Criador da área de inovação da Embraer, onde foi diretor de Estratégia de Inovação e Corporate Venturing até agosto deste ano, Sandro Valeri analisa, nesta entrevista, o desempenho brasileiro no Índice Global de Inovação, os entraves para uma posição mais favorável e a forma como medidas protecionistas decorrentes da pandemia de Covid-19 podem impactar o avanço do país rumo a uma economia com alto nível tecnológico. Professor convidado da Fundação Dom Cabral (FDC), Valeri também explica o ciclo virtuoso da inovação que impulsiona os desenvolvimentos econômico e humano de uma nação.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Em 2020, o Brasil subiu 4 posições no Índice Global de Inovação, mas ainda está na 62ᵃ posição, atrás de países como Chile e México. Ainda estamos inovando menos, ou as outras nações é que estão inovando mais?
SANDRO VALERI - A variação sutil vem pela diminuição gradual e constante do nível de inovação do país em relação aos investimentos. Embora o Brasil venha evoluindo em sua capacidade inovadora, seja em pesquisa e desenvolvimento, ambiente regulatório ou infraestrutura, essa melhoria não tem se traduzido em resultados em virtude dos cenários econômico e político. Além disso, as outras nações vêm apresentando um ritmo mais acelerado de desenvolvimento dos seus ecossistemas de inovação.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Quais são os principais entraves para que o país não tenha, na inovação, desempenho proporcional à sua economia na escala global?
SANDRO VALERI - Começamos pelo nosso ambiente institucional, que vem trazendo instabilidade política nos últimos anos, com consequente aumento da insegurança jurídica. Também temos mantido problemas estruturais, como carga tributária elevada, burocracia para abertura de empresas, gargalos na infraestrutura e educação precária, aliados à dificuldade de acesso a financiamento e à baixa disponibilidade de capital de risco.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Em que medida a inovação contribui para os desenvolvimentos humano e econômico de uma nação?
SANDRO VALERI - A inovação é fundamental e ligada a ambos. Do ponto de vista econômico, é o oxigênio das nações ao passo que renova os setores econômicos e gera receitas, produtividade e empregos. Do ponto de vista humano, a busca pela inovação promove o aumento do nível educacional da população e o desenvolvimento de tecnologias que contribuem para a solução de problemas como saneamento básico, saúde, longevidade, poluição, produção de alimentos e mitigação dos efeitos climáticos. Dessa forma, cria-se um ciclo virtuoso no qual as pessoas são educadas e aumentam o poder de inovação de um país, gerando novos negócios e tecnologias que, por sua vez, aumentam emprego e renda.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Uma das possíveis consequências da pandemia de Covid-19 é o aumento do protecionismo. Caso isso ocorra, a capacidade de inovação do Brasil será afetada?
SANDRO VALERI - Podem ocorrer impactos devido à diminuição de intercâmbio de tecnologias, conhecimento e mesmo de insumos básicos. A redução dessas trocas entre os ecossistemas de inovação pode ser prejudicial não somente para o Brasil, mas para todas as nações, e incidir na capacidade global de inovação.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Em relação ao setor industrial, o que podemos vislumbrar para os próximos anos?
SANDRO VALERI - Embora passemos por um momento de incertezas na economia e nos ambientes político e institucional, nos últimos anos temos experimentado evoluções importantes nas políticas públicas, na transformação digital e no setor privado. Fatores como a queda da taxa de juros, a evolução dos ecossistemas de startups e a aprovação de políticas públicas, como o marco legal das startups, devem favorecer a criação de novos negócios e tecnologias. Isso deve potencializar a inovação nas indústrias tanto em relação a novos negócios, especialmente nas áreas de telecomunicação, saúde, fintech e agrotech, como no aumento da produtividade pelo uso e disseminação de recursos como Internet das Coisas (IoT), inteligência artificial e plataformas digitais.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Há algo que possa nos favorecer apesar das incertezas do momento?
SANDRO VALERI - A criação de um país competitivo e desenvolvido depende de todos os atores do ecossistema de inovação. Temos, no Brasil, diversas forças que devem ser utilizadas e potencializadas, como nossa criatividade e flexibilidade, o potencial da nossa natureza e a base científica e industrial que já construímos. O nosso sucesso reside na força conjunta, persistente e ousada dos governos, das empresas, das universidades, dos investidores e dos empreendedores, alavancado o que temos de melhor e único.
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