O professor de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e especialista em infraestrutura, Armando Castelar, afirmou nesta sexta-feira (14), durante o painel Impacto do tabelamento do frete sobre a competitividade da indústria brasileira, que a fixação de piso de preço do frete causou efeito contrário ao pretendido pelo governo e caminhoneiros. Criado em 2018, em meio ao movimento que paralisou o país, o tabelamento reduziu a demanda por frete rodoviário, encorajou empresas a formarem frotas próprias e elevou o preço final dos produtos aos consumidores.
Castelar alertou que a intervenção estatal não só agravou as dificuldades enfrentadas pelos caminhoneiros como atrapalhou na solução que, segundo ele, se daria naturalmente com o começo do reaquecimento da economia. “A primeira coisa que a tabela do frete fez foi aumentar o tamanho do problema. Elevou o custo logístico e reduziu a competitividade", frisou o especialista durante o evento realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).
"Além de a tabela distorcer a economia, gasta dinheiro público com fiscalização. A própria Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) mostra, em documentos técnicos, que a tabela é ruim. Intervenção do governo deve ocorrer quando tem falha de mercado, o que não ocorreu. Na questão do frete não há nada que justifique essa intervenção”, acrescentou.
De acordo com o especialista em infraestrutura, um dos maiores problemas do transporte rodoviário de cargas no Brasil – setor responsável por 65% da carga transportada no país – é a idade média da frota dos caminhões, que é de 12,8 anos. Segundo ele, a média aumenta para 18 anos quando considerados os veículos dos caminhoneiros autônomos. “O caminhão velho custa mais, polui mais e tem mais chance de se envolver em acidente. Uma solução para o setor seria um programa de incentivo à retirada de caminhões velhos e renovação da frota. O padrão lá fora é uma frota com sete ou oito anos de idade”, disse Castelar.
Atualmente, segundo números apresentados pelo especialista, o transporte de cargas responde por 56% dos custos logísticos na exportação de produtos agropecuários e por 54% de peças e partes de veículos automotores. Castelar destacou ainda que o Brasil gasta 15,4% do PIB com logística, enquanto a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) o custo médio varia de 8 a 10%.
Ao apresentar dados complementares que demonstram como o tabelamento do frete deu errado no país, o presidente da Associação Brasileira dos Usuários do Transporte de Cargas (ANUT), Luís Baldez, alertou que existe tanta disparidade na qualidade das rodovias no país e diferenças de produtos que “qualquer tabela é impossível de ser construída e aplicada”.
“É tão disparada a diferença de qualidade de rodovia entre as regiões que fica impraticável ter um frete com custo nacional em condições tão díspares como as rodovias do Sudeste e Norte, por exemplo”, afirmou. “O tabelamento desorganizou um mercado de competição perfeita. Não tinha nenhum sentido econômico se tabelar um mercado que funcionava. É um cenário completamente desadequado à lógica econômica”, enfatizou Baldez.
Na avaliação do economista da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), Daniel Amaral, o caminho para o reequilíbrio do setor pasa por melhorias regulatórias. Ele argumentou que não há possibilidade de negociação em torno da tabela do frete. “É preciso atacar o problema na origem, na causa. Para isso, é preciso falar em marco regulatório do transporte de carga. Não dá para fazer acordo sobre matéria constitucional”, destacou Amaral.
Julgamento da tabela do frete no Supremo Tribunal Federal
O superintendente Jurídico da CNI, Cassio Borges, pontuou que o tema está maduro para julgamento, e que o momento atual é mais do que oportuno para o Supremo Tribunal Federal (STF) julgar as três ações que pedem a inconstitucionalidade do tabelamento. A CNI é autora de uma das ações. O julgamento estava marcado para 19 de fevereiro, mas foi desmarcado na quinta-feira (13) por decisão do relator dos processos, ministro Luiz Fux, que acatou pedido apresentado pela Advocacia-Geral da União (AGU) e marcou uma audiência de conciliação para o dia 10 de março. Segundo Borges, não há espaço para se negociar a manutenção do tabelamento, por ser inconstitucional.
“É necessário que o relator perceba o malefício coletivo que a demora do julgamento provoca e reapresente o quanto antes os processos ao Plenário do Supremo”, afirmou. Ele reconhece, porém, que, diante desse novo quadro, a audiência servirá para o setor apresentar ao relator as alternativas viáveis já entregues ao governo e aos caminhoneiros autônomos.
A CNI pede que o tabelamento seja declarado inconstitucional por entender que a política de piso mínimo para o frete viola os princípios da livre iniciativa, da livre concorrência e de defesa do consumidor, além de provocar prejuízos na forma de aumento dos preços finais de produtos.
No encerramento do painel, o analista da CNI Alberto Mendes observou que foram inúmeras as tratativas do setor produtivo com o governo na busca por soluções conjuntas para a melhoria do transporte rodoviário de cargas e, inclusive, da situação dos caminhoneiros autônomos. A CNI propôs medidas como a alteração legislativa para o enquadramento do caminhoneiro autônomo como Microempreendedor Individual (MEI) e elaboração de um programa de incentivo ao cooperativismo.