O Brasil é reconhecido em todo o mundo pelo expressivo reservatório de água doce. No entanto, nossos mananciais não atendem igualmente a toda a população. Por exemplo, a região amazônica, que ocupa 45% do território nacional, e onde vivem apenas cerca de 9,2% da população brasileira, concentra 80% da água disponível no país. Enquanto isso, a Região Sudeste, com 10,8% do território nacional e 47,6% da população, dispõe de apenas 1,7% dos mananciais. Não é à toa que, cada vez mais frequentemente, essa região enfrenta problemas de escassez hídrica, assim como a Região Nordeste, bem conhecida pelos grandes períodos de seca.
Por isso, é fundamental e urgente que o Brasil invista na superação desses desafios e priorize políticas que garantam a segurança hídrica. A indústria, mesmo responsável por utilizar apenas 9,2% da água usada no país, vem sendo protagonista tanto no desenvolvimento de produtos quanto em melhoria de processos para reduzir o consumo. São inúmeras as soluções já oferecidas pelo setor industrial brasileiro: produtos de limpeza mais concentrados; equipamentos, como máquinas de lavar, que consomem bem menos água e energia; e redução do consumo e recirculação de água nos processos produtivos.
Mas é preciso ir além. Mais do que aumentar a eficiência no consumo, é necessário encontrar caminhos para garantir a segurança hídrica no presente e no futuro. Para tanto, o setor industrial estuda e investe em alternativas, como o reúso de água nos sistemas de abastecimento urbano e projetos de dessalinização. Entretanto, é preciso ter claro que, sem a universalização do saneamento básico, as oportunidades para garantir a segurança hídrica não serão efetivas.
O setor de saneamento é o de maior atraso na infraestrutura brasileira e, no atual ritmo de investimentos, o país só universalizará os serviços de coleta de esgoto após 2060. Seriam mais de 30 anos de atraso em relação à meta prevista pelo Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), de universalização do saneamento no país até 2033. Atualmente, o Brasil investe cerca de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em infraestrutura e apenas 0,2% do PIB nos serviços de abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto. Em 2018, foi desembolsado patamar de 43% inferior à média anual de R$ 23 bilhões necessários para cumprir a meta do Plansab.
A falta de saneamento básico, além de contribuir para a insegurança hídrica no que se refere à quantidade e à qualidade da água, compromete os ecossistemas e o desenvolvimento econômico. Para reverter a tendência e reduzir o prazo de universalização do serviço, é imprescindível elevar a participação do capital privado na gestão das companhias de saneamento. A experiência mostra que, nas cidades onde foram firmadas parcerias com a iniciativa privada, houve incremento relevante na cobertura e na qualidade dos serviços. Quem ganha com isso é a população.
Por isso, a indústria defende e trabalha em favor da aprovação do Projeto de Lei 4.162/2019, que extingue os contratos de programa e prevê a licitação obrigatória dos serviços de saneamento, propiciando competição entre empresas públicas e privadas. Afinal, o aumento da concorrência é fundamental para a retomada dos investimentos no setor e, consequentemente, para melhorar a qualidade dos serviços prestados à população.
Para ter uma ideia, entre 2015 e 2018, as companhias privadas de saneamento, presentes em apenas 6% dos municípios brasileiros, realizaram investimentos per capita 30% superiores à média nacional, de acordo com estimativas da Confederação Nacional da Indústria (CNI). O modelo privado de gestão também preza pela eficiência, especialmente por meio da redução das perdas de água na distribuição, cuja média nacional chega a 38,5%, conforme dados do governo federal.
Além do aumento da disponibilidade hídrica, universalizar o saneamento básico permitirá o avanço de projetos de reúso de água nos sistemas de abastecimento urbanos. A experiência de alguns países, como Espanha e Israel, mostra que o reúso permite a articulação das políticas nacionais de saneamento e de recursos hídricos, com a racionalização do uso da água na indústria, na irrigação e até no consumo humano.
A conservação da água é um dos temas ambientais mais importantes na atualidade, pois impacta, de forma significativa, a vida das pessoas e o equilíbrio dos ecossistemas. A indústria é parte importante da solução para os desafios de seu uso mais racional. Ao desenvolver estratégia e políticas nacionais, além de mecanismos claros para garantir a segurança hídrica, o setor poderá fazer mais pela conservação desse precioso recurso, com aumento da eficiência de produtos e processos, bem como do desenvolvimento tecnológico. O potencial está em nossas mãos, cabendo ao governo, ao setor produtivo e a toda a sociedade saberem usá-lo a seu favor.
O artigo foi publicado no jornal Correio Braziliense no domingo (22).
Mônica Messenberg é diretora de Relações Institucionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI)
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