Em defesa do Brasil que funciona

Em artigo assinado no jornal O Globo, o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, aponta consequências preocupantes para a economia, a educação e a inovação do país caso haja cortes nos recursos do Sistema S

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Integrantes do novo governo anunciam, com estardalhaço, a intenção de realizar cortes drásticos nos recursos que financiam as entidades do chamado Sistema S. Discutir o aprimoramento dessas instituições, que há oito décadas contribuem para o desenvolvimento do Brasil, é sempre bem-vindo. As propostas à mesa, entretanto, apontam numa direção muito preocupante. Falam em “meter a faca” nos recursos, mas não explicam que destino terão os imprescindíveis serviços que entidades, como o Serviço Social da Indústria (SESI) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), prestam para milhares de empresas, beneficiando milhões de trabalhadores e jovens de baixa renda.

O SENAI é a maior instituição de formação técnica e profissional da América Latina, com 2,4 milhões de matrículas anuais e 67% de gratuidade. O eventual corte de recursos que financiam as ações da entidade significaria reduzir, na mesma proporção, a oferta de cursos de educação profissional para milhões de jovens e trabalhadores, agravando ainda mais o problema de produtividade no trabalho no país. Além disso, milhares de educadores, técnicos, especialistas e pesquisadores seriam demitidos.

O SESI, por sua vez, oferece educação básica de qualidade para milhões de trabalhadores e seus familiares, além de promover ações e programas de saúde e segurança no trabalho (SST). Mais de 1 milhão de trabalhadores deixariam de ser atendidos anualmente por serviços de saúde e mais de 600 mil jovens de baixa renda perderiam suas matrículas.

As duas entidades têm um elevado reconhecimento da população brasileira com relação ao indispensável trabalho que realizam na qualificação de mão de obra de trabalhadores de vários setores, na formação de jovens de baixa renda e em ações para o aumento da produtividade e da inovação no setor industrial brasileiro. Pesquisa recente do Instituto Ibope revelou que 94% dos brasileiros consideram o SENAI ótimo ou bom e 93% afirmam o mesmo em relação ao SESI. Os empresários que financiam as duas entidades também se dizem majoritariamente satisfeitos com os serviços prestados por elas.

Como não integram o orçamento público, esses recursos não podem ser utilizados para reduzir o déficit público, como apregoam alguns integrantes da equipe econômica do novo governo

É importante destacar que a origem e a gestão dos recursos do Sistema S são privadas, conforme consta de vários acórdãos e decisões do Supremo Tribunal Federal (STF). Portanto, eventuais cortes ou realocações seriam flagrantemente inconstitucionais. Além disso, como não integram o orçamento público, esses recursos não podem ser utilizados para reduzir o déficit público, como apregoam alguns integrantes da equipe econômica do novo governo. Como seus recursos têm destinação específica, o SESI e o SENAI são permanentemente auditados pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

As duas entidades também prestam contas à sociedade por meio de sites de transparência, que são considerados os melhores do país e podem ser acessados por meio dos seguintes links: www.portaldaindustria.com.br/SENAI/canais/transparencia/ e www.portaldaindustria.com.br/SESI/canais/transparencia/

Ressalte-se, ainda, que o SESI e o SENAI estão vinculados diretamente às indústrias – e não a órgãos públicos –, porque suas atividades são financiadas por companhias privadas. Esse modelo é semelhante ao que existe em países desenvolvidos, como França, Áustria e Alemanha. Lá, como cá, as estruturas de qualificação de mão de obra são pagas e geridas por empresas privadas. Ou seja: esse modelo de gestão não é uma “jabuticaba”, que existe apenas no Brasil.

Atuando dessa forma, o SESI e o SENAI servem ao objetivo de atender e antecipar as diversas demandas dos diversos setores da indústria. A qualificação permanente e atualizada da mão de obra exige sinergia e simbiose com quem produz. Entregar essa prestação de serviços ao sabor do mercado seria, no mínimo, temerário.

A qualificação permanente e atualizada da mão de obra exige sinergia e simbiose com quem produz. Entregar essa prestação de serviços ao sabor do mercado seria, no mínimo, temerário.

Qual faculdade privada, por exemplo, se interessaria em qualificar de forma gratuita mão de obra de populações ribeirinhas que residem em áreas remotas da região amazônica, como fazem os barcos-escola Samaúma no Amazonas, Pará, Acre, Roraima, Rondônia e Amapá? Faculdades privadas se interessam por receitas e lucros. Quem vai financiá-las? O governo federal? Qual será o custo de formação para quem ainda vai entrar no mercado de trabalho?

Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o eventual corte de recursos de entidades como SESI e SENAI descontinuará um dos poucos sistemas de saúde, educação e segurança no trabalho que funciona no Brasil e que, verdadeiramente, beneficia milhões de trabalhadores e jovens de baixa renda.

Se a ideia é estimular a geração de empregos, o que precisa ser feito é investir mais em educação profissional – e não o contrário. Nós também somos a favor da redução de impostos e do cipoal burocrático que inferniza o país. Mas, de maneira alguma, pode-se destruir o que funciona bem e dá resultados.

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