A integração do Brasil ao mundo é fundamental para garantir a retomada do crescimento econômico, e estimular o desenvolvimento tecnológico e a produtividade da indústria nacional no pós-pandemia. Países e empresas inseridos no mercado internacional são mais inovadores, produzem com maior eficiência, criam empregos de melhor qualidade e geram mais riquezas para toda a sociedade.
Entretanto, com a queda acelerada da capacidade de enfrentar os concorrentes internacionais, o Brasil vem perdendo espaço no comércio mundial. Cada vez mais, nossa pauta exportadora se concentra em produtos primários ou com baixo grau de processamento industrial. O declínio do país no mercado externo de manufaturados começou nos anos 1980 e vem se acelerando rapidamente.
Na última década, as exportações brasileiras de produtos industriais andaram na contramão do mundo. De acordo com a Organização Mundial do Comércio (OMC), enquanto as vendas globais desses bens aumentaram 28% entre 2010 e 2019, os embarques do Brasil para outros países caíram 1%. A queda generalizada, que atingiu 11 dos 12 setores avaliados pela OMC, representa uma retração de US$ 38 bilhões nas exportações brasileiras de manufaturados em dez anos.
Os coeficientes de abertura comercial, calculados pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pela Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), confirmam uma preocupante redução da participação do Brasil no cenário externo. A parcela da produção industrial brasileira que é exportada caiu de 20% do total em 2005 para 15% em 2018. Mesmo assim, a fatia dos insumos estrangeiros nas nossas fábricas vem crescendo e alcançou 24% em 2018. Isso mostra que o aumento das importações industriais não se tem convertido em avanços na integração internacional do país.
A recuperação do espaço perdido e a aceleração do processo de inserção global da nossa economia são desafios que precisamos encarar com urgência. Trata-se de uma tarefa complexa, que não depende apenas de uma política comercial limitada ao corte de tarifas e de barreiras às importações.
As ações voltadas à abertura do mercado interno aos produtos estrangeiros, para serem eficazes, devem ser parte de uma estratégia que ataque o Custo Brasil e promova a nossa competitividade. A reforma tributária, a modernização da infraestrutura, o acesso mais fácil ao crédito e a redução da burocracia são partes cruciais desse projeto.
Mas devemos ir além e definir, a partir do consenso entre o setor público e a iniciativa privada, um conjunto específico de medidas capazes de estimular o comércio exterior. Esse plano deve se sustentar em três pilares.
O primeiro é o tratamento regulatório e tributário concedido tanto aos investimentos estrangeiros no Brasil quanto aos feitos por brasileiros no exterior. Precisamos adequar as regras do país às da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), pois 70% do comércio mundial é realizado entre empresas ou entre matrizes, filiais e subsidiárias da mesma companhia.
A harmonização das normas brasileiras com as regras globais reduzirá custos, aumentará a segurança jurídica dos investidores e estimulará novos empreendimentos de multinacionais, especialmente os voltados à exportação. Essa convergência é primordial para o Brasil obter o desejado acesso à OCDE e afastar o risco de perder investimentos para nações com sistemas de tributação internacional mais alinhados com a atividade produtiva.
Isso requer a revisão das normas de preços de transferência. Único no mundo, o modelo brasileiro gera, na maioria dos casos, uma tributação mais elevada do que a dos demais países nas importações e nas exportações entre unidades da mesma empresa.
Outra medida essencial é a mudança da tributação dos lucros das multinacionais brasileiras no exterior. Com a legislação atual, a taxação dos ganhos das operações de empresas brasileiras em outros países é até 14 pontos percentuais superior à das atividades realizadas no Brasil.
Também é imprescindível ampliar a rede de acordos para evitar a dupla tributação. Devemos dar prioridade aos tratados com Alemanha, Colômbia, Estados Unidos, Paraguai e Reino Unido. Atualmente, o Brasil tem esse tipo de tratado com 34 países, mas o modelo que utilizamos não é convergente com o da OCDE, pois tributa na fonte as operações de importações de serviços, royalties e empréstimos externos.
O segundo eixo do plano é a competitividade do comércio exterior. Há muitos anos, os exportadores enfrentam dificuldades ou simplesmente não conseguem recuperar créditos tributários federais e estaduais, previstos na Constituição brasileira e nas melhores práticas globais. Esse passivo histórico eleva os custos dos bens industriais produzidos no país, que, sem preços compatíveis com os dos concorrentes, acabam perdendo mercados. As empresas estão sujeitas, ainda, à elevada carga tributária incidente sobre as importações de serviços, o que acaba encarecendo o produto nacional.
Além disso, o bom desempenho do Brasil no mercado internacional depende da modernização e do aperfeiçoamento do sistema público de financiamento e de garantias às exportações, da simplificação dos processos de comércio exterior, da redução da burocracia e dos custos aduaneiros.
O terceiro pilar do plano é integração internacional. Devemos rever o projeto de abertura comercial que enfatiza, desproporcionalmente, a redução unilateral de tarifas de importação e fomenta tratados de livre comércio com alguns países, especialmente da Ásia, que não trabalham de acordo com as regras internacionais.
Acordos desse tipo abririam caminho para a concorrência desleal, o que prejudicaria as empresas brasileiras. É preciso considerar, sobretudo, que alguns países mantêm uma série de subsídios e não têm um sistema de proteção aos trabalhadores similar ao do Brasil.
A desvantajosa agenda de abertura unilateral deve ser substituída por um projeto ambicioso de acordos comerciais com países que abram oportunidades ao Brasil e tragam ganhos efetivos para todos os setores da nossa economia. Temos que concentrar esforços na conclusão dos acordos com a União Europeia, a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA), o Canadá e o México. Também precisamos nos empenhar para lançar negociações de tratados abrangentes com os Estados Unidos, os países da América Central e o Reino Unido.
Em paralelo, é necessário respeitar as normas internacionais de comércio e combater as práticas desleais, como os subsídios industriais e o dumping.
Nosso objetivo deve ser, enfim, a concorrência equitativa e o comércio justo que ajudem a promover o desenvolvimento econômico e social do Brasil e a prosperidade em todo o mundo. Nada além do que as economias mais integradas já praticam. De outra forma, uma agenda parcial e incompleta de inserção na economia global, certamente, trará mais riscos e prejuízos do que benefícios ao país.
*O artigo foi publicado nesta segunda-feira (10), no portal Exame.com
Robson Braga de Andrade é o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
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