É inegável a importância das pesquisas científicas frente à ameaça biológica. Porém, o investimento em ciência no Brasil está muito aquém do potencial dessa área em gerar respostas pertinentes aos atuais desafios sociais, econômicos e de saúde. Assim, a chegada do novo coronavírus revelou fragilidades na produção industrial do país que refletiram diretamente no enfrentamento à pandemia.
Quem faz pesquisa em ciências biomédicas vive o impacto da escassez ou mesmo da ausência da produção nacional de insumos. Com quase a totalidade de consumíveis, reagentes e equipamentos necessários às atividades laboratoriais produzidos no exterior, o setor enfrenta dificuldades de fornecimento, impostas pelos trâmites de importação e alfândega, aliados à redução da produtividade global durante a pandemia.
A dependência da indústria externa, que já era um fator limitante nas pesquisas regulares, se traduz em retardo na produção científica durante a epidemia de SARS-CoV-2, uma vez que grandes produtores como Alemanha e Estados Unidos esgotaram suas capacidades fabris e não conseguiram atender o mercado mundial. Nos últimos meses, essa dependência se estendeu à área da assistência, quando itens básicos de proteção individual para os profissionais da saúde, como máscaras e luvas, estiveram em falta, principalmente nos hospitais.
Ainda no escopo da pesquisa sobre o novo coronavírus, temos enfrentado grande defasagem na testagem em massa. Primeiramente, porque a produção nacional de testes é incipiente e, em segundo lugar, devido ao fato do duo especificidade/sensibilidade dos exames ser ainda insatisfatório, mesmo internacionalmente.
Desde a década passada, vem sendo possível observar um aumento na criação de startups e incubadoras, por meio de editais específicos, principalmente nas universidades públicas. Todavia, ainda há um abismo colossal entre pesquisa e iniciativa privada, que não investe o suficiente em inovação. É um reflexo da falta de competitividade da área.
É preciso pensar no papel fundamental que a indústria tem na realização das pesquisas sobre o novo coronavírus, nos mais diferentes aspectos: computacionais, laboratoriais, teóricos e práticos. Das atividades mais básicas às mais complexas, todos envolvem produtos industriais. A pandemia tem alertado em relação à necessidade de investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D) para que o Brasil saia da condição de mero consumidor internacional para assumir a posição de protagonista nesse campo. Caminhando paralelamente, pesquisa e indústria podem se fortalecer mutuamente e contribuir para o progresso do país. Essa é a hora de investir.
O artigo foi publicado na Revista Indústria Brasileira, na edição de junho.
Jaqueline Goes de Jesus é biomédica e pesquisadora do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (USP), foi uma das coordenadoras da equipe responsável pelo primeiro sequenciamento do genoma do vírus SARS-CoV-2 no Brasil.
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