1 ano de SESI Lab: um prédio no cruzamento de Brasília que abriu caminhos do conhecimento

A revitalização do icônico edifício Touring, na capital federal, transformou a dinâmica do Setor Cultural Sul a partir de um projeto arquitetônico sustentável

Há um ano, o Bloco A do Setor Cultural Sul, em Brasília, se consolidou como hub de arte, ciência e tecnologia a partir de uma revitalização que virou referência nacional e internacional para arquitetos e urbanistas. O SESI Lab está no centro da capital federal, onde os eixos Monumental e Rodoviário se encontram exatamente no ponto central da “cruz” do Plano Piloto. Oscar Niemeyer projetou esse espaço tão icônico na época da construção de Brasília e coube ao Serviço Social da Indústria (SESI) ressignificar o uso do prédio para abrigar o museu 100% interativo em formato inédito no Brasil. E de forma sustentável. 

A escolha do endereço para a implantação do SESI Lab levou em consideração uma série de fatores, como a importância histórica e arquitetônica do bem cultural no contexto de Brasília e a localização estratégica e central, que facilita o fluxo de visitantes numa região onde circulam cerca de 600 mil pessoas por dia. Além disso, foram consideradas características arquitetônicas do edifício, um grande pavilhão moderno, com estrutura independente dos fechamentos, que permite grande espaços internos e ampla flexibilidade de usos.

Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) também participou da elaboração do projeto, junto com o Exploratorium e a Expomus, como instituição com foco na educação profissional. "Foi um processo extremamente participativo e intenso, porque eram conhecimentos, olhares e tempos diferentes, e a gente precisava conectar isso de uma forma inteligente, mas muito generosa, no sentido de absorver todo aquele potencial que nós tínhamos na agenda", ressalta a superintendente de Cultura do SESI, Cláudia Ramalho.

Quem encarou a missão de ressignificar o antigo Touring foi o arquiteto Gustavo Penna. O mineiro, com 50 anos de carreira, integra o conselho curador da Fundação Oscar Niemeyer e é reconhecido internacionalmente por suas obras, como a Expominas e o Memorial da Imigração Japonesa, em Belo Horizonte, o Museu de Congonhas, em São Paulo e o Monumento à Liberdade de Imprensa.

Coube a ele unir passado e presente. “Minha ligação com essa cidade é visceral. Isso faz parte do meu repertório de significado e símbolos. Conheci Lúcio Costa quando fiz estágio no Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Ele era o coordenador e me ensinou a olhar a arquitetura brasileira e colonial. Além disso, sou membro do Conselho Curador da Fundação Oscar Niemeyer e, portanto, tive muito contato com o mestre Oscar, que escreveu sobre o meu trabalho. Meu pai, Roberto Penna, é pioneiro de Brasília e construiu Catetinho”, comenta Penna.

De forma geral, as características originais do imóvel foram preservadas, tanto na volumetria geral e fachadas, como na configuração da cobertura com pilares e vigas. Na intervenção realizada em 2014 para implantação do terminal rodoviário, foi acrescida uma cobertura metálica e houve alteração no piso do pavimento térreo para criação de plataformas de embarque e desembarque de passageiros. Também foram alterados o desenho das vias de acesso e dos canteiros, com criação de área de manobras e estacionamento para ônibus, descaracterizando o desenho original do paisagismo, com suas formas orgânicas, além da supressão de diversas árvores.

“O desafio maior foi partir de uma estrutura de concreto, com vãos definidos e nervuras que formam o grande caminho do projeto, com seu ritmo de sombras. O prédio não sofreu alterações no que ele tem de emblemático e demos a ele permeabilidade, superfícies absorventes, luminotécnica, conforto térmico e uso das plantas do cerrado no paisagismo”, explica o arquiteto.


“O edifício foi feito pelo Oscar Niemeyer na época da fundação de Brasília, mas ele continua gerando valores para o futuro”, comenta.


Daniel Mangabeira, sócio da BLOCO Arquitetos - escritório de Brasília inserido na lista do site nova-iorquino Architizer como o terceiro melhor do país - acompanhou a revitalização do prédio, esteve no canteiro de obras em alguns momentos e partilhou da experiência com Gustavo Penna. Na avaliação de Mangabeira, todo edifício público deve ser aberto a reinterpretações do futuro. “O SESI Lab é hoje uma representação do que podemos ser como nação criativa e democrática, que investe no futuro da criança e do adolescente”, explica.

“Todo edifício público deve ser aberto a reinterpretações do futuro. O museu agora não está apenas adaptado a essas possíveis alterações, mas antevendo e predeterminando essas mudanças”, destaca o ex-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do DF. 

Um bem cultural tombado e de múltiplos usos

Desde 2007, o edifício é um bem cultural tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), inscrito no Livro do Tombo de Belas Artes nº 731. Além do tombamento individual, o prédio foi inserido no perímetro tombado do Conjunto Urbanístico de Brasília (CUB).

O projeto de arquitetura e restauro para a implantação do SESI Lab foi desenvolvido a partir de um primeiro plano conceitual concebido pelo SESI e o Exploratorium, em 2019. A intervenção proposta respeitou as características originais do edifício, tais como a planta livre, a transparência das fachadas, a conexão com as áreas externas e o grande avarandado que permite fazer do edifício um mirante privilegiado do centro da capital federal.

Devido à importância estratégica do local como área de grande circulação urbana e ponto de conexão entre diferentes locais da cidade, o SESI firmou termos de cooperação técnica com o Governo do Distrito Federal, entre eles o que insere o museu no projeto “Adote uma Praça”. A adesão garantiu a revitalização de mais de 33 metros quadrados de área pública nos arredores do museu, como a passagem subterrânea que dá acesso à Praça Zumbi dos Palmares. Atualmente, um espaço multiuso para eventos, exibição de filmes e espetáculos teatrais, garantida a livre circulação de pessoas. Um verdadeiro corredor cultural que dá acesso direto ao painel inédito de Athos Bulcão, projetado à época da construção de Brasília, mas que só saiu do papel na revitalização para abrigar o museu interativo.


“A revitalização do edifício do SESI Lab foi fundamental para o Setor Cultural Sul. Além do fim dos sinais de abandono que afetavam negativamente a área, a cidade ganhou com um novo espaço cultural, que tem a cara de Brasília. Um belo projeto que é também um exemplo de intervenção de edifícios de arquitetura moderna tombados, de forma respeitosa, valorizando o projeto de Oscar Niemeyer”, elogia o presidente do Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leandro Grass.


É no Programa Arquitetônico e Urbanístico, inserido no Plano Museológico do SESI Lab, que estão registrados os elementos que ajudam a contar a história do edifício e de como ele se tornou um museu. Como foi planejada a ocupação interna e externa, quais foram os critérios de escolha e as motivações que levaram à sua configuração atual, e quais são as relações com os órgãos de patrimônio e as possibilidades que a arquitetura e a implantação urbanística oferecem para a construção de uma nova conexão desse espaço com a cidade. Além de projetos complementares de climatização, iluminação, estruturas e acústicas.

Um museu como espaço de sustentabilidade ambiental

O SESI Lab foi desenvolvido de acordo com os parâmetros do sistema de rotulagem norte-americano LEED® (Leadership in Energy and Environmental Design). Uma certificação para edifícios sustentáveis de alto desempenho, a partir de uma pontuação dada de acordo com critérios de racionalização de recursos.

O projeto de sustentabilidade do museu interativo foi desenvolvido pela LabCon, assessoria especializada em controle tecnológico de materiais, visando à Certificação Leed, que está em fase de análise documental.

Mesmo em tão pouco tempo de inauguração, os parâmetros sustentáveis seguidos na revitalização já renderam reconhecimento pela Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa). Em julho deste ano, em cerimônia alusiva ao Dia Mundial da Água, o museu foi agraciado com o Selo Adasa – Guardiões da Água. Somente o SESI Lab e um condomínio residencial de Águas Claras receberam o selo educativo voltado ao reconhecimento pelo uso racional com ações de aproveitamento de água da chuva, bem como pelo reuso de água cinza. 

Conheça as características sustentáveis do prédio do SESI Lab

• Processo Integrado (IP): integração entre os projetos desde a fase inicial de estudo preliminar até a finalização da obra.

• Localização e Transporte (LT): avalia se o local tem fácil acesso a transporte público e incentiva os usuários a usarem esse meio. Inclusão de paraciclos e reserva de vagas de estacionamento para veículos verdes e carros elétricos.

• Espaço Sustentável (SS): projeto paisagístico com foco no bioma local (no nosso caso, o Cerrado), com uso de espécies nativas. O espaço externo, além de proporcionar atividades culturais e educativas, promove a biodiversidade e restabelece parte da hidrologia natural do terreno.

• Eficiência Hídrica (WE): ao usar espécies nativas, o projeto paisagístico minimiza o uso de água para irrigação. Reuso de água pluvial, águas cinzas e uso de equipamentos economizadores. Economia de água potável em 82%. 

• Energia e Atmosfera (EA): o projeto economiza o uso de energia por meio de equipamentos de climatização eficientes, vidros com baixo fator solar e venezianas para sombreamento. Há painéis fotovoltaicos para geração de energia renovável, o que abastece cerca de 22% do consumo

• Materiais e Recursos (MR): incentivo à reciclagem de lixo através da disposição de lixeiras em diferentes locais. Deve ser incentivado o reuso de materiais para mitigar a geração de resíduos.

• Qualidade do ambiente interno (EQ): estímulo à qualidade do ar com a proibição do fumo nas áreas internas e perto das entradas, instalação de filtros nos equipamentos de ar condicionado e projeto de iluminação de alta qualidade.

• Inovação (IN): profissional acreditado LEED presente na fase de obras, desempenho exemplar na redução de uso de água do interior e produção de energia renovável.

E qual é a relevância da LEED?

Ele foi concebido em 1999 pela ONG americana U.S. Green Building Council (USGBC), com o objetivo de desenvolver a indústria da construção sustentável, usando forças de mercado para conduzir a adoção de práticas de “Green Building” em um processo integrado de concepção, implantação, construção e operação de edificações e espaços construídos. Atualmente é utilizado em mais de 160 países, tendo grande destaque e visibilidade no mercado de edifícios sustentáveis.

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