O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) do Amazonas terminou o primeiro semestre de 2013 com 161 matrículas em cursos de qualificação e aperfeiçoamento profissional para imigrantes haitianos. Os caribenhos - que vieram ao Brasil em busca de melhores condições de vida depois de guerras civis e desastres naturais consecutivos - já realizaram, desde 2011, 428 cursos nas unidades do SENAI em Manaus. Os estudantes iniciaram as aulas no SENAI por meio de um convênio com a Paróquia São Geraldo, que integrou a rede de apoio aos haitianos na onda migratória de 2011.
O interesse maior foi por cursos na área de construção civil, como pedreiro, mestre de obras e assentador cerâmico. Mas há estudantes também nos setores de metalmecânica, eletroeletrônica, vestuário e alimentos. Essa foi a primeira vez que as quatro unidades do SENAI em Manaus receberam número tão grande de estrangeiros.
“Hoje, sabemos que é possível contribuir com a educação de um público vulnerável, ofertando a formação profissional e proporcionando mão de obra qualificada à industria”, afirma a gerente geral de Educação, Tecnologia e Inovação do SENAI-AM, Sílvia Moreira Barros . Ela – que é responsável pelo Programa SENAI de Ações Inclusivas no estado – conta que os haitianos chegam a Manaus sem perspectiva de vida, mas depois da qualificação, muitos já são empregados, constituem sua independência e o sonho de reconstruir o que ficou lá atrás.
Em 1999, foi criado em âmbito nacional o Programa SENAI de Ações Inclusivas (PSAI), cujo objetivo é promover o acesso a cursos de educação profissional e tecnológica para pessoas com deficiência e outros grupos populacionais com base em recortes de gênero, da etnia, e de maturidade. A ação do SENAI do Amazonas se insere no programa.
De acordo com o gerente executivo de Educação Profissional e Tecnológica do SENAI Nacional, Felipe Morgado, esse tipo de ação realizada nos estados faz o SENAI cumprir sua missão de promover a educação profissional e tecnológica. “Vemos a formação dos haitianos como uma oportunidade de melhoria da mão de obra para a indústria amazonense”, revela.
REDE DE APOIO – Os imigrantes entraram no SENAI por meio de um convênio com a Paróquia São Geraldo, localizada na capital amazonense. Ainda em 2011, no início da onda migratória, o grupo de religiosos da congregação Missionários de São Carlos, que atua no serviço aos estrangeiros, acolheu os haitianos que se estabeleceram em Manaus.
“Notamos que boa parte dos haitianos não tinha uma profissão. Solucionar isso foi uma preocupação. Por isso, procuramos o SENAI”, lembra o pároco Valdeci Mayer Molinari. Segundo ele, no início, o interesse era menor, mas à medida que os primeiros haitianos começaram a trabalhar, outros imigrantes buscaram se qualificar. Para facilitar a comunicação, ao mesmo tempo em que tinham aulas no SENAI, os haitianos também aprendiam português no Centro de Educação Tecnológica do Amazonas (Cetam), outro parceiro da paróquia.
O haitiano Theoli Joseph, 39 anos, chegou ao Amazonas em fevereiro de 2012, vindo da República Dominicana, onde concluiu a graduação em engenharia civil. No Brasil, com o diploma sem validade, decidiu apostar na formação profissional na área de construção civil. Já fez cursos de mestre de obras, AutoCAD (programa de computador para desenho mecânico), informática avançada e soldagem.
Depois da qualificação, Theoli já conseguiu quatro serviços como mestre de obras, entre reformas de casas, apartamentos e da creche da Paróquia São Geraldo, e às vezes contratar até duas pessoas para auxiliá-lo. “Eu gosto do Brasil. Aqui, eu consigo estudar, trabalhar na área. É mais tranquilo para mim.”, revela ele, que pretende trazer ao país a mais velha dos três filhos que mora na República Dominicana.
IMIGRAÇÃO – A história recente do Haiti é marcada por dificuldades, com governos ditatoriais, instabilidade política, baixo índice de desenvolvimento humano e desastres naturais. Em janeiro de 2010, um terremoto de grande magnitude (7,3 pontos na escala Richter) atingiu a capital Porto Príncipe. Logo depois, foram sentidos outros tremores com magnitude em torno de 5,9 graus. O palácio presidencial, várias escolas, hospitais e outras construções ficaram destruídos e estima-se que 80% das construções de Porto Príncipe foram destruídas ou seriamente danificadas.
Em 2011, muitos cidadãos começaram a buscar melhores condições de vida fora do país. O Brasil já havia se aproximado da população, desde 2004, por ter o maior contingente de soldados na Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustah). Além disso, um jogo da seleção brasileira de futebol e um desfile dos jogadores em carro aberto pelas ruas da capital em agosto desse mesmo ano mobilizou toda a população do país.
Com o movimento migratório para o Brasil, o governo federal decidiu no fim de 2011 legalizar a entrada de haitianos. Desde aquele ano, já foram concedidos 6,4 mil vistos de residência. Esse documento dá a eles direito a estudar, trabalhar, montar o próprio negócio.