Diversidade: pilar estruturante na cultura da empresa

É o que defende Carlos Humberto da Silva Filho, CEO da Diaspora.Black e um dos palestrantes confirmados para o 9° Congresso Brasileiro de Inovação da Indústria

Desenhar uma estratégia em que a diversidade e a inclusão são catalisadores para mais inovação e melhores resultados ainda é um desafio para todos, mas já é realidade na Diaspora.Black, uma empresa de turismo com foco na cultura afrodescendente. Voltada para experiências que dizem respeito à cultura negra, o grupo apostou suas fichas na oferta de serviços online para suprir a demanda resultante das viagens represadas e adiadas por causa da pandemia.

Resgatar memórias e histórias brasileiras que precisam ser contadas é uma das metas da Diaspora.Black, que usa um modelo de negócio simples para conectar viajantes e anfitriões interessados em cultura negra. Apesar de bem recente, o negócio já se tornou referência entre organizações ligadas à questões raciais no Brasil.

Diante desse cenário e dos desafios sobre diversidade e inclusão, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) entrevistou Carlos Humberto da Silva Filho, CEO da Diaspora.Black, que tem mais de 15 anos de trajetória acadêmica e profissional dedicada à promoção de Direitos Humanos, com foco na promoção de igualdade racial e combate ao racismo. Carlos Humberto participou da implementação de projetos de impacto social pioneiros e emblemáticos no Brasil, como A Cor da Cultura (Fundação Roberto Marinho), além de atuação em movimentos sociais de combate à desigualdade racial e social.

Carlos Humberto é presença confirmada no 9º Congresso Brasileiro de Inovação da Indústria, em março. Ele vai participar do fórum "Diversidade e inclusão como motores da inovação”, no dia 9, às 16h.

AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – Vamos começar falando um pouco sobre a Diaspora.Black. Como ela surgiu e como atua hoje?

CARLOS HUMBERTO - Somos um marketplace de turismo e cultura negra com serviços de anúncios e reservas de hospedagens (casas compartilhadas, hostels, pousadas, hotéis), roteiros, pacotes de viagens e eventos online (tours virtuais, cursos, oficinas, palestras, workshops) e ainda, com venda de treinamentos e consultorias para o trade de turismo. Nascemos porque o mercado brasileiro de turismo apresenta grandes desafios, tais como: ampliação de visitantes, otimização de todos os legados e diferenciais culturais e um maior preparo para receber turistas e visitantes mais diversos entre eles a população negra. E também por constatarmos a necessidade de treinamentos para empresas trabalharem políticas e programas para diversidade e inclusão.

Criamos uma plataforma para potencializar toda riqueza e diversidade cultural brasileira ligadas às heranças da população que corresponde a mais de 54% do país. Nascemos para apresentar essas histórias, patrimônios e legados a todos e atrair novos visitantes e consumidores do turismo. E desenvolvemos, a partir de metodologias próprias, treinamentos e consultorias que apoiam o desenvolvimento de políticas, programas e ações para diversidade corporativa com monitoramento e mensuração dos resultados.

AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – A diversidade e a inclusão são pontos que serão debatidos nesse 9° Congresso de Inovação. Na sua visão, como esse tema pode ser considerado motor da inovação para o Brasil?

CARLOS HUMBERTO - O Brasil, além de ter uma extensão continental, é um dos países mais populosos do mundo. Suas riquezas são maiores quando falamos de diversidade, sendo de conhecimento mundial seus aspectos de pluralidade. Só a população negra no país é a segunda maior do planeta, ficando atrás somente da Nigéria. A inovação deve responder a demanda da sociedade. Pensar em inovação é pensar em soluções reais, com potencial para impactar a vida das pessoas. E as soluções surgem a partir de um conjunto de necessidade, problemas ou desafios. Neste aspecto, o país demonstra uma importante vocação para ser um manancial de inovação.

Porém, implementar políticas e ações para diversidade não atende somente a demanda da sociedade, mas reflete inúmeros benefícios para as empresas. Esses resultados devem ser considerados nas estratégias de contratação, sobretudo, porque estamos diante de uma nova realidade, onde o novo normal é cuidar de pessoas para vencer desafios. É fundamental que gestores de equipes e o RH promovam iniciativas pautadas em políticas de diversidade e equidade racial, pois isso pode produzir resultados significativos para a saúde e bem-estar de seus colaboradores e maiores resultados para a empresa.

AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – Muito se fala em promover a diversidade e a inclusão dentro das empresas, mas como superar esse desafio?

CARLOS HUMBERTO - Não é uma questão de preparo, é uma necessidade cada vez mais urgente. Viramos a página sobre o formato de gestão, operação e comportamento das empresas. Organizações que não compreenderem a necessidade e não iniciarem o desenvolvimento de ações e políticas para a diversidade se tornarão automaticamente ultrapassadas. A diversidade deve ser um pilar estruturante na cultura da empresa. Ambientes mais diversos produzem espaços de trabalhos mais saudáveis e ainda propõem uma maior performance de seus colaboradores.

O trabalho pode ser iniciado a partir de um diagnóstico em paralelo ao desenvolvimento de novas diretrizes para contratação de pessoas. O passo seguinte é compreender quais demandas essa diversidade traz na consolidação de um espaço de trabalho saudável, com representatividade, sem situações discriminatórias cotidianas e na sequência com a criação de indicadores, objetivos e monitoramento destas ações. Tudo isso demanda estudos e treinamentos para os diferentes quadros da organização estarem preparados para o desenvolvimento desta agenda. 

AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA - A pandemia acelerou processos e novos modelos de trabalho. Como a diversidade e a inclusão contribuíram para a construção de novos cenários?

CARLOS HUMBERTO - A pandemia impôs novos desafios à dinâmica do trabalho e a operação de empresas de diferentes setores. Com o distanciamento social e a jornada home office, ficou ainda mais evidente a lacuna das desigualdades. Se por um lado, muitos profissionais encontraram em suas casas um excelente espaço para o desenvolvimento de seus trabalhos, por outro, muitos profissionais passaram a ter o desafio de produzir em meio a muitas dificuldades de suas realidades e em alguns casos, com desafios estruturais. Ao mesmo tempo, cresceram exponencialmente as cobranças da sociedade por respostas aos inúmeros casos de racismo que rapidamente ganharam dimensões globais, como os casos dos assassinatos de Jorge Floyd nos EUA e de João Alberto, no Brasil, que foi morto por asfixia pelas mãos de seguranças de uma loja da rede Carrefour. Ambos os fatos, associados a inúmeros outros que ganharam as redes, geraram comoção e indignação global. Diferentes grupos sociais intensificaram a cobrança de respostas a gestores públicos e privados.

Neste mesmo movimento empresas que já haviam iniciado ações para diversidade começaram a aprofundar o marcador de equidade racial, promovendo ações específicas para equidade racial. De fato, os setores de tecnologia e inovação tiveram respostas mais rápidas, desde políticas de contratação com programas focados em profissionais negros, investimentos, treinamentos e novos indicadores. Os dois grandes fenômenos que nos últimos dois anos mudaram o rumo do planeta - a maior crise global sanitária e os graves casos de racismo - contribuíram para chegarmos em ambientes de trabalho mais diversos e conectados, ainda que à distância.

AGÊNCIA DE NOTÍCIAS DA INDÚSTRIA – Quais são os caminhos que o Brasil deve trilhar para ser mais inovador?

CARLOS HUMBERTO - Não podemos pensar em inovação no país sem olhar para a necessidade de disseminação de acessos a oportunidades, ferramentas e investimento. Para se consolidar como esse grande polo de inovação que reflete sua pluralidade, é preciso que essa representatividade esteja presente em variados espaços do ecossistema de inovação. O comprometimento dos diferentes setores Público, Privado e Sociedade Civil são estratégicos no desenvolvimento de políticas e programas. Políticas sociais, educacionais e de saúde pública reforçam as condições básicas para potencializar essa agenda, assim como o acesso a programas de formação e desenvolvimento de profissionais de tecnologia, empreendedorismo e marketing trazem ferramentas importantes dessa engrenagem.

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