Com o desafio de mitigar os efeitos das mudanças climáticas e avançar rumo à economia sustentável, governos têm implementado estratégias para promover a transição ecológica. Exemplos notáveis incluem o "Inflation Reduction Act", nos Estados Unidos, e o "European Green Deal", na União Europeia, ambos prevendo trilhões de dólares em investimentos, boa parte subsidiada pelo setor público.
O apoio público é crucial para impulsionar o desenvolvimento industrial e fomentar a inovação. Mas, países de renda baixa e média enfrentam grandes desafios, sobretudo pelo espaço fiscal menor para subsidiar essas transformações.
No Brasil, além da limitação fiscal, o Custo Brasil impõe obstáculos à competitividade industrial. Um dos maiores é a falta de financiamento adequado, que dificulta investimentos para modernizar a produção e aumentar a eficiência do setor.
Enquanto as indústrias de países desenvolvidos renovam seu maquinário em ciclos de 5 a 7 anos, o parque industrial brasileiro opera, em média, com equipamentos com 14 anos de uso.
Nesse contexto, instituições como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) desempenham papel essencial. A Finep tem sido fundamental no financiamento de pesquisa e desenvolvimento em instituições de ciência e tecnologia e empresas privadas, enquanto o BNDES ampliou as linhas de crédito para compra de máquinas e equipamentos com foco em sustentabilidade. Além disso, o BNDES tem fortalecido linhas de crédito para a exportação e projetos de inovação, especialmente os relacionados à transição ecológica.
É preciso desmitificar a ideia de que o uso de fundos públicos por bancos de desenvolvimento compromete a sustentabilidade fiscal e macroeconômica. Um erro comum é supor que os fundos financeiros de natureza pública impactam diretamente as despesas primárias do governo. Na realidade, o BNDES é, atualmente, um credor líquido do Tesouro Nacional.
Segundo dados do banco, a instituição prevê transferir R$ 46,2 bilhões para a União entre 2023 e 2024. Nenhum outro banco de desenvolvimento no mundo transfere recursos dessa magnitude aos cofres públicos.
Outro ponto é reconhecer a complexidade dos instrumentos financeiros envolvidos. Fundos como o Fundo da Marinha Mercante, o Fundo Nacional de Aviação Civil, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, e o Fundo Clima têm receitas vinculadas, garantindo a sustentabilidade das operações.
No caso do Fundo Clima, além de receitas de royalties do petróleo, o fundo se beneficia de aportes gerados por emissões soberanas internacionais, como os "Sustainable Bonds", que seguem rigorosos critérios de aplicação e governança, endossados por instituições como o Banco Mundial e o BID.
O financiamento à indústria por meio de bancos de desenvolvimento deve ser visto como um pilar para acelerar a transição ecológica e inserir o Brasil de forma competitiva no mercado internacional.
Apenas com uma combinação estratégica de financiamento sustentável e inovação tecnológica será possível pavimentar um caminho que assegure a sustentabilidade fiscal do Estado enquanto promove a necessária transformação ecológica.
*Rafael Lucchesi é presidente do Conselho de Administração do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI (Confederação Nacional da Indústria). Economista, formado pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), foi diretor de Operações da CNI (2007–2010) e secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Governo do Estado da Bahia (2003 – 2006), quando presidiu o Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência, Tecnologia e Inovação (CONSECTI).
O artigo foi publicado no jornal Folha de S. Paulo no dia 23/09/2024.
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