Entenda os desafios na aplicação da nova legislação trabalhista

Juristas e especialistas comentam pontos positivos e possíveis questionamentos à lei que promete modernizar as relações de trabalho no país a partir de novembro

As novas regras entram em vigor no dia 11 de novembro

A Lei nº 13.467/2017, que alterou mais de 100 dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entrará em vigor em novembro deste ano e traz, como principal mudança, que os acordos entre empresas e trabalhadores do país passarão a ser regidos por regras alinhadas às formas contemporâneas de trabalhar e de produzir, podendo ser negociadas sob amparo das novas regras. Esse é o espírito da legislação que, segundo avaliação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), bem como de juristas e especialistas, passa a prestigiar o diálogo entre empresas e trabalhadores na busca por soluções mutuamente benéficas para o seu dia a dia. E mais: sem reduzir ou excluir direitos trabalhistas assegurados na Constituição Federal.

Para o presidente do Conselho Temático de Relações do Trabalho da CNI, Alexandre Furlan, é fundamental que empresas, trabalhadores e a população em geral tenham clareza sobre o que vai mudar. Ele ressalta que é fundamental que as normas recém-aprovadas sejam aplicadas com responsabilidade. “Temos trabalhado para fortalecer e articular nossas redes para difundirmos informações corretas. É preciso contrapor as notícias falsas que têm circulado, explicando bem a nova lei e as mudanças que ela promoverá na prática para a sociedade de maneira geral”, afirma.

Há, todavia, segundo os analistas, temas pouco claros que poderão chegar à Justiça até as lacunas serem devidamente reguladas por lei. Há questionamentos sobre a possibilidade de contratação de autônomos ou sobre o trabalho de gestantes e lactantes em ambientes insalubres. Além desses, há ainda a alteração da natureza jurídica de determinadas verbas que atualmente têm caráter salarial e que passarão a ser consideradas indenizatórias, como abonos, prêmios, ajudas de custo e diárias.

Para os especialistas, a reforma traz muitos benefícios ao país ao facilitar a captação de investimentos, estimular o empreendedorismo e reduzir os custos para a gestão de um negócio. “Afinal, há um desestímulo para a instalação de novos empreendimentos em regiões com índices elevados de judicialização das relações de emprego, em uma lógica na qual os procedimentos criam instabilidade na gestão empresarial”, destaca Wilson Sales Belchior, do escritório Rocha, Marinho e Sales Advogados. Para Belchior, a reforma trabalhista veio para ajudar na recuperação social e econômica do país. Ele entende que é preciso “desencorajar o acesso descontrolado à Justiça do Trabalho”.

Já o sociólogo José Pastore acredita que a nova legislação trabalhista reduzirá, em curto prazo, os gastos de empresas com ações judiciais. No médio prazo, avalia, poderá aumentar o número de contratos em regimes que a reforma passou a regulamentar, como o do trabalho intermitente ou teletrabalho (home office), contratação de autônomos e terceirização de atividade-fim. “Isso vai otimizar o tempo e elevar a produtividade, o que estimulará o investimento e a geração de emprego”, pontua.

Para a desembargadora aposentada Maria Aparecida Pellegrina, a maioria das mudanças nos artigos da CLT ajudará a recuperar o país do quadro de emprego atual. “Merecem aplausos, entre outros itens, a rescisão de contrato de trabalho por acordo mútuo e a questão de planos de cargos e salários que podem ser revistos e atualizados por meio de negociações entre empresas e trabalhadores, sem necessidade de homologação sindical ou registros destes no sindicato ou no Ministério do Trabalho”, destaca a magistrada.

No mesmo sentido, José Márcio Camargo, professor do Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, considera que a nova lei vem para proteger trabalhadores em situação de informalidade ou precariedade. “Entre os 20% mais pobres, a taxa de desemprego é de 23%, e 61% dos empregos estão na informalidade”, diz.

João Fábio da Silva Fontoura, sócio do Bornholdt Advogados, vê, na nova lei, a chance de mudança na rotina das empresas. “Apenas para citar uma das inovações, é preciso imaginar o impacto da prevalência do negociado sobre o legislado para a visão estratégica dos departamentos de gestão de pessoas. Atualmente, as empresas encontram um quadro rígido de obrigações em temas como férias, jornada de trabalho ou remuneração. Com a possibilidade de negociar esses assuntos com mais liberdade, apresenta-se um novo horizonte e uma nova maneira de se pensar as relações de trabalho”, acentua.

No tocante ao trabalho intermitente, que passa a ser regulamentado, a advogada Ana Paula Barbosa Pereira, especialista em direito trabalhista, diz que as regras para o tema merecem destaque, por se tratar de modalidade de prestação de serviços usualmente praticada no contexto atual.

“Em razão das amarras ao texto da CLT, o trabalho intermitente só podia ser contratado na informalidade. Essa hipótese, contudo, desprivilegia não só o trabalhador, que deixa de receber verbas de natureza trabalhista constitucionalmente garantidas, mas impacta consideravelmente na economia do país, que encontra, nos meios informais de trabalho, um entrave para o crescimento do PIB nacional”, afirma Ana Paula.

Quanto à jornada de trabalho, o advogado Alexsander Fernandes de Andrade, sócio da DGCGT Advogados, entende que ela deveria mesmo “ser revisitada” e flexibilizada atendendo às necessidades das partes interessadas. Ele explica que, “entre os inúmeros itens, a falta de regulamentação do trabalho remoto (home office), que é uma tendência mundial, gerava insegurança jurídica às empresas que praticavam a modalidade de trabalho a distância e corriam o risco de serem demandadas pelo pagamento de horas extras”. Para ele, a reforma trabalhista é, em grande parte, positiva e traz oxigenação à legislação em vigor, “que estava defasada e distante das necessidades do atual mercado”.

 

MODERNIZAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO
Entenda as principais mudanças que entram em vigor em 11 de novembro

Como era Como ficou
Convenções e acordos coletivos de trabalho
Constituição Federal reconhece convenções e acordos coletivos de trabalho, porém, anulações de cláusulas coletivas eram frequentes na Justiça do Trabalho, sem que fosse comprovado qualquer vício de consentimento (vontade) do trabalhador.
Convenções e acordos coletivos de trabalho
A nova lei valoriza a regra constitucional da negociação coletiva, estabelecendo que o que for negociado entre as partes prevalecerá sobre o legislado, dentro do prazo máximo de 2 anos. A prevalência valerá, por exemplo, quando se dispuser sobre jornada de trabalho, banco de horas anual, intervalo de almoço, remuneração por produtividade, troca de dia de feriado. 
Controle de jornada
Toda empresa com mais de 10 empregados é obrigada a manter registro de ponto por meio manual, mecânico ou eletrônico, de acordo com especificações do Ministério do Trabalho.
Controle de jornada
Mantida a regra atual, mas se permite a definição da modalidade de registro da jornada de trabalho por meio de negociação coletiva ou individual (para o empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o teto máximo da Previdência).
Jornada 12x36
Não havia regulamentação de caráter geral para adoção dessa jornada. A jurisprudência (Súmula 444/TST) considera válido esse regime em caráter excepcional, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho. 

Jornada 12x36
Por acordo individual escrito, convenção coletiva, ou  acordo coletivo de trabalho, faculta às partes estabelecer horário de trabalho de 12 horas seguidas por 36 horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação. 

Negociação individual
A lei diz que as relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação entre empregado e   empregador em tudo que não contrarie às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
Negociação individual
Mantém a livre definição das relações contratuais, acrescentando que os empregados com nível superior e salário igual ou maior que duas vezes o teto do INSS podem estipular, livremente, os termos de seu contrato, com a mesma eficácia dos instrumentos coletivos quanto às matérias que podem ser negociadas, como teletrabalho e banco de horas anual, entre outros.

 

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