neste sistema possuem competências legais específicas, princípios, prioridades e gestão próprias que não necessariamente se harmonizam na operação, o que acaba por não assegurar a preservação e manutenção da capacidade produtiva do trabalhador.

O sistema de proteção do trabalhador conta também com a assistência em saúde realizada pelo SUS. Apesar de englobar uma ampla gama de serviços – como atendimento médico, psicológico, fisioterápico, assistência social e fornecimento de próteses, órteses e instrumentos de trabalho –, há baixa efetividade nos resultados de reabilitação e elevada pressão sobre o sistema público de saúde. Isso se deve à falta de conhecimento e familiaridade com as questões relacionadas às doenças ocupacionais e as relações com a incapacidade para o trabalho.

A situação é agravada pela prevenção de doenças e acidentes não ser tratada de forma prioritária no sistema de seguro de acidentes de trabalho, já que a indenização do seguro de acidente de trabalho é voltada à incapacidade e não necessariamente à doença. Esse modelo restringe o retorno do trabalhador, mesmo apto para outras atividades, e impede a melhora em seu quadro de saúde ao não considerar que o ambiente de trabalho adequado é fator que contribui para a saúde e qualidade de vida dos indivíduos. 

A incapacidade ao trabalho apresenta determinantes mais amplos, que não são prevenidos apenas com estratégias direcionadas a evitar o acidente, a doença ou a promover a saúde. Neste sentido, é fundamental considerar outras dimensões biológicas, psíquicas e sociais dos indivíduos, já que a incapacidade é resultado da interação entre uma disfunção apresentada pelo indivíduo, como preocupações e percepções sobre o trabalho, e aspectos que envolvem o  ambiente, como condições de trabalho ou atitudes dos atores envolvidos no processo de permanência, de reabilitação e de retorno ao trabalho. 

Naturalmente, a redução dos afastamentos é fortemente afetada pela qualidade das ações de prevenção da incapacidade para o trabalho. Essas iniciativas são capazes, inclusive, de reduzir o reaparecimento de doenças ou sintomas e, portanto, a duração total dos afastamentos.

A complexidade relacionada aos afastamentos por acidentes e doenças e a multiplicidade e fragmentação da atuação dos entes envolvidos são determinantes para um cenário de baixa eficiência do sistema de proteção ao trabalhador. Uma harmonização dessas atividades pode ser alcançada a partir de novas formas de gestão do afastamento, com uma participação ativa das empresas e a utilização de processos inovadores de prevenção que considerem uma visão ampliada sobre os fatores que influenciam a incapacidade do trabalho.

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