Agência reguladora legislar é inconstitucional

Em artigo publicado na Folha de S. Paulo, o superintendente Jurídico da CNI, Cassio Borges, trata da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.874, de autoria da CNI, que analisa os limites da atuação de uma agência reguladora. Ele afirma que a política sobre o consumo de produtos lícitos cabe ao Parlamento e não à Anvisa

Cassio Borges é superintendente Jurídico da CNI

Falta de clareza das leis, decisões judiciais descoladas dos precedentes, mudanças bruscas de entendimento dos tribunais, desrespeito à separação de Poderes. Todos esses fatores produzem um ambiente pouco propício à criação de negócios.

A ausência de segurança jurídica no país vem sendo objeto de atenção da Confederação Nacional da Indústria (CNI), que elaborou uma Agenda Jurídica da Indústria — Supremo Tribunal Federal, indicando cerca de cem ações judiciais estratégicas para o setor, nas quais se espera que o STF atue em favor do crescimento e do desenvolvimento econômico. Ao assim agir, fará um bem ao Brasil.

Uma dessas ações é a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.874, de autoria da CNI, que analisa os limites da atuação de uma agência reguladora.

O Supremo deve decidir, nesta quinta-feira (1º), se é possível à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por meio de resolução, proibir o consumo de ingredientes que não provocam risco iminente à saúde da população. No caso, a fabricação e a comercialização de cigarros como eles são conhecidos pelos consumidores brasileiros.

A CNI sempre defendeu que o funcionamento das agências reguladoras é fundamental para o crescimento econômico sustentado do país e para o estímulo ao investimento privado, desde que exercido nos limites de sua competência. Uma decisão de agência não possui a força nem a estabilidade de uma lei.

Para que o direito seja confiável, decisões políticas devem ser discutidas abrangentemente perante toda a sociedade e afirmadas, com todas as letras, em leis.

Quem defende o contrário acredita que agências reguladoras podem, com base nas legislações que criaram essas autarquias, efetuar proibições genéricas de produtos e de serviços. Esse entendimento não é correto.

A Anvisa não pode estabelecer restrições gerais e abstratas, como as contidas na resolução que simplesmente proíbe a fabricação e a comercialização de produtos lícitos, por ser esta competência exclusiva e indelegável do Congresso Nacional.

A lei 9.782/99, ao estabelecer a competência da Anvisa, limitou o seu poder de polícia às hipóteses em que houver violação da legislação ou risco iminente à saúde. A resolução em questão não se pautou nestas hipóteses. Não apontou a lei violada nem foi capaz de evidenciar que os ingredientes proibidos colocam a saúde da população em risco iminente.

Uma coisa é identificar o risco no consumo desses produtos, o que, de fato, compete à Anvisa; outra é a decisão quanto à administração desse risco. Será que ele deve ser aceito pela sociedade? Como pode ser gerido diante de outros valores constitucionais, como a autonomia privada e a livre iniciativa?

O ajuste fino dessa equação não possui nada de técnico. É decisão política sobre o grau de intervenção estatal na vida do cidadão e sobre o direito deste de fazer suas próprias escolhas.

Atualmente, a discussão está relacionada ao tabaco, mas poderia ser sobre medicamentos, alimentos ou qualquer outro produto sujeito à fiscalização da Anvisa. Às agências reguladoras cabe o poder de fiscalizar determinados setores da economia, e não o de legislar sobre eles.

Com a ação, a CNI não busca tolher o poder das agências reguladoras, cuja atuação é preferível à regulação efetuada por ministérios. O objetivo é que o Supremo delimite tal poder em moldes compatíveis com o que está definido na Constituição. Ao decidir que a política sobre o consumo de produtos lícitos cabe aos parlamentares e não à Anvisa, o STF agirá em prol da segurança jurídica e da liberdade de todos os brasileiros.

CASSIO BORGES, advogado, é superintendente jurídico da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

O artigo foi publicado nesta quinta-feira (1º) na Folha de S. Paulo.

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