O financiamento do desenvolvimento sustentável da Amazônia precisa ser pensado a partir de dois eixos centrais e complementares: a importância da gestão de riscos - crédito, reputação da região no cenário nacional e internacional - e a urgência de uma agenda de bioeconomia, que precisa ser cada vez mais incorporada pelas empresas que produzem ou compram de quem produz no bioma amazônico.
O alerta foi dado no debate “Papel do setor financeiro na gestão de riscos florestais das empresas no Brasil”, parte da programação da manhã desta sexta-feira (6), no Fórum Mundial Amazônia+21. Dados do estudo “O papel do setor financeiro na gestão de riscos ambientais das empresas no Brasil”, realizado pela organização sem fins lucrativos CDP Latin America, mostram que mais de 60% das empresas com algum tipo de atuação no Brasil não coletam informações de conformidade com o Código Florestal brasileiro e 70% ainda não fazem rastreamento total da produção.
A ausência dos dados representa risco corporativo, reduz a competitividade dos produtos brasileiros no cenário global e limita o avanço de um modelo de desenvolvimento sustentável na Amazônia brasileira. A pesquisa foi apresentada no Fórum pela gerente de projetos da CDP, Laís Maciel.
Para Diogo Bardal, representante do IFC, maior instituição de desenvolvimento global voltada para o setor privado em países em desenvolvimento, a sustentabilidade começou no trabalho das organizações não governamentais, mas hoje as empresas estão cada vez mais interessadas em negócios verdes e responsáveis, “o mercado enxerga que há oportunidades para esses modelos de atuação e o envolvimento de bancos e instituições financeiras traz luz sobre a viabilidade das ideias e projetos”, destacou Bardal.
O encontro, mediado pelo especialista em Políticas Públicas da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Mario Cardoso, contou ainda com a representante da Resultante Consultoria, Maria Eugênia Buosi.
Quando o assunto é financiamento, o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) é dos mais relevantes atores para o desenvolvimento da Amazônia. O banco tem destinado recursos sobretudo para a área de infraestrutura nos nove estados da Amazônia Legal, mas deseja ir além.
“O BNDES pode fazer muito mais do que oferecer crédito. Temos outras ferramentas e ativos: conhecimento, tecnologia, novos produtos, serviços, a capacidade de agendar debates, buscar consensos, estimular políticas públicas”, afirmou presidente do BNDES, Gustavo Montezano, outro participante do Fórum Amazônia + 21.
Para Montezano, a Amazônia é uma prioridade e o Brasil tem que aproveitar o enorme capital ambiental, promovendo o desenvolvimento sustentável da região.
Em 2020, o Fundo da Amazônia, gerenciado pelo BNDES, investiu R$ 100 milhões em projetos de ordenamento territorial, agropecuária, bioeconomia, crédito de carbono, turismo, saneamento e conectividade digital na região. Como em outras mesas do Fórum ao longo dessa semana, Montezano concorda que há uma enorme janela de oportunidades para a Amazônia, uma vez que a atenção e a vontade de investir na região nunca foram tão intensas.
Mas a oportunidade precisa ser aproveitada sobretudo a partir da capacidade de se criar formas inovadoras de gerar emprego e renda, com novos modelos de negócios, que tornem realidade um modelo de desenvolvimento sustentável, que traga mais qualidade de vida para os mais de 23 milhões de habitantes da região.
Para o CEO do Banco da Amazônia, Valdecir Tose, “a Amazônia precisa finalmente assumir seu protagonismo e ganhar a devida atenção dos setores público e privados”. Nos debates do Fórum Amazônia da manhã desse terceiro dia, Tose participou de uma das mesas sobre financiamento de projetos para a região, ao lado dos técnicos da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) Kleber Mourão e Wanderley Andrade, e do biólogo e consultor da Palladium Brasil, Marcos Sztutman.
Economia circular e negócios sustentáveis na Amazônia
Um dos caminhos para promover esse novo desenvolvimento tem a ver com o conceito de economia circular. Trata-se de uma nova lógica de olhar para a cadeia de produção e de consumo, aproximando-as. Na chamada economia circular, os negócios geram impactos positivos para todos: quem fornece, quem produz e quem consome. Na Amazônia, a Natura, gigante internacional dos cosméticos, já trabalha com o conceito na prática e assim ajuda a preservar 1,8 milhão de hectares e gera emprego e renda em 55 comunidades diferentes na região.
“Atuamos sobre conhecimentos tradicionais, mas de modo que os produtos gerem renda, preservação e novos conhecimentos. Mudamos de um modelo de extrativismo para um modelo de exploração, com espécies deixando listas de extinção e com zero desmatamento”, afirma Denise Hills, diretora da Natura. “Isso tem que estar no horizonte de todos”, convida Hills, outra participante do Fórum Amazônia + 21.
O gerente executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade, Davi Bomtempo, foi mediador do debate que abordou economia circular
O debate sobre economia circular foi mediado por Davi Bomtempo, gerente executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI e teve participação de Marília de Souza, do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) do Paraná, do consultor João Tezza Neto, Henrique Mendes, representando a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (ABINEE) e de Marcelo Ferronato, da ONG Ecoporé.
Quem acompanhou os diálogos do Fórum nesse dia 6 conheceu também um outro modelo de bioeconomia já em prática na floresta do Tapajós, no Pará. O projeto Coomflona Tapajós, coordenado pela organização BVRIO, em parceria com Cooperativa Mista do Tapajós – que reúne marceneiros da floresta – mostra como é possível combinar manejo florestal, capacitação, tecnologia, design e um modelo de negócios competitivo, que agrega valor a sobras de madeira.
Desde 2016, a BVRio promove o encontro de renomados designers brasileiros e a sabedoria e as habilidades dos carpinteiros do Tapajós para a produção de móveis e objetos de decoração que já foram exibidos e comercializados em São Paulo, Milão, Miami, sempre usando madeira certificada e investindo no aprimoramento das técnicas dos ribeirinhos, profundos conhecedores das madeiras do Tapajós, Pará.
“Estamos unindo mundos completamente distintos num movimento conjunto de geração de empregos, qualificação e exploração sustentável dos recursos da Amazônia”, resume o coordenador do projeto “Design & Madeira Sustentável” da BVRio, Renato Castro dos Santos, num painel sobre o case de sucesso.
O Fórum Amazônia +21 continua com programação na tarde do dia 6 até o seu encerramento, envolvendo autoridades e especialistas em torno de novos modelos para o desenvolvimento sustentável da Amazônia Legal.
