Defesa comercial não é protecionismo

Em artigo publicado na Folha de S. Paulo, o diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI, Carlos Abijaodi, explica que as medidas antidumping são importantes para garantir a liberalização do comércio e evitar concorrência desleal. Esses instrumentos são usados pelas economias desenvolvidas e emergentes e previstos pela Organização Mundial do Comércio (OMC)

Carlos Abijaodi é diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI

A defesa comercial não pode ser confundida com protecionismo, como tem ocorrido no Brasil. Essas regras eliminam práticas desleais, garantem comércio justo e, historicamente, têm tido papel crucial para consolidar a liberalização comercial no mundo.

O Brasil não faz uso indiscriminado de medidas de defesa comercial. Os direitos antidumping aplicados pelo país atingem apenas 1% das importações brasileiras. Assim, não prejudicam a competitividade nem a abertura econômica do país. Recentemente, novas investigações antidumping iniciadas no país caíram 64%, de 67 em 2013 para apenas 24 em 2016.

É distorcida a visão de que o Brasil prorroga de maneira exagerada seus direitos antidumping ou que estes são excessivamente concentrados em bens intermediários. Em apenas 60% dos casos, nos últimos anos, as medidas foram prorrogadas e somente 39% são aplicadas a insumos industriais, contra 51% da média mundial, 58% da União Europeia ou 68% dos Estados Unidos.

A defesa comercial no Brasil tampouco tende a ser mais favorável à indústria. Os dados mostram que apenas 53% das investigações abertas se tornaram medidas aplicadas, sendo este o segundo menor índice entre os principais usuários mundiais de defesa comercial, abaixo de Canadá (61%), União Europeia (64%), Estados Unidos (66%), Índia (72%) e China (81%).

Isso comprova o rigor técnico da autoridade investigadora brasileira e seu respeito pelas normas multilaterais. O país nunca foi alvo de um caso na OMC por violação de acordos relacionados à defesa comercial, ao contrário de Estados Unidos, União Europeia ou China. Além disso, aplica direitos antidumping apenas no valor necessário para evitar o dano à indústria (o lesser duty), o que implica em sobretaxas mais baixas contra importados, prática que vai além das normas da OMC e não é adotada pela maioria dos países.

Para alguns, o dumping se justificaria por beneficiar consumidores finais. No entanto, ao causar danos à produção, aos investimentos, ao emprego e até a arrecadação tributária, importações a preços de dumping trazem efeitos negativos para a economia do país importador.

A indústria não apoia casos de defesa comercial que não cumpram as regras. Mesmo casos legítimos, mas que estiverem contra o interesse nacional, contam com mecanismos na legislação brasileira para ajustes, como é o caso das análises no âmbito do Grupo Técnico de Avaliação de Interesse Público (GTIP) da Câmara de Comércio Exterior. O GTIP, aliás, foi considerado um avanço na legislação interna e teve o apoio da indústria por poder trazer mais previsibilidade ao sistema de defesa comercial.

Esse avanço, contudo, tem sido prejudicado por práticas recentes no GTIP, como utilização de metodologias questionáveis de análise, tomada de decisão por interesse público, em alguns casos, sem seguir procedimentos ou garantir a oportunidade de manifestação aos interessados. O “interesse público” precisa ser usado de forma estratégica, sob o risco de continuar aumentando, desnecessariamente, a insegurança jurídica, os custos e a burocracia do sistema de defesa comercial.

O uso de medidas de defesa comercial é legítimo para corrigir práticas desleais de comércio. No cenário de lenta recuperação da economia e desafios estruturais, é imprescindível a adoção de uma agenda estratégica de abertura econômica para recuperar a nossa competitividade. Mas, é também crucial ter em conta que defesa comercial não é a causa da baixa integração internacional do país. Ao contrário, é fundamental para maior engajamento do setor industrial na liberalização comercial.

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