Atividade tributária inconstitucional dos estados

Em artigo publicado no Jota, o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade fala sobre a insegurança jurídica para o setor produtivo por questões tributárias relacionadas ao pacto federativo

Imagem: homem em primeiro plano revisando tributos no computador e revisando contas na calculadora enquanto observa uma planilha de custos

Em meio à crise fiscal dos estados e à expectativa de aprovação da reforma tributária, o Supremo Tribunal Federal (STF) é mais uma vez chamado a decidir, com urgência, questões tributárias relacionadas ao pacto federativo que geram insegurança jurídica para o setor produtivo. Pressionados pelo desequilíbrio nas contas, os estados tentam aumentar a arrecadação pela instituição de fundos para as mais diversas finalidades, ou pelo alargamento indevido da base de cálculo e dos valores de taxas minerárias e ambientais.

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Em ambos os casos, cobranças de natureza tributária vêm sendo feitas sem o devido respeito às regras constitucionais que disciplinam o poder de tributar e às garantias dos contribuintes.

Para discutir esses fundos, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) propôs ações perante o STF, a exemplo da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n.º 7363, em que o setor industrial sustentou a inconstitucionalidade da lei de Goiás que criou o Fundo Estadual da Infraestrutura (Fundeinfra). Infelizmente, Acre, Alagoas, Espírito Santo, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Sergipe e Tocantins também adotaram iniciativas semelhantes.

A administração goiana não só limitou o aproveitamento de benefícios fiscais concedidos, como também alterou a dinâmica da substituição tributária. Condicionou o efetivo exercício da imunidade das operações de exportações ao recolhimento de uma contribuição que tem todas as características de um novo imposto – ou, quando menos, de um adicional camuflado de ICMS.

O que os estados insistem em ignorar é que a competência legal para a instituição de um novo imposto é, em princípio, da União. Caso se trate de uma nova parcela de ICMS, não se pode condicionar o exercício do direito fundamental de ter uma imunidade objetiva ao recolhimento de um adicional do tributo.

Em qualquer das hipóteses (novo tributo ou nova parcela de ICMS), é a própria Constituição da República que proíbe, de forma peremptória, a vinculação de qualquer imposto a um fundo, como bem fundamentou o ministro Dias Toffoli, ao conceder a liminar pedida na ADI 7.363 para suspender a eficácia da lei goiana.

Com relação à expansão indevida da base de cálculo e do valor das taxas minerárias, muitos estados (tais como Minas Gerais, Pará, Amapá e Mato Grosso) vêm desafiando, de forma direta, a noção de que essa espécie de tributo não deve ter finalidade arrecadatória, mas apenas a de reembolsar o que razoavelmente foi gasto no exercício efetivo do poder de polícia.


Percebe-se claramente, em leis recentes aprovadas pelas Assembleias Legislativas, uma tendência dos estados de utilizar, sem autorização da Constituição, bases de cálculo próprias de imposto para a cobrança das taxas, bem como uma intenção mal disfarçada de desvincular o volume das despesas com a fiscalização do valor global cobrado, que é muito superior.


É o que se nota, por exemplo, em recente lei mato-grossense que estabeleceu taxa minerária desproporcional ao custo de fiscalização e que, por isso mesmo, acarretou a propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 7.400 pela CNI.

Tal incerteza sobre os limites da Constituição relativos ao poder de tributar dos estados não pode se perpetuar, sob pena de se ferir o valor da segurança jurídica, tão caro ao Estado Democrático de Direito e ao desenvolvimento econômico.

É necessário que o Supremo decida, o quanto antes e de forma definitiva, sobre a legitimidade constitucional dos fundos recentemente criados pelas entidades subnacionais. Além disso, é preciso que o tribunal reafirme a técnica constitucional própria de tributação das taxas minerais e ambientais, garantindo a prevalência do princípio da referibilidade (relação de pertinência entre a atividade realizada pelo Poder Público em contraprestação ao pagamento do tributo pelo contribuinte).

Só assim será possível garantir a previsibilidade, a segurança e a confiabilidade no ambiente de negócios, no que diz respeito à tributação estadual. A indústria nacional depende de sinalizações firmes do Judiciário para que a atividade econômica possa ser devidamente planejada quanto aos custos produtivos, que impactam a oferta, e para que a sua competitividade seja assegurada nos mercados doméstico e internacional.

Em todo caso, o que se se espera é que, na solução dessas questões tributárias, seja devidamente respeitado o estatuto constitucional do contribuinte. Essas regras preveem garantias de não vinculação de impostos, de não confisco, de referibilidade das taxas, de preservação das competências tributárias repartidas em regime rígido, e o princípio que impõe a observância da anterioridade da lei tributária (anual e nonagesimal).


Embora a situação fiscal dos estados mereça atenção , não é possível, para remediar uma conjuntura de crise, abandonar compromissos constitucionais assumidos com os contribuintes brasileiros a fim de lhes proporcionar previsibilidade e segurança nas relações com o Fisco.


Como disse o jurista Ruy Barbosa, “fora da Constituição, não há salvação”. O ensinamento desse eminente homem público brasileiro permanece atual e certamente baseia a cultura judicial do STF. Por isso, temos a convicção de que o tribunal não tardará a pacificar esse debate tributário que tanta incerteza traz ao ambiente de negócios no Brasil.

*Robson Braga de Andrade é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

O artigo foi publicado no portal Jota, nesta sexta-feira (21).

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