Para elevar a qualidade das rodovias federais públicas são necessários investimentos anuais na ordem de R$ 12 bilhões em obras de manutenção, duplicação e construção de trechos. Os dados fazem parte do estudo inédito da Confederação Nacional da Indústria (CNI) intitulado “Investimentos públicos e as rodovias federais no Brasil: evolução e perspectivas”, que estimou o quanto o país precisa investir nos 50 mil km de rodovias sob administração do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).
De acordo com o levantamento, a demanda por investimentos nessas rodovias foi R$ 11,1 bilhões e R$ 12,2 bilhões, nos anos de 2019 e 2020 respectivamente, enquanto o valor efetivamente executado anualmente esteve em torno de R$ 7,4 bilhões. Para 2022, a demanda estimada é de R$ 12,3 bilhões e o orçamento do DNIT para investimentos em rodovias, de R$ 6 bilhões, cerca da metade do valor necessário.
A crise fiscal e a consequente deterioração da capacidade de investimento público impactaram diretamente o modal rodoviário. Após alcançar o pico de investimentos de R$ 41,3 bilhões, em 2010 (a preços de 2021), o montante estimado de recursos públicos e privados investidos nas rodovias brasileiras, em 2021, foi de R$ 16,6 bilhões, o menor desde 2005. A queda foi particularmente acentuada no caso do Orçamento do governo federal – fonte de recursos do DNIT – e dos Departamentos de Estrada e Rodagem (DERs) estaduais.
“A crise fiscal e a consequente deterioração da capacidade de investimento estatal tiveram impacto direto no transporte rodoviário. A retomada dos investimentos é urgente para que o transporte de cargas e o tráfego de veículos em geral sejam feitos com segurança e agilidade”, afirma o gerente-executivo de Infraestrutura da CNI, Wagner Cardoso.
As atividades do DNIT estão concentradas em manutenção e adequação das rodovias sob sua administração, e apenas secundariamente em construção, por conta da necessidade de priorizar os gastos e reflexo da crescente fragilidade orçamentária. Em 2020, 58% dos gastos foram direcionados para manutenção, 28% para adequação e 14% para construção. A atual malha federal administrada pelo DNIT é dominantemente composta por rodovias de pista simples (94% do total) e apenas 2% da extensão encontra-se em duplicação (746 km).
No caso dos investimentos privados, percebe-se uma maior estabilidade no nível de recursos aplicados, que atualmente respondem por 45% do total. A maior parte dos recursos investidos pelas concessionárias tende a se concentrar em determinados períodos (tipicamente os primeiros cinco anos após a assinatura do contrato). Nesse sentido, à medida que avançarem as licitações e relicitações no novo ciclo iniciado em 2017-18, tanto no âmbito federal quanto estadual, o total de gastos privados de capital deve se recuperar e, possivelmente, se posicionar em valores superiores ao ciclo passado, o que revela a importância da manutenção e expansão dos programas de concessões rodoviárias.
Alternativas para assegurar os investimentos na malha rodoviária pública
O estudo destaca que, dada a crise fiscal que o país enfrenta nos últimos anos – agravada pelo choque que a pandemia provocou nas contas públicas –, o financiamento da demanda por recursos públicos federais para investimentos em rodovias depende de múltiplas alternativas.
A primeira alternativa seria realocar recursos do orçamento do governo federal na sua dimensão discricionária, e logo de maior flexibilidade. Em 2021, as despesas “discricionárias” – na realidade muitas já são impositivas – são estimadas em 1,45 % do PIB. Vale lembrar que as despesas discricionárias eram de 2,4% do PIB em 2008 e 2,5% do PIB em 2014. A disputa por esses recursos no âmbito da programação orçamentária dificulta cada vez mais a alocação de recursos para o DNIT.
Na impossibilidade de realocação orçamentária (exceto na margem), uma segunda alternativa seria descentralizar e transferir a operação dos ativos para estados (e eventualmente municípios), por meio, por exemplo, de convênios de delegação. Essa possibilidade deveria ser explorada, principalmente no caso dos entes subnacionais com situação fiscal mais sólida, com DERs mais bem estruturados e maiores orçamentos de investimento.
Mesmo estados com limitações orçamentárias para investimento, poderiam – isoladamente ou com apoio do BNDES ou outras instituições – absorver rodovias federais de “vocação” ou interesse estadual para serem licitadas individualmente ou em blocos, dentro de contratos de manutenção e adequação. Para tanto, seria necessário um estudo prévio de viabilidade para assegurar não apenas um volume mínimo de tráfego que sustente uma concessão simples, mas que os estados demonstrem efetiva capacidade de regular e fiscalizar as concessões, seja por meio da sua autarquia especializada (DER), seja por uma agência estadual de regulação.
Uma terceira fonte de recursos complementares e com histórico de relativo sucesso são os pedidos de financiamento junto a instituições multilaterais, a exemplo do BID e Banco Mundial, com um longo histórico de assistência ao país. Deve-se, contudo, explorar ativamente outras alternativas, a exemplo do New Development Bank (NDB) e do Asia Infrastructure Development Bank (AIDB) – em ambos os casos o país é sócio e possivelmente subutiliza os recursos disponíveis. Nessas instancias multilaterais, a demanda será por operações ambientalmente corretas em infraestrutura verde.
Os números do DNIT mostram que mais de 50% da malha rodoviária federal se encontra em estado “regular”, “ruim” ou “péssimo”. “A melhoria dessa infraestrutura rodoviária deve ser encarada como prioritária, tendo em vista o retorno à sociedade e ao setor produtivo, a partir das reduções de custos logísticos, de acidentes e de emissão de poluentes”, destaca o especialista em Infraestrutura da Matheus de Castro.