Um modelo a ser seguido

Atuação do SENAI mostra como melhorar a lei que regula a contratação de jovens, criticada por restringir o mercado de trabalho para os menores aprendizes

Coordenador em uma empresa de manutenção de contêineres, Edielison Santos diz que a educação profissional mudou sua vida

Quando tinha 14 anos, Edielison Santos foi matriculado no curso de profissional em eletrotécnica do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) de Pernambuco. Aos 15, começou a trabalhar como aprendiz em uma indústria do setor gráfico em Cabo de Santo Agostinho, na região metropolitana do Recife e, logo depois, foi contratado em outra empresa. Hoje, aos 30 anos, é coordenador em uma empresa de manutenção de contêineres, sendo responsável por uma equipe com mais de 50 profissionais.

“A formação recebida no SENAI, aliada à experiência como aprendiz, foi fundamental para o meu desenvolvimento profissional”, conta. Infelizmente, no entanto, a história de sucesso de Edielison não reflete a realidade da maioria dos ex-aprendizes no país.

A taxa de desemprego no Brasil ficou em 11,6% no trimestre finalizado em novembro de 2021, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por outro lado, no terceiro trimestre do ano passado, a taxa de jovens de 14 a 17 anos sem trabalho era de 40,4% e, entre as pessoas de 18 a 24 anos, de 25,7%.

O alto percentual de desemprego entre os jovens sempre foi uma preocupação dos governos. No ano 2000, foi publicada a Lei 10.097, conhecida como Lei da Aprendizagem, que tinha o objetivo de facilitar a entrada dos jovens no mercado de trabalho. Ela estabelece, entre outras medidas, que as empresas de médio e grande portes devem contratar, no mínimo, 5% e, no máximo, 15% de jovens aprendizes em relação ao número de funcionários cujas funções demandem formação profissional.

“A intenção da lei foi boa, mas ela limitou o trabalho dos jovens. É preciso debater, por exemplo, a proibição do menor em ambiente de produção industrial ou na construção civil, já que a indústria segue uma série de normas que garantem a segurança do trabalhador”, defende Thômaz Nunnenkamp, vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (FIERGS).

Um grupo de trabalho formado por governo e representantes de trabalhadores e empregadores discute mudanças na lei. Há, atualmente, mais de 460 mil aprendizes no Brasil, segundo o Ministério do Trabalho e Previdência.

SENAI defende mudanças na legislação atual, como aumento na duração do contrato dos jovens aprendizes e elevação da idade mínima para participar do programa

Concentração

O Brasil é um dos poucos países que obrigam as empresas a contratar jovens e a estabelecer até cota percentual para isso, mas o resultado dessa política vai na contramão do que ocorre em nações desenvolvidas. Atualmente, as empresas brasileiras contam com 1% de aprendizes em relação ao número de colabores. Na Suíça, esse índice é de 4,4%. Na Austrália, 4%; na Alemanha, 3,9%; e, na França, de 1,7%, mesmo não existindo qualquer tipo de cota.

A limitação para que o aprendiz atue em certas áreas, como a da produção da indústria, e a obrigatoriedade de cumprir uma cota fazem com que muitas empresas tenham aprendizes em setores que não os preparam para uma futura contratação, nem na própria empresa onde já estão inseridos nem em outras.

Um caso de sucesso é o da empresa Bosch, que, desde 1960, atua em parceria com o SENAI na qualificação de aprendizes. Na unidade de Campinas (SP), a taxa de contratação desses jovens ao fim do curso, em diferentes áreas, ficou em torno de 90% nos últimos dez anos. "Nosso programa de aprendizagem industrial consiste em aulas de meio período no SENAI e meio período na Bosch, com base no sistema de ensino dual do modelo alemão", explica a empresa.

Entretanto, a realidade nacional é bem diferente. A taxa média de contratação do aprendiz ao término do curso, na mesma empresa, é de apenas 13% no Brasil, percentual bem abaixo do que se observa na Bosch de Campinas ou em países como a Inglaterra (73%) e a Alemanha (45%), em que mais da metade dos jovens fazem educação profissional junto com a educação regular.

Além disso, segundo dados do Ministério do Trabalho, 61% dos aprendizes brasileiros trabalham em áreas generalistas, que não demandam uma formação profissional específica, atuando como escriturários, agentes, assistentes e auxiliares administrativos, conforme o sistema de Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2019. No Canadá, a ocupação com mais aprendizes é a de eletricista, com 15% do total. Na Alemanha, a maior concentração é de 6%, no secretariado.


“O que era para gerar emprego virou programa social. Daqui a pouco vamos ter um apagão de mão de obra se não facilitarmos a entrada dos nossos jovens na indústria”, reforça Thômaz Nunnenkamp.


Necessidades da indústria 4.0

Segundo a Lei da Aprendizagem, o jovem aprendiz precisa ter entre 14 e 24 anos, estar matriculado a partir do 9º ano do ensino fundamental/da Educação de Jovens e Adultos (EJA) ou já haver concluído o ensino médio. Para pessoas com deficiência, não há limite de idade. Além disso, os contratos de aprendizagem não podem durar mais de dois anos.

O SENAI defende a expansão do tempo do contrato em um ano (para até três anos, portanto), com o intuito de possibilitar uma maior sinergia com o novo modelo do ensino médio, permitindo abordagens inovadoras que fortaleçam o sistema dual. Na Áustria e na Noruega, por exemplo, os contratos duram até quatro anos. Na Alemanha, três anos.

Outro ponto importante é a possibilidade de elevar a idade mínima dos aprendizes para 16 anos, visando permitir sua atuação nas áreas de produção da indústria.


“Do jeito que está, a aprendizagem não está boa nem para a empresa, nem para o jovem. As profissões estão se transformando e a formação profissional ganha mais relevância por causa das novas tecnologias, fundamentais para a indústria 4.0”, destaca o gerente-executivo de Educação Profissional e Tecnológica do SENAI, Felipe Morgado.


 

Relacionadas

Leia mais

Educação infantil na pandemia: pedagogas criam estratégias para manter ensino lúdico e afetivo
Trabalho intermitente: mercado do trabalho, proteção social e a discussão no STF
80 anos dedicados à indústria e ao futuro do trabalho

Comentários