Mais de cem empresários de países-membros do G20 trabalham para encontrar soluções que incentivem a produção sustentável e a produtividade e diminuam o desperdício, garantindo segurança alimentar às pessoas mais vulneráveis. O objetivo é da força-tarefa de Sistemas Alimentares Sustentáveis e Agricultura do B20, o fórum empresarial do bloco econômico mundial, atualmente coordenado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).
À frente do grupo temático durante a gestão brasileira do B20 2024, o presidente global da JBS, Gilberto Tomazoni, acredita que o caminho para alcançar essa meta é um comércio internacional com práticas justas, que tornem os sistemas alimentares inclusivos e incentivem produtores a adotarem tecnologias modernas e sustentáveis.
A força-tarefa é um dos oito grupos que compõem o B20 neste ano. A missão é elaborar sugestões do setor privado que influenciem o processo de tomada de decisões nas pautas prioritárias dos governos. As recomendações serão entregues aos chefes de Estado na cúpula das maiores economias do mundo, em novembro.
Todos os trabalhos são orientados pelo tema crescimento inclusivo para um futuro sustentável e pelos seguintes pilares: promover o crescimento inclusivo e combater a fome, a pobreza e as desigualdades; promover uma transição justa para uma economia net zero; aumentar a produtividade por meio da inovação; promover a resiliência das cadeias globais de valor; e valorizar o capital humano.
Confira a entrevista de Gilberto Tomazoni para a Agência de Notícias da Indústria:
Quais os principais objetivos da força-tarefa?
Tornar os sistemas alimentares mais eficientes, garantindo segurança alimentar aos mais vulneráveis para combater a fome, é o principal objetivo desta força-tarefa. O desafio é aumentar a produtividade de forma sustentável, para alimentar uma população crescente que deverá chegar a 10 bilhões de pessoas até 2060. Os sistemas alimentares representam 10% do PIB global e 35% dos empregos mundiais.
Existem soluções que permitem produzir mais alimentos e, ao mesmo tempo, preservar o meio ambiente e frear o aquecimento global.
De acordo com a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), nos últimos 30 anos, o Brasil teve aumento de 122% na produção de carne bovina, ao passo que reduziu em 13,6% a área total ocupada com pasto. Ou seja, se produziu muito mais, usando menos terra. Os sistemas agroflorestais têm muito a contribuir nesse campo: produz-se mais com menos recursos naturais e área disponível. A recuperação de pastagens degradadas traz mais oportunidades.
Temos bons exemplos na pecuária brasileira, como o caso da Fazenda Roncador, localizada no Vale do Araguaia. Por meio da aplicação do sistema integração lavoura-pecuária (ILP), a propriedade conseguiu aumentar a sua produção ao mesmo tempo em que realiza a captura de gases de efeito estufa da atmosfera e recupera pastagens degradadas. Com essa técnica, em vez de somente a atividade predominantemente pecuária, se passou a também colher grãos com a produção se multiplicando 15 vezes, além de transformar a área em uma grande fixadora de gás carbônico no solo.
Temos que dar escala a essas soluções e investir em ciência para superar os obstáculos que ainda estão em nosso caminho. Também precisamos reduzir o desperdício. Hoje, aproximadamente 30% do total de alimentos produzidos no mundo é perdido desde a produção até o varejo e o consumo, e 67% da população mundial em situação de pobreza alimentar vive em áreas rurais. Ao mesmo tempo, de todos os recursos financeiros disponibilizados no mundo para enfrentar as mudanças climáticas, somente 1,7% é destinado para projetos na agricultura, segundo o Fundo Internacional para Desenvolvimento Agrícola das Nações Unidas (Ifad).
É urgente a articulação público-privada global-local para coordenar os esforços de financiamento para essa transformação. Temos de fazer chegar aos produtores modelos de financiamentos disruptivos, que possam acelerar a transformação, a prática de agricultura regenerativa, através de modelos inovadores e mistos, oriundos de fundos públicos e privados, na chamada blended finance. Ainda, que apoiem serviços ambientais justos e fomentem o mercado de carbono, nacional e mundial. A transformação dos sistemas alimentares apresenta uma oportunidade notável para contribuir para a criação de uma economia sustentável, inclusiva e resiliente.
A força-tarefa que coordeno tem grande potencial e uma oportunidade única de propor ações que acelerem mudanças significativas. Não somente em termos de sustentabilidade, mas também no desenvolvimento econômico e no avanço tecnológico da agricultura como um todo.
De que forma a economia mundial deve caminhar para fomentar um arcabouço de transformação dos sistemas alimentares?
O comércio internacional com práticas justas pode se tornar um mecanismo para avançarmos em sistemas alimentares inclusivos e incentivar a adoção de tecnologias modernas e sustentáveis na produção. No entanto, temos observado um aumento nas barreiras comerciais, fazendo com que alimentos enfrentam tarifas altas que significam não apenas preços maiores, ou seja, alimentos menos acessíveis, mas também atrasam a inclusão dos produtores tradicionais no sistema alimentar global.
Como a agricultura familiar pode contribuir com a segurança alimentar e nutricional?
É essencial trazer o pequeno produtor para o centro das atenções. Precisamos oferecer suporte técnico e financeiro. É fundamental criar mais acessos de mercados para os agricultores familiares, principalmente em biomas de grande biodiversidade.
O Fundo JBS pela Amazônia tem trabalhado para oferecer apoio técnico e financeiro para projetos que impulsionem o desenvolvimento socioeconômico sustentável, com sistemas agroflorestais e um olhar muito particular para os pequenos produtores das mais diversas cadeias, entre elas as do açaí, do cacau e do pirarucu.
Tecnologia de ponta que garante alta produtividade já existe.
O agronegócio brasileiro já a adota. É preciso que toda essa inovação chegue também aos pequenos produtores, para que tenham mais produtividade, colham mais alimentos e obtenham mais renda.
O papel do Brasil na segurança alimentar mundial foi destacado pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, durante o lançamento do B20 Brasil. Por que essa atuação do setor público é importante?
Para alcançar a segurança alimentar global, precisamos de métodos de produção mais sustentáveis e uma articulação público-privada global-local para coordenar os esforços de financiamento para essa transformação. O Brasil está em uma posição privilegiada para contribuir com esta agenda global.
Somos fornecedores-chave do mercado internacional em produção agrícola, bioeconomia, energia e tantos outros recursos essenciais.
Os entes públicos têm um papel essencial, em várias frentes, da elaboração de leis à fiscalização. Por eles passa, por exemplo, a implementação de propostas que incentivem uma prática agrícola cada vez mais sustentável, incluindo sequestro de carbono, manejo correto de solos e uso de água doce, além da preservação da biodiversidade.
Como o setor privado pode participar dessa agenda?
As empresas de alimentos e do setor agrícola podem cooperar construindo negócios e redes de valor mais resilientes. Podemos nos unir em movimentos que acelerem a transformação agrícola, priorizem a construção de uma arquitetura de financiamento global e aprimorem o comércio mundial. A resposta a esses desafios exige abordagens conjuntas, coordenadas e customizadas para cada região.