A maioria daquilo que as pessoas tratam como estratégias são, na verdade, aspirações. Como o histórico discurso de John Kennedy ao Congresso dos EUA nos anos 1960, prometendo “pousar um homem na Lua e trazê-lo em segurança de volta à Terra”.
Ninguém tinha a menor ideia de como fazer, mas a estratégia da Nasa transformou a aspiração de Kennedy em capacidade. Uma estratégia é o processo de transformação de aspirações em capacidades, levando em conta o tempo, espaço e escala do que se quer fazer.
Nossa história é sobre dados pessoais. A primeira lei da natureza digital, cuja filosofia é encampada na Lei Geral de Dados Pessoais (LGPD), diz “deve-se proteger os dados das pessoas”. Leis são um tipo de aspiração. Se a sociedade onde elas são emitidas tem meios – educação, cultura, sistemas, força – para fazer com que sejam cumpridas, haverá estratégias, táticas e operações para que tal aconteça.
No Brasil, a LGPD há de se tornar norma exigível em algum prazo. Do ponto de vista das empresas, como poderíamos nomear as estratégias para transformar a aspiração de proteger os dados das pessoas em capacidade? Uma primeira poderia ser “não ter dados dos usuários”.
Se a empresa já os têm, a segunda seria “apagar todos os dados coletados até agora”. Essas possibilidades seriam reais se, ao precisar de dados para realizar uma transação, a empresa os consultasse na fonte primária ou numa secundária, um agente escolhido para servir de “representante digital” do usuário. No curto e médio prazos, o usuário não vai armazenar e cuidar de seus dados, então o que podemos tentar?
Podemos apontar duas estratégias mínimas: primeiro, só se deve coletar a quantidade mínima necessária de dados. Segundo, só se deve guardar os dados pelo tempo que for absolutamente necessário. Se essas forem as descrições para captura e posse de dados, elas podem levar à questões essenciais cujas respostas fariam parte do desenho de estratégias para tratar dados e, claro, a LGPD nos negócios.
É preciso deixar claro que a gestão do ciclo de vida de informação é um fator crítico de sobrevivência. E esse não é um problema legal ou jurídico, mas de engenharia de informação para garantir a sustentação do modelo de negócios. Os modelos de negócios centrados no usuário dependem de dados e sua gestão.
É preciso tratar dados de forma eficaz agora. A LGPD é mais uma faceta. E ela deve ser tratada de forma estratégica, partindo de um propósito básico: negócios centrados nos usuários devem respeitar o usuário. Simples assim.
Por Silvio Meira, pesquisador do Instituto SENAI de Inovação, professor emérito da UFPE e fundador e presidente do Conselho Porto Digital.
*O artigo foi publicado no O Estado de S. Paulo, no dia 26 de agosto.
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