Nova legislação trabalhista respeita Constituição e tratados internacionais, afirmam juristas

Especialistas ouvidos pela Agência CNI de Notícias entendem que a reforma trabalhista não violou tratados internacionais ratificados pelo Brasil ao valorizar e dar segurança à negociação coletiva

A modernização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em vigor desde novembro de 2017, busca consolidar no Brasil um novo e moderno marco para as relações do trabalho. Entre dezenas de inovações trazidas pela Lei nº 13.467/17, a principal foi a valorização da negociação coletiva, ao prestigiar o diálogo entre empresas, empregados e seus sindicatos na definição de regras e rotinas específicas às realidades em que estão inseridos. Tal premissa está balizada no art. 7º da Constituição e nas Convenções n.98 e 154 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Ratificados pelo Brasil, em 1952 e em 1992, respectivamente, as convenções são tratados internacionais que foram incorporados à legislação nacional. Ambas instam os países signatários a tomar medidas de estímulo à negociação e o fomento ao diálogo. A Confederação Nacional da Indústria (CNI)  entende que a reforma trabalhista valorizou e sedimentou seus conceitos na legislação, não tendo relação alguma com supressão de direitos ou com precarização do trabalho e, por isso, não viola as duas convenções que tratam do tema.

Para explicar o que está em discussão, a Agência CNI de Notícias perguntou a juristas e ex-ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) se, em sua opinião, a nova legislação viola, de alguma forma, quaisquer preceitos da Constituição Federal e de tratados internacionais ratificados pelo Brasil. Leia o que disseram:

Gelson Azevedo, ex-ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) 
O art. 611-A, da CLT, além de não se contrapor, antes se alia às Convenções no tocante à liberdade sindical e à voluntária negociação coletiva, ademais de reconhecer ao art. 7º da Constituição o merecido status de norma supra legal, prestigiadora de uma e de outra e incentivadora da negociação coletiva. Ou seja, penso que o art. 611-A, da CLT, está em consonância com as Convenções mencionadas, ademais de evitar que supra legalidade citada possa vir em prejuízo da necessária proteção do trabalhador, daí a especificação de seus limites (o permitido e o proibido) no interesse social, complementados pelo disposto no art. 611-B, da CLT.

Vantuil Abdala, ex-ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST)
A lei não viola, não agride, sequer arranha as duas convenções da OIT. Se temos uma lei autorizando a negociação coletiva, não creio que possa estar a violentar uma convenção. Em segundo lugar, o que dispõem os artigos 611-A e 611-B, pelo contrário, se dá no mesmo sentido do que sempre propalam e propugnam nas convenções, de que a solução dos conflitos do trabalho se dão por meio do acordo com o mínimo de intervenção do Estado e de terceiros. Como a própria lei respeita os direitos básicos previstos na Constituição, me parece que a norma da reforma se encaminha de libertar o sindicato do estigma de incompetência, de não ter a liberdade suficiente para negociar.

Nelson Mannrich: A negociação coletiva deve envolver quem tem a capacidade de decidir o que lhe é mais favorável

Nelson Mannrich, professor titular da Faculdade de Direito da USP e presidente honorário da Academia Brasileira de Direito do Trabalho
Não há argumento, não tem consistência dizer que é um atentado à Convenção nº 98 nós incentivarmos a negociação, sendo que está na Constituição. A negociação coletiva deve envolver quem tem a capacidade de decidir o que lhe é mais favorável, que é quem está à mesa – não aquele que quer interferir na autonomia dos atores sociais. Não se pode (na negociação) invadir o campo da ordem pública (direitos em patamar constitucional), o resto pode ser negociado. Tem de valer a regra da intervenção mínima. O que temos de fazer é aprimorar a ferramenta da negociação coletiva.

Luiz Carlos Robortella: Não existe na nova lei trabalhista a possibilidade de revogação de direitos fundamentais

Luiz Carlos Robortella, professor de Direito do Trabalho da FAAP e membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho
Jamais, não tenho dúvidas. O que vejo são ativistas fazendo essa referência a descumprimento. Os que as convenções da OIT fazem é deixar para o direito interno (de cada país) fazer suas escolhas. Não existe na nova lei trabalhista a possibilidade de revogação de direitos fundamentais, uma vez que isso violaria a Constituição brasileira que, inclusive, prevê o reconhecimento da negociação coletiva. A reforma veio para dar segurança para a negociação, trazendo as matérias que podem ser negociadas, sem mexer no que está no patamar constitucional. Não há o que justifique a interpretação de que se pode derrogar direitos. Não vejo qualquer conflito com norma internacional.

Paulo Sérgio João, advogado e professor da PUC-SP e FGV-SP
Não há violação. Aliás, é exatamente o contrário. A Convenção n.98 organiza procedimentos de negociação coletiva. O art. 611 da reforma (traz possibilidades e limites à negociação coletiva) não é derrogatório de qualquer garantia de direito fundamental. O que faz é estabelecer um campo de negociação, que é exemplificativo. As formas de relação de trabalho são dinâmicas e faz-se uma caricatura, achando que os sindicatos vão negociar a supressão de direitos como o de licença gestante. Ninguém é louco. É um exagero essa preocupação de que a lei estaria contrariando a própria constituição. 

Fernando Hugo Miranda: a experiência da Europa Ocidental tem alterado suas legislações no mesmo sentido, com o aumento do poder da negociação coletiva

Fernando Hugo Miranda, advogado e doutor de Direito do Trabalho
A OIT tem liberdade para examinar as legislações e dar sugestões. Isso é bem visto pela comunidade internacional e muito bem-vindo na possibilidade de melhorar as instituições nacionais. O que eu acho que os peritos estão dizendo é para falar mais sobre a reforma, que têm reservas, embora percebam que há uma tendência (de o negociado prevalecer sobre o legislado). Mas eu não veria a possibilidade de se afirmar que temos um estaríamos em violação e em contrariedade às convenções da OIT. A Convenção n.154 tem no seu título “incentivo à negociação coletiva”, que cabe ao Estado estimular, e não criar amarras. Além disso, a experiência da Europa Ocidental tem alterado suas legislações no mesmo sentido, com o aumento do poder da negociação coletiva frente à lei.

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