Pandemia agrava situação da indústria, já prejudicada pelo custo Brasil

Qualquer economia sofre diante de choques externos como a pandemia provocada pelo coronavírus. Mas a produção nacional tem sido muito minada pelo custo Brasil, mostra reportagem da Revista Indústria Brasileira

Segundo estudo do Ministério da Economia, o Custo Brasil chega a R$ 1,5 trilhão ao ano, uma desvantagem provocada por dificuldades como empregar capital humano, pagar tributos ou dispor de infraestrutura

Dono de uma empresa de médio porte em São Paulo, o empresário Roberto Yokomizo produz uniformes escolares e corporativos há três décadas. Atualmente, com 80 funcionários, ele diz que a dificuldade de encontrar mão de obra qualificada, o custo do crédito, a alta complexidade tributária e as limitações na capacidade de inovar são alguns dos itens que encarecem o negócio e reduzem a competitividade de sua empresa.

Os pontos citados por ele compõem o chamado Custo Brasil, estimado em R$ 1,5 trilhão anuais, conforme recente estudo da Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade (Sepec) do Ministério da Economia, juntamente com o Movimento Brasil Competitivo (MBC), o setor produtivo e o apoio técnico do Center for Public Impact, fundação do Boston Consulting Group.

Na comparação com países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Custo Brasil é composto por 12 elementos. Entre eles estão os custos para empregar capital humano (de R$ 260 bilhões a R$ 320 bilhões), para honrar tributos (de R$ 240 bilhões a R$ 280 bilhões) e para dispor de infraestrutura (de R$ 190 bilhões a R$ 230 bilhões).

Se tradicionalmente enfraquecem as empresas brasileiras na hora de competirem com estrangeiras pelos principais mercados, essas desvantagens denunciam uma potencial baixa imunidade a crises e choques externos. Alguns exemplos foram a desvalorização cambial de 1999 e a crise nos EUA em 2008. Em 2020, a pandemia causada pelo coronavírus pode ter impactos semelhantes ou até maiores. O índice Ibovespa sofreu importantes quedas em março, à medida que os casos de infecção aumentavam, o dólar disparava e os investidores buscavam aplicações mais seguras. E analistas já preveem um crescimento menor da economia para este ano.

A urgência em atuar sobre desvantagens estruturais, entretanto, não é uma novidade. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) foi uma das primeiras entidades a alertar as autoridades para esse verdadeiro grilhão, ao lançar, ainda em 1995, uma cartilha explicando como diversos componentes do Custo Brasil incidem sobre a atividade produtiva.

São lições que estão na ponta da língua de empresários como Roberto Yokomizo. Segundo ele, “o custo Brasil não está só no aspecto financeiro ou fiscal, mas também numa série de demandas relativas a questões jurídicas de riscos, qualidade da educação e acesso ao crédito”. Entre todos os entraves, o que mais afeta a produção na fábrica de Yokomizo são a qualificação profissional e a atualização do maquinário. “As empresas treinam para garantir produtividade, depois perdem trabalhadores, porque o mercado é muito carente de mão de obra um pouco mais qualificada”, ressalta o empresário.

Crescimento difícil

A pesquisa Falta de Trabalhador Qualifi cado, divulgada em janeiro pela CNI, mostrou que cinco em cada dez indústrias brasileiras enfrentam problemas com a falta de trabalhadores qualifi cados. Conforme a pesquisa, a má qualidade da educação básica é o principal obstáculo enfrentado pelas empresas que investem em ações de formação da mão de obra. Para a CNI, a falta de trabalhadores qualifi cados deve se agravar à medida que aumentar o ritmo de expansão da economia, tornando-se um dos principais obstáculos ao crescimento da produtividade e da competitividade do país.

Renato da Fonseca, gerente-executivo de Pesquisa e Competitividade da CNI, diz que o grande problema do Brasil na questão da qualifi cação dos trabalhadores é a qualidade educacional. “É uma grande difi culdade quando os empresários tentam qualifi car os trabalhadores, seja dentro da empresa ou contratando cursos em outras instituições. A educação básica tem uma qualidade ruim. Além disso, o foco do ensino médio é generalista. O aluno aprende um pouquinho de cada coisa, mas acaba não aprendendo uma profi ssão”, afi rma ele.

Ainda que concorde com a importância do problema da qualifi cação, Rogério Caiuby, presidente do conselho executivo do MBC, elogia a abrangência do estudo feito pelo Ministério da Economia. Segundo ele, os 12 fatores identifi cados como constituintes do Custo Brasil podem ser agrupados em cinco obstáculos para o empreendedor brasileiro: 1) acessar o capital; 2) empregar o capital humano; 3) enfrentar o custo da infraestrutura logística; 4) obter segurança jurídica; e 5) pagar tributos.

Em 2020, a pandemia causada pelo novo coronavírus pode ter fortes impactos na economia

Site participativo 

Para Caiuby, esses grupos podem ser bem representados por uma mandala que ilustra a composição e combinação dos componentes do Custo Brasil. “Pela primeira vez, conseguimos quantificar o custo de cada um deles para as empresas”, diz o executivo do MBC.Segundo ele, o governo pretende lançar um site para receber contribuições do empresariado para reduzir o Custo Brasil.

A criação do site foi acertada com o secretário Carlos da Costa (Sepec) com o objetivo de estruturar um processo de recepção e de avaliação de propostas do setor produtivo. Além da portaria da competitividade, publicada em novembro de 2019, esse processo inclui a estruturação do Conselho de Competitividade, a criação do Observatório da Competitividade e a apresentação de uma proposta de Lei da Competitividade.

“As nossas empresas têm um custo adicional de R$ 1,5 trilhão por ano só por estarem no Brasil. É um peso gigantesco”, afirma o secretário Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, Carlos da Costa. Em relação ao estudo, ele diz que “o governo vai dar prioridade às questões que tenham maior impacto na redução e chance de sucesso na redução do Custo Brasil”. 

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