Só a recuperação industrial promove crescimento sustentado

Presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Tecnológico (IEDI), Dan Ioshpe, enumera quatro condições para o fortalecimento da indústria brasileira nos próximos anos

Dan Ioschpe afirma que a intranquilidade (institucional) é muito danosa e retira esforço da tração industrial

Tranquilidade institucional, equilíbrio macroeconômico, combate à desigualdade social e sustentabilidade ambiental são quatro requisitos para o Brasil estimular o processo de reindustrialização, afirma Dan Ioschpe, presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).


“Preservadas essas condições, é necessária também uma agenda de competitividade e produtividade”, afirma ele, que integra o conselho deliberativo da Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).


Confira a seguir, a entrevista: 

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, defendeu a reindustrialização do Brasil ao tomar posse como ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC). Como você vê essa proposta?

DAN IOSCHPE - Acho que há um entendimento, que o ministro expressa muito bem, de que o desenvolvimento socioeconômico do nosso país passa pelo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) industrial. Vai ser muito difícil ter um crescimento médio significativo ao longo dos próximos anos se a indústria não passar por uma recuperação.

Tivemos um desempenho muito forte do setor agrícola e do setor de serviços, mas, quando a gente olha o bojo do país, a gente não encontra esse crescimento relevante do PIB, justamente porque uma parte muito significativa desse desenvolvimento, que deriva da indústria, não vem ocorrendo há quase quatro décadas. Para que essa recuperação ocorra, há algumas condições fundamentais.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Quais são essas condições?

DAN IOSCHPE - A gente tem dividido num grupo mínimo de condições e, depois, numa agenda de competitividade e produtividade. O item número um desse grupo mínimo é tranquilidade institucional. Entendemos que a intranquilidade é muito danosa e retira esforço da tração industrial.

Também é preciso foco nas atividades de descarbonização e a compreensão da relevância dessa agenda de sustentabilidade. A redução da desigualdade social é outra questão muito importante. A quarta condição é a necessidade de equilíbrio orçamentário do país, de equilíbrio fiscal ao longo do tempo.

Não é provável que a gente tenha solução para esses quatro pontos imediatamente, mas, se a gente não construir um caminho para isso, todo o esforço de recuperação da indústria terá baixa efetividade.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - E onde entra a agenda da competitividade e da produtividade?

DAN IOSCHPE - Essa é a agenda que, preservadas as condições anteriores, faria com que a gente chegasse a um lugar melhor do que este em que estamos hoje. Em primeiro lugar, cito a reforma tributária dos impostos incidentes sobre bens e serviços, com a criação do chamado IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que tem uma importância muito grande para que a gente, da porta para fora da indústria, busque a competitividade que, em muitos setores, já existe da porta para dentro.

Também temos a questão da guerra fiscal, que está relacionada a esse sistema fragmentado entre os estados e os municípios. Temos a questão da geração dos créditos, que é muito danosa para a indústria.

O custo de capital no Brasil é muito alto, e você ficar acumulando bilhões no setor industrial, sem perspectiva de recuperação, é muito ruim, sem falar na retenção desses créditos ao longo da cadeia por termos um sistema fragmentado, e não um IVA dual que abranja os cinco impostos relacionados a bens e serviços.

Hoje, após as discussões das Propostas de Emenda Constitucional (PECs) 45 e 110, há um melhor entendimento do problema e soluções mais próximas do modelo tradicional do IVA. Não tenho nenhuma dúvida de que a reforma tributária sobre a venda de bens e serviços seria o ato mais relevante que o governo e o Legislativo poderiam fazer neste próximo ciclo.

Entre tudo aquilo que a gente pode fazer, esse, como ato único, é o que traria maior benefício para reduzir custos e acelerar o desenvolvimento socioeconômico.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - E a área de infraestrutura?

Já existe um trabalho importante sendo feito nessa área, que precisa ser acelerado e que envolve, inclusive, a questão da tecnologia 5G, além de portos, aeroportos e estradas. O governo não vai conseguir fazer isso sozinho.

Portanto, é preciso um trabalho conjunto entre a iniciativa privada e o setor público, com mais ênfase deste último naqueles projetos de difícil viabilidade econômica, mas que também são importantes para o desenvolvimento social do país, como já se fez no passado.

Um exemplo é o Luz para Todos, no qual o governo teve um papel decisivo. Depois, temos a questão da integração do Brasil ao mundo, que é um trabalho grande. Entendemos que esse assunto deve ser acelerado, preferencialmente por meio dos acordos internacionais, diminuindo as restrições e aumentando a nossa participação no comércio exterior.

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