A política externa tem um papel central no cumprimento de vários objetivos estabelecidos pela Constituição, dentre eles a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade e o desenvolvimento nacional.
O início de uma nova administração, período que estamos vivendo, é um excelente momento para uma avaliação abrangente das relações do país com os seus parceiros de destaque.
Muitas são as oportunidades à mão do governo para a construção de uma nação moderna. Uma delas é o relacionamento com os Estados Unidos, principal potência do mundo. Trata-se do maior mercado para as exportações dos nossos produtos manufaturados, o que mais abriga empresas brasileiras com projetos no exterior e o que mais investimentos produtivos tem no Brasil. Apesar disso, não temos instrumentos relevantes de integração econômica com os EUA.
As orientações políticas que surgiram a partir do recente encontro entre os presidentes do Brasil e dos Estados Unidos foram positivas. A expectativa agora é que o Brasil adote uma agenda ambiciosa em relação àquele país, que inclui o lançamento de negociações para acordos de livre comércio, de investimentos e para evitar a dupla tributação. Os próximos dois anos são propícios para que os governos dos dois países coloquem as relações bilaterais em um nível mais elevado e estratégico – em 2020, termina o mandato do atual presidente americano.
Outra oportunidade são as relações com a Argentina e, por consequência, com os demais sócios do Mercosul. A agenda econômica do bloco ficou paralisada por mais de uma década e só foi retomada em 2017, ano em que foram firmados dois importantes acordos sobre investimentos e compras públicas.
Contudo, é preciso avançar mais, assegurando o livre comércio completo, aperfeiçoando a Tarifa Externa Comum, ampliando a abertura do setor de serviços e reduzindo barreiras não tarifárias. O desafio não é promover mudanças com os olhos nas limitações do passado, mas buscar mais o Mercosul.
O relacionamento com a União Europeia também proporciona boas possibilidades. Nesse caso, o objetivo é claro, embora complexo: concluir as negociações para criar o primeiro mega-acordo comercial do Brasil. Levando em consideração apenas os efeitos desse tratado, a participação das exportações brasileiras livres de barreiras no comércio internacional saltaria dos atuais 8% para mais de 25%.
Precisamos, também, concluir as tratativas em andamento com os países membros da Associação Europeia de Livre Comércio, a EFTA, e explorar outras frentes, como um acordo de céus abertos e acordos para evitar a dupla tributação com mercados estratégicos, como Alemanha e Reino Unido.
O Brics (acrônimo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) também merecem especial atenção. Os países do grupo abrigam muitas das principais multinacionais brasileiras, em particular da indústria e do setor de serviços. Além disso, são mercados significativos para o agronegócio do Brasil, em particular a China.
A principal área de sucesso do Brics é a cooperação financeira, com o estabelecimento do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em inglês), que já tem classificação de risco AA+ das agências Fitch e S&P. A partir de 2020, um brasileiro deverá assumir sua presidência, mas o Brasil ainda acessa pouco os financiamentos que a instituição oferece. No acumulado de 2016 a 2018, ficamos atrás de China, Índia e Rússia, tanto em número de projetos quanto em valor desembolsado. Precisamos fazer melhor uso desse instrumento, sobretudo para investimentos em infraestrutura.
Tampouco se deve esquecer o relacionamento com o Japão. Os setores privados brasileiro e japonês têm feito um grande esforço, por meio do Conselho Empresarial Brasil-Japão, para avançar na agenda bilateral. Em 2015 e em 2018, o Conselho publicou um documento pioneiro, com a arquitetura de um acordo de parceria econômica entre o Japão e o Mercosul. Basta vontade política dos dois lados para deslanchar essa iniciativa.
Além do mais, o Japão tem uma poupança externa de centenas de bilhões de dólares e uma nova estrutura governamental para financiar investimentos em infraestrutura no exterior. Trata-se de uma oportunidade para o Brasil reforçar essa parceria bilateral histórica e incentivar seu crescimento econômico.
Na área comercial, os desafios são grandes. O comércio exterior é um instrumento essencial para o Brasil acelerar o crescimento econômico, gerar empregos e expandir a renda das famílias. No entanto, ainda estamos longe de alcançar todo o seu potencial. Nos últimos 40 anos, a participação do Brasil no comércio mundial ficou praticamente estagnada, passando de 1,1% para 1%, com pico de 1,3% entre 2010 e 2013. Nesse período, fomos ultrapassados por países como China, Coreia do Sul, México e Índia.
Nossas exportações totais estão abaixo do nível que atingiram em 2011, e as importações totais são menores do que em 2013. No caso dos bens manufaturados, o cenário é ainda mais alarmante: em valor, as exportações estão no mesmo patamar desde 2008; e, em volume, desde 2007. Além disso, o Brasil acessa, livre de barreiras, 8% de todo o comércio internacional, e o número de empresas exportadores oscila, há mais de uma década, entre 20 mil e 30 mil, uma quantidade pequena.
Precisamos dar mais competitividade aos nossos produtos, apostando na inovação e na venda de mercadorias de maior valor agregado. Entre as possibilidades em pauta, a primeira atitude para destravar o comércio é negociar acordos comerciais para abrir novos mercados aos nossos bens, serviços e investimentos. Já há negociações em andamento com Canadá, México e União Europeia, áreas estratégicas para a indústria.
O segundo caminho é o da condução de reformas microeconômicas que retirem o viés antiexportador da nossa economia, incluindo a eliminação das dezenas de taxas e encargos cobrados nos portos e aeroportos, a redução do custo do transporte doméstico e internacional, e a simplificação e digitalização dos processos aduaneiros. A burocracia na aduana, por exemplo, funciona como um imposto de 14% na importação e de 13% na exportação.
A terceira vertente é a do apoio à internacionalização das empresas brasileiras, convertendo micro, pequenos e médios negócios em novos exportadores, e ajudando os que já exportam a buscar novos mercados. Hoje, 51,6% das empresas exportadoras buscam apoio da Apex-Brasil, e 27,7%, o das Federações das Indústrias nos estados.
Para cooperar com o governo federal nessa tarefa, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) lançou recentemente a “Agenda Internacional da Indústria 2019”. O documento, que está em sua quarta edição, reúne as prioridades do setor produtivo nessas três frentes.
Uma nova estratégia nacional de comércio exterior pode ser uma ferramenta poderosa de coordenação e transformação. A indústria brasileira está pronta para colaborar com sua construção e execução. A política externa e de comércio exterior pode contribuir para que o Brasil volte ao caminho do desenvolvimento. Precisamos dar mais importância à área internacional para fazer a economia crescer num ritmo condizente com as nossas necessidades, com benefícios para todos os brasileiros.
Paulo Afonso Ferreira é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) em exercício
O artigo foi publicado nesta sexta (17) no jornal O Globo.
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