Ações do SESI e do SENAI têm valor inestimável

Em entrevista à Revista Indústria Brasileira, o economista José Roberto Afonso comenta iniciativas do Sistema Indústria no enfrentamento à pandemia, mas também lembra que é importante aproveitar as oportunidades geradas pela crise

A situação de emergência gerada pela Covid-19 cria oportunidades imediatas para se aproveitar instrumentos, públicos e privados, e investir na melhoria da produtividade do trabalho no país, afirma o economista José Roberto Afonso, economista e professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), no Distrito Federal.

“Há uma tendência inexorável à digitalização da economia, à racionalização de processos e ao aumento da produtividade. A pandemia provocada pelo novo coronavírus só veio acelerar e exigir, de imediato, as respostas que buscamos no longo prazo”, diz Afonso, numa análise que considera não só as perdas provocadas pela pandemia, mas também os benefícios colaterais que ela pode produzir.

Entre eles, o reconhecimento da capacidade de mobilização e atuação de instituições como o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e o Serviço Social da Indústria (SESI) diante da crise.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Como o senhor vê as ações realizadas pelo SENAI e pelo SESI, em parceria com empresas e hospitais, para ajudar na prevenção do novo coronavírus e na manutenção de respiradores?

JOSÉ ROBERTO AFONSO - O enfrentamento da Covid-19 é prioridade máxima, com investimentos em saúde, que não requerem apenas recursos, mas também criatividade e parcerias, inclusive sempre que possível conciliando saúde com economia. Produzir respiradores, outros equipamentos e insumos hospitalares também é uma forma de proteger a economia. Essas ações são de um valor inestimável.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Qual é, na sua opinião, a importância dessas ações, seja na oferta de cursos de capacitação profissional ou no apoio às empresas?

JOSÉ ROBERTO AFONSO - São ações fundamentais. Antes da Covid-19, já seria necessário promover uma requalificação da mão de obra atuante no mercado de trabalho e também mudar a formação dos novos trabalhadores. Há uma tendência inexorável à digitalização da economia, à racionalização de processos e ao aumento de produtividade. A pandemia provocada pelo novo coronavírus só veio a acelerar e exigir, de imediato, as respostas que buscamos no longo prazo. Boa parte dos trabalhadores informais que passaram a receber auxílio emergencial também poderiam ser contemplados por um programa com visão trabalhista e não apenas assistencialista. É o que chamo de seguro-destrabalho, que beneficie também trabalhadores independentes e não apenas aqueles que perderam o emprego.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Em artigo publicado no Correio Braziliense, o senhor afirma que as entidades do Sistema S têm um papel importante na mudança estrutural nas relações de trabalho e na forma de funcionamento da economia que a pandemia impõe. De que forma isso ocorre?

JOSÉ ROBERTO AFONSO - O governo federal erra ao adotar medidas na direção inversa, inclusive no combate à Covid-19. É risível supor que se desonera folha salarial cortando alíquotas das contribuições ao Sistema S, como se algum empregador, no meio de uma recessão que está para virar depressão, fosse contratar novos empregados ou manter os atuais porque teve uma redução de irrisórios pontos percentuais nos encargos patronais.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - No atual contexto, qual a importância da estrutura, da capilaridade e do conhecimento setorial de instituições como o SENAI e o SESI?

JOSÉ ROBERTO AFONSO - O caminho deveria ser justamente o oposto ao sinalizado pelo Ministério da Economia. O Sistema S já tem estrutura pronta e nacionalizada, podendo rapidamente ajustar seu funcionamento para passar a oferecer cursos profissionalizantes a distância e até usar as estruturas físicas das entidades assistenciais para complementar ações públicas de saúde e assistência social. No lugar de aproveitar o que já existe, o governo parece ficar cego por ideologia, perdendo o mínimo de racionalidade técnica e bom senso. Mas a gravidade da crise é de tal ordem que espero que o governo possa vir a corrigir seus rumos, ouvindo e pactuando com as lideranças empresariais e dos trabalhadores do país.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Que riscos estamos correndo neste momento?

JOSÉ ROBERTO AFONSO - Não se deve enfraquecer instituições que poderiam atuar com o poder público no combate à crise, seja pelo viés educativo, com oferta de cursos online e gratuitos abertos à população durante o período de quarentena, seja aproveitando a infraestrutura física de suas unidades para aumentar o número de leitos, distribuir mantimentos à população e criar postos de vacinação e de testes da doença.

REVISTA INDÚSTRIA BRASILEIRA - Na sua opinião, que papel essas entidades podem ter na recuperação econômica pós-pandemia?

JOSÉ ROBERTO AFONSO - O Brasil tem, há décadas, um eficiente e amplo sistema de proteção trabalhista, que vai desde o Fundo de Amparo ao Trabalhador até o Sistema S. Infelizmente, o primeiro foi esvaziado financeiramente e perdeu atenção e relevância política como instrumento que, mais do que pagar benefício, também poderia qualificar melhor os trabalhadores. O setor privado conduziu muito do que deveria ser essa política de Estado por meio do Sistema S, com atuação em múltiplas áreas da economia. A emergência da Covid-19 abre oportunidades imediatas para se aproveitar instrumentos, públicos e privados, para investir na melhoria da produtividade do trabalho no país. É urgente transformar benefícios assistenciais em trabalhistas.

A Indústria contra o coronavírus: vamos juntos superar essa crise

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