Responsabilidade social é imposição do mundo moderno

Criado há 16 anos pelo judoca Flávio Canto, Instituto Reação atende 1.200 jovens no Rio de Janeiro e pretende transformar a vida de pessoas de baixa renda por meio da educação e do incentivo ao esporte

No judô, o termo “reação” está ligado ao momento de levantar após a queda. Foi a palavra perfeita para traduzir também o propósito da entidade social criada há 16 anos pelo judoca Flávio Canto: o Instituto Reação, que pretende transformar a vida de pessoas de comunidade de baixa renda por meio da educação e do incentivo à prática esportiva.

“Isso é um chamado, uma convocatória para todo mundo, não importa a classe social ou cultural. Todos devem reagir de alguma forma e o Reação é um espaço que incentivamos o protagonismo das pessoas”, destaca Canto, em entrevista à Agência CNI de Notícias durante as comemorações de um ano do Programa de Voluntariado da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Hoje o Instituto Reação atende 1.200 pessoas em seis polos no Rio de Janeiro: nas comunidades  da Rocinha, Cidade de Deus, Tubiacanga e Pequena Cruzada e, mais recentemente, no Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase). Canto relembra os primórdios da entidade e o processo de profissionalização pelo qual passou. “No começo, o Reação foi um projeto de jovens  com muito boa vontade, mas ao longo do tempo percebemos que para crescer precisávamos criar uma estrutura muito mais consistente, com planejamento estratégico, rotinas e planos de ações. Hoje viramos praticamente uma pequena empresa, com quatro diretores, cinco conselheiros e 50 funcionários”, conta. Confira a entrevista completa!

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Como vem sendo a profissionalização de iniciativas sociais como o Instituto Reação?

FLÁVIO CANTO - No começo, o Reação foi um projeto de jovens com muito boa vontade, mas ao longo do tempo percebemos que, para crescer, precisávamos criar uma estrutura muito mais consistente, com planejamento estratégico, rotinas e planos de ações para cada coordenação. Hoje viramos praticamente uma pequena empresa. Hoje temos quatro diretores e cinco conselheiros, todos voluntários. Temos cerca de 50 funcionários para cuidar de questões administrativas, financeiras, de comunicação, entre outras. Temos construído desde a nossa identidade, valores, missão, forma de gestão. Temos pessoal de mercado financeiro, consultoria, entre outros. Enfim, tudo ficou muito organizado. A responsabilidade social, seja pessoa física ou jurídica, virou uma imposição da dinâmica que temos hoje no mundo. Percebo que houve uma migração da filantropia e do assistencialismo para uma responsabilidade social mais consistente.
 

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Como o contato com a iniciativa privada ajudou nessa profissionalização do terceiro setor?

FLÁVIO CANTO - Não vejo mais as pessoas e empresas verem o apoio social como ajuda, mas como investimento. A coisa ficou séria. Até quem sobrevive nessa plataforma são os projetos que conseguem ter resultados. Hoje o que fazemos com nossos parceiros é entender o tipo de entrega que eles esperam e trabalhar em função disso. E os modelos não são genéricos, cada empresa que nos apoia tem um objetivo diferente.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Há indicadores para mensurar os impactos da iniciativa?

FLÁVIO CANTO - Ainda estamos distantes do que seria para mim uma avaliação e um monitoramento de impacto ideal. Temos alguns indicadores que criamos em parceria com a IBM. A empresa nos ajudou a construir um software de gestão, para acompanhamento de ações e resultados. E estamos definindo outros indicadores, mais voltados para medir o impacto na vida dos participantes dos projetos. Temos indicadores óbvios como número de alunos na escola e notas dos participantes dos projetos. Todos os participantes do projeto, mesmo que entrem no Reação sem estar na escola, acabam estudando no fim das contas. Temos também metas competitivas, de atletas em praticamente todas as seleções de judô do Brasil desde o juvenil. Enfim, cada programa tem seu conjunto de metas e indicadores. Estamos começando a introduzir no sistema do Reação um sistema de meritocracia e o nosso produto é bem claro: vidas transformadas. Mas precisamos precisamos criar e construir indicadores para isso.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Qual a importância da integração entre o terceiro setor e empresas?

FLÁVIO CANTO - Não vejo mais empresa séria que não tenha uma plataforma que envolva o terceiro setor e a responsabilidade social. Isso é uma imposição do mundo moderno. Responsabilidade social é até uma forma dos outros enxergarem você a empresa como alguém que merece respeito. O privilégio de poder crescer, mas sem compartilhar o crescimento, faz pessoas e empresas menos relevantes e respeitadas. Um movimento crescente que chama a minha atenção são empresas que, além de apoio a projetos sociais, incentivam os funcionários a serem voluntários em projetos sociais.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – O Instituto Reação conta com esse apoio de voluntários de empresas?

FLÁVIO CANTO - Sim, por exemplo , o software de gestão que temos foi desenvolvido por voluntários da IBM. Então, tem muita gente ajudando e participando do dia a dia do Reação. As empresas percebem que um bom funcionário se relaciona bem com todo mundo e usa parte de sua vida em ações de voluntariado. Isso torna a pessoa melhor, mais interessante, e também se reflete na sua maneira de trabalhar, na sua maneira de se relacionar na empresa.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Quais são as formas de a empresa apoiar ações sociais?

FLÁVIO CANTO - Há empresas que apoiam via lei de incentivo, que se preocupam menos com retorno. Mas existem vários outros tipos. Já tivemos empresa do setor de energia que nos apoiou para incluirmos em nossos projetos questões de cidadania e conscientização sobre a proibição do gato (ligação elétrica clandestina), por exemplo. Isso é uma maneira de a empresa ganhar respeito pelo que ela proporciona à comunidade por meio do Reação. Há ainda empresas que se preocupam com esportes de alto rendimento e querem se associar ao instituto por essa via.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Como valia a responsabilidade social corporativa no Brasil com outros países?

FLÁVIO CANTO - Ainda estamos engatinhando, mas pelo menos já saímos do berço.

AGÊNCIA CNI DE NOTÍCIAS – Como ampliar mais a responsabilidade social corporativa no Brasil?

FLÁVIO CANTO - Temos um lado cultural que atrapalha bastante. Os brasileiros, em geral, têm uma tendência de responsabilizar os outros, sobretudo do Estado, sobre os problemas da sociedade. Precisamos assumir mais responsabilidades e aprender a nos representar. Estamos em um momento difícil para o país, com dificuldades de se sentir representado na política. Mas acho que cabe a cada um ter esse protagonismo, de se representar. Isso é quase uma revolução de pensamento pela qual precisamos passar. Nos Estados Unidos, as pessoas têm um perfil mais autônomo, independente e uma cultura de depender e esperar menos do Estado. Talvez estejamos mal acostumados e acabamos sempre por nos eximir da responsabilidade. Quando uma criança não está na escola, essa responsabilidade é só do Estado? Também é nossa. Assumir a responsabilidade por tudo e por todos faz a diferença.

REPRODUÇÃO DA ENTREVISTA - As entrevistas publicadas pela Agência CNI de Notícias podem ser reproduzidas na íntegra ou parcialmente, desde que a fonte seja citada. As opiniões aqui veiculadas são de responsabilidade do autor. Em caso de dúvidas para edição, entre em contato pelo e-mail imprensa@cni.org.br.

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