De um dia para o outro, milhões de estudantes em todo o mundo foram forçados a deixar as salas de aula para seguir estudando a distância por causa da pandemia do novo coronavírus. A grande maioria das instituições de ensino não estava preparada para a mudança repentina. A espanhola IE Business School, pioneira em aulas virtuais – presentes na instituição há mais de 20 anos – ao contrário, seguiu com suas aulas sem impactos aos seus alunos.
O programa de MBA on-line da escola de negócios europeia foi eleito, pelo segundo ano consecutivo, o segundo melhor MBA on-line do mundo, de acordo com o ranking do Financial Times. Nesta entrevista, Ignacio Gafo, diretor do programa on-line da IE Business School, diz que o sucesso de um curso on-line não tem relação com grandes investimentos em tecnologia, mas com capacitação de profissionais, adaptação à realidade dos alunos e uso de diferentes ferramentas pedagógicas. Confira!
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Reter a atenção dos alunos é, talvez, a tarefa mais difícil em cursos online. Qual é a receita dos professores da IE Business School?
IGNACIO GAFO - Unimos três elementos fundamentais: a aprendizagem ativa, a utilização de diferentes metodologias e a busca por uma comunicação fluida com o aluno para que ele acompanhe seu progresso. Há muita metodologia, estudo e formação por trás de um bom curso on-line. A aprendizagem ativa é importante porque o aluno não pode só ficar ouvindo uma aula de uma hora e meia, sobretudo no ambiente on-line. A chave é fazer com que ele continuamente faça pequenas coisas. Em vez de apresentar algo, prefiro debater um caso concreto ou dividir a turma em grupos para que apresentem um trabalho, envolvendo os alunos e estimulando essa participação ativa.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Como funciona isso na prática?
IGNACIO GAFO - É essencial combinar diferentes ferramentas. É um erro pensar que há uma ferramenta “estrela”. O que está muito na moda é a gamificação. Os alunos jogam, todos adoram, mas te garanto que na quarta simulação eles não vão querer mais saber disso para o resto da vida. O negócio, então, é combinar essas diferentes ferramentas pedagógicas para que seja tudo mais dinâmico. Uma aula não precisa ser uma videoconferência, que é o que quase todas as escolas e universidades têm feito hoje em dia. Podem ser feitos fóruns de discussão, simulações, jogos, dinâmicas, questionários, interpretações de papéis, tarefas individuais e em grupo.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Que dica o senhor daria para professoras e professores que estão estreando no ensino a distância?
IGNACIO GAFO - É preciso experimentar coisas novas. O importante é pensar que essa inovação não deve ser perfeita, e nós, como professores, não podemos ter medo de errar. O aluno gosta de inovações. Estamos competindo pela atenção do aluno o tempo todo. A diferença para as aulas presenciais é que, numa sala de aula, se o aluno está desmotivado, ele continua desmotivado ouvindo sua aula. Agora, se está em casa, ele pode se conectar a um site, ver vídeos, acessar as redes sociais...
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - No Brasil, muitos não têm uma boa conexão de internet ou mesmo computador. Como driblar essas dificuldades?
IGNACIO GAFO - É importante buscar diferentes exercícios e dinâmicas que não demandem uma conexão constante, mas que possibilitem o trabalho remoto. O que está cada vez mais comum aqui na Europa é o trabalho por projetos, com entregas parciais. Uma coisa que funciona muito bem é a customização, no sentido de adaptação, propondo projetos que tenham conexão com eles, como ensinar economia falando de futebol.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Os brasileiros são muito conectados às redes sociais. É possível aproveitar isso de alguma maneira para aulas?
IGNACIO GAFO - Acredito que sim, mas com cautela. Mais do que as redes sociais em si, o que se deve levar em consideração e aproveitar é a dinâmica que elas oferecem. Posso usar uma ferramenta própria que tenha semelhanças com as redes sociais, mas que não tenha as distrações delas. O que me interessa são os princípios e não as ferramentas utilizadas.
REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - A maioria das escolas não tem a estrutura da IE Business School. Como trabalhar nessa situação?
IGNACIO GAFO - Há muito mito em relação aos investimentos em tecnologia. Na IE, o que realmente nos diferencia não é a tecnologia ou a estrutura, e sim o know-how que temos, o alto conhecimento de pedagogia, de como funciona o on-line e de como engajar alunos. No Brasil, há escolas muito competentes e ótimos pesquisadores, então não há nenhum impedimento para que ofereçam excelentes cursos on-line. O que deve ser feito é focar na pedagogia, pensar em como se conectar com o aluno, como melhorar a comunicação. A questão não é investir em um excelente computador ou em um aplicativo super avançado; isso é um equívoco. Se fosse assim, as entidades que mais gastam com infraestrutura e tecnologia seriam as melhores, coisa que, te garanto, não é o que acontece.