Nova era industrial transformará produtividade global

Brasil precisa se basear na tecnologia e na inovação para aproximar Indústria 4.0 ao cenário do país

O aumento da produtividade caminha no sentido de mais uma revolução industrial. As fábricas inteligentes, com altos níveis de comunicação e capacidade de monitoramento de processos, já dão seus primeiros passos, principalmente na Alemanha e nos Estados Unidos. Mas a realidade da manufatura avançada ou Indústria 4.0 está distante do cenário brasileiro. E o país não conseguirá dar uma guinada de produtividade – elemento fundamental para o crescimento econômico – sem se basear na tecnologia e na inovação.

Na Alemanha, o desenvolvimento da nova fase industrial é considerado uma prioridade para a competitividade do país. O projeto Indústria 4.0 uniu governo, universidades e gigantes industriais para traçar estratégias para que a maior potência europeia se consolide como o principal fornecedor de tecnologias de produção inteligentes. Enquanto a nova onda industrial ganha escala no mundo, empresas alemãs já colhem resultados nas fábricas inteligentes. Na unidade de equipamentos eletroeletrônicos da Siemens, por exemplo, as máquinas operam 24 horas por dia, fabricando 950 componentes diferentes, que são encomendados automaticamente pelo sistema, e o índice de defeitos é de apenas 15 peças a cada milhão.

Nos Estados Unidos, o assunto também tem sido tratado como diretriz prioritária para a reindustrialização do país, mas o foco dos americanos tem sido o desenvolvimento de novas tecnologias. A General Electric (GE) está usando a impressão 3D a laser para fabricar peças de avião, como um motor a jato. Quando anunciou o feito, em meados do ano passado, a empresa explicou que o processo praticamente elimina os desperdícios.

"Ao contrário dos métodos de fabricação tradicionais, que esculpem as peças a partir de um bloco de metal, a manufatura aditiva ‘cresce’ as peças diretamente, usando camadas de um pó fino de metal e um feixe de elétrons ou laser. O resultado são peças complexas, totalmente densas, sem o desperdício, fabricadas em uma fração do tempo que seria necessário utilizando outros métodos”, afirma a GE.

DESAFIO NACIONAL - No Brasil, a manufatura avançada começa a aparecer, principalmente, na modernização de plantas de grandes multinacionais, sobretudo na indústria automotiva tradicional. Entretanto, o mesmo não ocorre em todos os segmentos industriais. Com exceção de algumas ilhas de excelência no setor produtivo, como a Embraer, progressos tecnológicos são isolados e são implementados lentamente, em função das dificuldades enfrentadas pela indústria nos últimos dez anos. Por aqui, tanto na academia quanto no governo, as discussões sobre manufatura avançada são incipientes.

"Estamos muito defasados em relação a outros países. Chegou o momento de refletir sobre as novas soluções em energia, mobilidade, grandes questões da indústria para o futuro que envolvam manufatura mais enxuta e que a gente possa alcançar", avalia João Fernando Gomes de Oliveira. Professor da Escola de Engenharia da Universidade de São Paulo (EESC-USP) e ex-diretor-presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), ele cita como exemplo a promissora indústria de carros híbridos, de menor complexidade que a automobilística tradicional, além, claro, do desenvolvimento de novos produtos.

Aperfeiçoada nos últimos anos e cada vez com mais espaço em mercados de países desenvolvidos, a indústria de carros híbridos é vista como a melhor alternativa de mobilidade e energia em relação aos combustíveis tradicionais. Segundo a Agência Internacional de Energia, desde 2005, o mercado de carros elétricos vem crescendo 24,9% ao ano, contra 3,1% do mercado de convencionais. Em 2011, as vendas globais de veículos elétricos chegaram a 50 mil unidades. Em três anos, ultrapassaram a marca dos 300 mil veículos. O maior salto se deu nos anos mais recentes: de 2012 para 2013, por exemplo, o mercado de veículos puramente elétricos cresceu 77,6%, sendo os EUA o maior mercado em termos absolutos.

Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) , Robson Braga de Andrade, a evolução das fábricas é inevitável para alguns setores industriais, sobretudo aqueles que precisam garantir a competitividade nas cadeias globais de produção. "A migração para a Indústria 4.0 não será linear. Há setores que serão obrigados a evoluir em função da competição internacional. Não fazer isso pode ameaçar a sobrevivência dessas empresas", afirma. Segundo ele, além das reformas estruturais que o Brasil ainda não fez e que terão impacto sobre a produtividade, é preciso criar programas de desenvolvimento de tecnologias específicas para as necessidades brasileiras.

EDUCAÇÃO - Um dos passos para que o país consiga impulsionar a inovação é modificar a estrutura educacional para formar profissionais mais preparados em áreas estratégicas. Por isso, o papel da educação é tão relevante ou mais que os níveis de investimento de um país. É o que sugere um estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) elaborado pelo professor Pedro Cavalcanti Ferreira. Segundo ele, se o Brasil tivesse as mesmas taxas de investimento da Coreia do Sul desde 1950, seria pelo menos 18% mais rico do que é atualmente. Por outro lado, se o país apresentasse as mesmas taxas de escolaridade que o país asiático, seria 40% mais produtivo.

Para o autor do estudo, as diferenças educacionais entre o Brasil e os outros países são a principal explicação para a baixa produtividade relativa brasileira e diminuir a desigualdade deve ser o caminho a seguir. “Aumentar a quantidade e a qualidade da educação é essencial para aumentar a produtividade do trabalho no Brasil”, alerta.

A conclusão é semelhante ao diagnóstico do estudo Indústria brasileira: da perda de competitividade à recuperação? , publicado recentemente pela CNI. O documento leva em conta um cenário de competição internacional e reconhece os efeitos positivos da desvalorização do real frente ao dólar no desempenho exportador das indústrias brasileiras. Mas alerta que os resultados são bons apenas em curto prazo.

Ganhar competitividade de maneira sustentável, segundo o estudo, depende do aumento da produtividade, ou seja, de mudanças estruturais, na capacidade de produzir do país. "O futuro da indústria brasileira depende da retomada do crescimento da produtividade, o que requer educação, isto é, trabalho qualificado, e investimento, sobretudo, em inovação", aponta o documento.

As inovações decorrentes da manufatura avançada já deram resultados para empresas que apostaram nela. Na Toyota e na Nissan, o tempo de desenvolvimento de um novo modelo caiu até 50% a partir do momento que designers e engenheiros passaram a usar informações digitalizadas e testes virtuais de peças. Na Embraer, a produção do jato Legacy 500, em São José dos Campos, começou de forma virtual em 3D. O projeto teve 12.000 horas de testes antes de a aeronave fazer a primeira decolagem. Defeitos que eram detectados somente com o avião no ar foram resolvidos ainda na fase de preparação. Com todos os ganhos da digitalização, o tempo de montagem caiu 25%.

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