Hidrogênio verde contra o carbono

Para a indústria brasileira, o combustível verde é crucial na transição para a economia de baixo carbono

Hidrogênio verde tem papel fundamental na descarbonização da economia e pode ser utilizado como combustível e insumo

Produzido a partir da eletricidade gerada por fontes de energia limpas e renováveis, o hidrogênio verde é considerado fundamental para o processo de descarbonização no setor industrial e para o cumprimento das metas do Acordo de Paris. Ao longo dos próximos anos, o objetivo é trocar o hidrogênio produzido a partir de fontes fósseis pelo hidrogênio verde, que não emite carbono.

O hidrogênio é obtido a partir de água. Por meio de um processo chamado eletrólise, é possível dividir as moléculas que a formam e separar o hidrogênio do oxigênio. O processo se torna sustentável ao utilizar fontes energéticas limpas.

Monica Saraiva Panik, diretora de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Hidrogênio (ABH2), explica que a atual demanda por hidrogênio verde é diretamente ligada às metas de descarbonização e de mudanças climáticas acordadas pelos países. Ele substitui a energia de fontes poluidoras e outros insumos fósseis.

Até o final de 2017, afirma a executiva, o hidrogênio era visto como uma alternativa aos combustíveis tradicionais apenas pelo setor de transportes. “Com essa tomada de consciência de que o hidrogênio pode descarbonizar simultaneamente quase todos os setores da economia, principalmente indústrias de difícil descarbonização e também o transporte, o setor de hidrogênio ganhou muito mais visibilidade e maior volume de investimentos a nível mundial”, explica Monica.

Professor da UFRJ, Edmar Almeida diz que o hidrogênio verde será usado principalmente nos setores de refino de petróleo, químico, cerâmico e de transportes

O professor Edmar Almeida, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), lembra que o processo de inclusão do hidrogênio verde na produção começou exatamente pelas indústrias que hoje consomem hidrogênio no seu processo de produção. “Na Europa, já há muitos projetos em implementação nos segmentos de refino e químico. Eles estão substituindo o gás pelo hidrogênio verde”, exemplifica.

O professor conta que, segundo levantamento da Agência Internacional de Energia, há mais de 100 programas em implementação no mundo, principalmente na Alemanha, na Espanha, nos Estados Unidos, na China e agora no Brasil. Segundo ele, a primeira fábrica de hidrogênio verde no Brasil deverá entrar em funcionamento no final de 2023. O projeto é da Unigel, que atua no segmento de fertilizantes e amônia, e será instalado na Bahia.

Edmar Almeida afirma que o hidrogênio verde será usado principalmente nos setores de refino de petróleo, químico, cerâmico e de transportes. Na indústria, pode ter diferentes finalidades, como uso como matéria-prima ou energético. Também pode ser utilizado diretamente em gás, na mistura de combustíveis convencionais, como o gás natural, na forma de combustível sintético, como amônia e metanol, ou em pilhas a combustível para produção de energia elétrica.

“Hoje ainda não se usa hidrogênio verde em grande escala na indústria porque o custo é muito alto em relação ao gás natural”, comenta. Com o avanço das tecnologias e a queda no custo das energias renováveis, que inclui também aquela gerada por biomassa, o professor acredita que o hidrogênio verde será fundamental na descarbonização.

Sayonara Eliziário, da UFPI, aponta desafios para a consolidação do hidrogênio verde como redução de custos, mercado consumidor e infraestrutura

Sayonara Eliziario, professora do curso de engenharia de energias renováveis da Universidade Federal do Piauí (UFPI), entende que, apesar do futuro promissor, há diversos desafios a serem superados para a expansão do uso do hidrogênio verde na indústria brasileira. Ela cita três: reduzir o custo na geração de energia renovável; consolidar um mercado consumidor, com segurança regulatória, para o produto; e construir uma infraestrutura de produção e distribuição, o que inclui estações de abastecimento e expansão de fontes de energias renováveis.

Almeida enxerga, ainda, um outro desafio. Segundo ele, é preciso desenvolver no Brasil e no mundo uma indústria de bens e serviços apta a produzir e fornecer eletrizadores, equipamentos necessários para a produção em larga escala do hidrogênio verde. Ele estima que esse desenvolvimento é uma questão de tempo, de 10 a 15 anos.

“Hoje, o grande problema é que o custo dos equipamentos ainda é elevado e a viabilidade econômica ainda é desafiadora, mesmo com o preço de geração da energia caindo”, avalia.

Para que as empresas desse setor possam se desenvolver, afirma ele, é preciso também apoio financeiro para investir numa tecnologia que ainda não está madura.

“Linhas de crédito e financiamento a fundo perdido para amortizar parte do custo do financiamento serão necessários numa fase inicial, como está acontecendo na Europa. É necessário, também, criar uma política para dar um impulso inicial à indústria do hidrogênio verde, coisa que o governo está tentando fazer por meio do Plano Nacional de Hidrogênio”, aponta.

Outro ponto, defende o professor, é o fortalecimento do mercado de carbono no Brasil. “É importante que o Brasil faça seu dever de casa e crie seu mercado de carbono para compensar ou premiar as empresas que fizeram esse esforço de investir no hidrogênio”, diz.

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