O ministro das Relações Exteriores, embaixador Ernesto Araújo, está dedicado a reverter a baixa integração do Brasil no mundo. Nesta entrevista exclusiva para a Agência CNI de Notícias, o embaixador fala sobre a importância da relação do Brasil com os demais países do BRICS, Rússia, Índia, China e África Sul, dos planos para os Estados Unidos e da aproximação com o Oriente Médio e a África.
Para o Mercosul, a estratégia é garantir o bloco como uma área de livre comércio. “Não se pode ter um Mercosul como um queijo suíço, com lugares onde haja buracos, barreiras entre os sócios”, diz o embaixador. Além disso, afirma Araújo, o Brasil não pode abrir mão de uma integração com outros mercados. Confira a entrevista:
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– Qual é a estratégia do Brasil para o BRICS e as possibilidades de ganhos para o país neste grupo?
ERNESTO ARAÚJO – A Cúpula dos BRICS já é uma tradição, o Brasil tem interesse tanto bilateralmente quanto no conjunto. O conjunto dos BRICS tem tido um desafio de encontrar um interesse comum entre esses cinco países, que têm visões diferentes. E nós temos conseguido encontrar temas que crie uma plataforma comum. Neste ano, na presidência brasileira, vamos tratar de inovação, ciência e tecnologia e cooperação para o combate ao crime organizado.
Do ponto de vista econômico, queremos aumentar a participação do Novo Banco de Desenvolvimento (banco do BRICS) em projetos brasileiros. O BRICS também uma ocasião de encontro do empresariado. Além da Cúpula, temos o Fórum Empresarial dos BRICS, o que sempre gera conhecimento e negócios de uma maneira diferenciada. O relacionamento do Brasil com esses países está vai além da Cúpula. O BRICS se soma à pauta bilateral que o Brasil já tem com Rússia, Índia, China e África do Sul
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– Olhando para outros mercados relevantes para a indústria, qual deve ser a agenda com os Estados Unidos nessa janela de um ano que temos até as eleições americanas?
ERNESTO ARAÚJO – Há várias medidas sobre a mesa no curto prazo, sem esquecer um acordo mais amplo no longo prazo. Os presidentes já disseram que querem e isso leva mais tempo para negociar. Mas não significa que a gente espere um acordo de livre comércio ou um acordo mais amplo. Têm questões regulatórias e de facilitação de comércio que estão avançando. Há o acordo de reconhecimento mútuo do operador econômico autorizado, o Global Entry, que facilita a entrada e a saída de viajantes frequentes, principalmente em negócios. E vamos reeditar o Fórum de CEOs. Em 25 de novembro, eles voltam a se reunir em Washington.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– Que resultados devemos esperar com o fim da presidência brasileira no Mercosul no fim do ano? O acordo de facilitação de comércio pode ser uma entrega?
ERNESTO ARAÚJO – O acordo de facilitação de comércio está fase final de negociação e deve eliminar algumas taxas que existem entre o comércio do bloco e cortaria burocracia que ainda existe. Estamos animados para fechar esse acordo na cúpula de dezembro e isso seria um dos ganhos importantes que a gente pode tocar agora. Também queremos avançar um pouco na questão da simplificação dos Mercosul e procurar prosseguir nessa agenda de dinamização do bloco, assim como de consolidar o comércio intrazona. Temos que ver qual é a nova atitude que o governo da Argentina trará.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– O que o Brasil não pode abrir mão dentro do Mercosul?
ERNESTO ARAÚJO –De três princípios básicos. O de livre comércio dentro do bloco, essa é a alma do Mercosul. Não se pode ter um Mercosul como um queijo suíço, com lugares onde haja buracos, barreiras entre os sócios. Segundo, a integração aberta, um bloco que quer negociar com terceiros. Como já conseguimos neste ano, com o acordo com a União Europeia e com o Efta (Associação Europeia de Livre Comércio), continuar neste caminho das grandes negociações externas. E, algo que é fundamental, que tem relação com a essência do Mercosul é a democracia. O Mercosul como um espaço democrático e um polo de democracia na região. Isso foi reafirmado este ano, graças a boa convergência entre os presidente Bolsonaro e Macri e isso não pode ser esquecido. O Mercosul traz no berço essa vocação de ser uma força pela democracia e disso também não abrimos mão.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– Como deve avançar a agenda com a Europa agora que os blocos concluíram o acordo Mercosul-União Europeia?
ERNESTO ARAÚJO – Preciso aproveitar esse acordo. Já está em andamento o trabalho da revisão jurídica para levarmos a todos os parlamento. Isso leva mais alguns meses. Espero que ocorra com tranquilidade e a gente comece o trabalho de ratificação no ano que vem. Mas antes disso, o acordo já gera bastante interesse de investidores, já achamos que mudou em grande parte esta visão do Brasil como destino de investimentos por causa do acordo e o que ele sinaliza em termos de abertura econômica preparar para isso, no diálogo com os investidores, temos conversado com várias companhias europeias, alemães, francesas, italianas, que estão muito animadas com essa perspectiva e já pensando em ampliar investimentos no Brasil. Então, é tentar consolidar isso.
O acordo Mercosul-União Europeia é um dos elementos, têm vários outros que tornam o Brasil muito atrativo para os investimentos e procurar que os interesses dessas grandes empresas se traduza na aceleração da entrada em vigor desse acordo. Que é um acordo bom para as duas partes.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– O senhor que conhece bem a indústria pode nos dizer quais mercados a indústria brasileira deveria explorar, que ainda não está explorando? Que oportunidades estamos perdendo?
ERNESTO ARAÚJO – Tem dois mercados. Oriente Médio e África. Ficou muito claro nessa viagem para os países do Golfo, o interesse pelo Brasil. Eles querem trabalhar conosco em todas as dimensões e se tornarem um parceiro de primeira linha do Brasil. Tanto dos Emirados Árabes Unidos, da Arábia Saudita quanto Qatar. Tanto como fonte de investimentos de lá para cá quanto de mercado para os nossos produtos. Já estamos trabalhando para ir mais a fundo nisso. Identificar quais são as oportunidades específicas, traduzir isso para as nossas exportadoras, é um mercado muito promissor e estamos muito entusiasmados pelo mercado consumidor lá e pela possibilidade de termos um hub de exportação nos Emirados Árabes para a Ásia. Temos economias muito complementares com poucos itens que concorram, eles praticamente têm interesse em toda a nossa pauta e querem diversificar.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– E a África?
ERNESTO ARAÚJO – No início de dezembro, eu vou a alguns países africanos, Cabo Verde, Angola, Senegal e Nigéria, para começarmos um trabalho de aproximação econômico-comercial com a África. A África hoje é muito subexplorada como parceiro de negócios para nós. É o continente que mais cresce economicamente no mundo, tem vários desafios, mas tem oportunidades imensas e nós precisamos ser parte dessas oportunidades. Eu quero colocar na agenda e manter na agenda com todo o continente africano, acho que temos que olhar mais para a Ásia como parceiros de negócios. Nós ainda não trabalhamos suficientemente a parte dos produtos e dos investimentos brasileiros na África. Eu acho que precisam aumentar, sobretudo na parte agricultura.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– Quais outros parceiros comerciais estão na agenda do governo para o próximo ano? Tanto em acordos quanto em viagens presidenciais?
ERNESTO ARAÚJO – Nós verificamos que essa diplomacia presidencial é muito importante. O presidente Bolsonaro está abrindo realmente novos espaços e tem sido extraordinariamente bem-recebido, tem incentivado o interesse pelo Brasil, mostrado compromisso deste governo com a abertura econômica, com a segurança de negócios. Isso certamente ele quer continuar. Vamos começar o ano com uma visita muito importante à Índia, que é a quinta economia do mundo. É um mercado difícil, que precisa de muita conversa, muita negociação para ser trabalhado, mas que está interessadíssimo no Brasil e nós nele.
O presidente pretende visitar países europeus, Ásia e novamente os países do árabes. Estamos muito entusiasmados com os resultados que têm vindo e isso dobra a nossa convicção de que é fundamental essa presença do presidente pode ser determinante nessa abertura de mercados, além da nossa, clara, no contidiano, do Itamaraty e das embaixadas.
AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS– A política ambiental e climática do Brasil pode ser um entrave para a agenda comercial brasileira?
ERNESTO ARAÚJO – É sobretudo um desafio de informação. De corrigir a desinformação. O que nós estamos querendo mostrar é a nossa agricultura sustentável, como temos um enfoque sustentável para a Amazônia. O que nós queremos é atrair investimentos produtivos e sustentável para a Amazônia e geração de emprego e de renda na região. Mostrar que o esforço de preservação, que existe e continua, tem que vir junto com o esforço para os 20 milhões de brasileiros que vivem na Amazônia. Isso cria oportunidade para os investidores, na parte da bioeconômia e do Ecoturismo, queremos trabalhar muito isso. Toda essa parte ambiental que é vista muitas vezes de forma negativa vai abrir oportunidades enormes para cooperação e investimentos dos nossos parceiros internacionais.