A falta de concorrência é responsável pelas distorções no mercado e pelos elevados preços dos combustíveis no Brasil. Só no ano passado, os custos das indústrias energo-intensivas com a compra de gás natural, óleo combustível e gás liquefeito do petróleo (GLP) foram de cerca de R$ 7,38 bilhões superiores aos cobrados no mercado internacional. O cálculo está no estudo Insumos Energéticos: Custos e Competitividade, que faz parte do conjunto de 43 documentos que a Confederação Nacional da Indústria (CNI) apresentou aos candidatos à Presidência da República. Além de elevar os custos da indústria, o baixo número de competidores afasta os investidores e prejudica a inserção internacional do Brasil.
Por isso, a CNI sugere que o governo promova a entrada de novos investidores e como consequência o aumento da concorrência no mercado de combustíveis. "A oferta abundante de combustíveis a um custo compatível com o do mercado internacional é fundamental para a indústria brasileira enfrentar a concorrência estrangeira", afirma o especialista em energia da CNI Rodrigo Garcia.
Os prejuízos da falta de concorrência no setor de combustíveis são maiores nas indústrias que consomem muita energia nos seus processos de produção, como a química, a siderúrgica, as de cerâmica, vidro, papel, celulose e alumínio. Em alguns desses setores, como o de vidro, os insumos energéticos chegam a representar 40% dos custos totais.
"A crescente trajetória dos preços da energia nos últimos 20 anos fez com que o custo da energia deixasse de ser uma vantagem para se tornar um obstáculo à competitividade, sobretudo dos setores energo-intensivos. Isso ocorreu porque a liberalização do mercado de combustíveis no Brasil aconteceu sem a concomitante promoção da competição na oferta", diz o estudo da CNI.
GÁS NATURAL - "A estrutura concentrada de oferta de combustíveis resulta em preços muito acima do mercado internacional", destaca o documento. Exemplo disso é o gás natural. O preço do combustível, na faixa dos US$ 14 por milhão de BTUs, é um dos mais altos do mundo e chega a ser três vezes maior do que o dos Estados Unidos. Cálculos da CNI mostram que os gastos das indústrias energo-intensivas brasileiras com gás natural em 2017 foram R$ 5,8 bilhões superiores à média paga pelas concorrentes de países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento (OCDE). Grande parte deste custo adicional é resultado da baixa concorrência no mercado brasileiro.
A Petrobras é responsável por 79% da produção de gás natural. As outras 49 produtoras acabam vendendo a produção para a estatal. A Petrobras também controla toda a infraestrutura de escoamento e as unidades de processamento de gás natural no país. Além disso, a estatal controla a cadeia de comercialização do combustível e influencia a política de compra de gás das distribuidoras estaduais, pois é acionista de 19 empresas e dona da BR Distribuidora no Espírito Santo e da Gás Brasiliano, em São Paulo.
Com isso, a formação de preços não segue o padrão de um mercado competitivo. A Petrobras, que monopoliza a produção/importação e o transporte do gás natural, determina o preço do gás ofertado às distribuidoras. Tais preços já incluem os custos de transporte, porém não há transparência sobre a parcela destes custos no preço praticado. Na segunda etapa, a regulação estadual estabelece uma margem para os serviços de distribuição", informa o estudo. Sobre o preço ainda incidem três tributos: PIS/Pasep, Cofins e ICMS.
Outro entrave importante é o monopólio na comercialização de gás natural. Embora o mercado livre já esteja regulamentado em alguns estados, a possibilidade da indústria decidir o fornecedor final de seu gás é uma realidade ainda distante, diz o estudo. Grandes consumidores, como a indústria, são obrigados a comprar o gás da distribuidora local. "Essa realidade possibilita a prática de margens de distribuição muito elevadas", avalia a CNI.
A distribuição de gás canalizado é um serviço de responsabilidade dos governos estaduais. Embora o serviço possa ser concedido a terceiros, 21 das 27 distribuidoras existentes no país são controladas pelos governos estaduais.
ÓLEO COMBUSTÍVEL - O mesmo ocorre com o óleo combustível, principal derivado do petróleo utilizado pela indústria brasileira, especialmente, para aquecimento de caldeiras e fornos ou motores de combustão interna para geração de calor. A indústria é responsável por 53% do consumo nacional de óleo combustível.
O óleo combustível é produzido nas refinarias de petróleo. A Petrobras é dona de 14 das 18 refinarias de petróleo existente no país e tem grande participação nas atividades de distribuição e revenda. A BR é responsável por 88,8% da distribuição, a Raízem por 5,9% e a Ipiranga por 3,8%.
Com essa concentração no mercado, a Petrobras mantém os preços do óleo combustível acima da média do mercado internacional. "Adicionalmente, a Petrobras tem poder para determinar os preços relativos entre os diferentes combustíveis concorrentes (óleo combustível, gás natural e gás liquefeito do petróleo (GLP)).", avalia o estudo da CNI.
O trabalho mostra que o Brasil exporta, em média, 57% da produção de óleo combustível e que os preços do produto vendido no mercado interno são maiores do que a cotação internacional. Desde 2014, os valores do óleo combustível destinado à exportação são menores do que os preços do mercado interno.
Em janeiro de 2018, a Petrobras exportava óleo combustível por aproximadamente US$ 400 a tonelada e vendia o produto no mercado interno por cerca de US$ 450 a tonelada. "A única razão para a Petrobras vender o óleo combustível mais caro no Brasil é o poder de mercado e a estratégia de fixar preços relativos dos combustíveis concorrentes", afirma a CNI.
No ano passado, a indústria energo-intensiva gastou cerca de R$ 615 milhões a mais que seus concorrentes com a compra de óleo combustível. O gasto adicional é resultado da multiplicação do consumo de óleo combustível dos setores energo-intensivos em 2017 pela diferença entre o valor do combustível praticados pela Petrobras no mercado interno e os preços de exportação.
GÁS LIQUEFEITO DO PETRÓLEO - O Brasil importa cerca de 30% do GLP que consome. A indústria, especialmente os setores químico, cerâmica, mineração e papel e celulose consome cerca de 12% do GLP oferecido no país. Mais de 72% é envasado em botijões de 13 quilos e vendidos aos consumidores residenciais. Durante muitos anos, o valor do botijão de 13 quilos foi subsidiado. Para compensar os subsídio, a Petrobras vende o GLP para a indústria a preços mais altos. Essa compensação compromete a competitividade dos produtos brasileiros, pois os preços do GLP não residencial no Brasil estão entre os mais altos do mundo. A tarifa do GLP com impostos no Brasil é de US$ 0,75 por litro, muito superior a quase US$ 0,40 por litro cobrado na Bélgica e aos US$ 0,62 por litro do Japão.
Com isso, no ano passado, a indústria energo-intensiva gastou aproximadamente R$ 924 milhões a mais do que seus concorrentes externos com a compra de GLP. O gasto adicional é resultado da multiplicação do consumo de GLP do setores energo-intensivos pela diferença entre o valor do combustível praticados pela Petrobras no mercado interno e os preços de referência do mercado internacional.
Além de ser responsável por quase todo o GLP disponível no mercado brasileiro e pelas importações, a Petrobras é dona da infraestrutura de armazenagem e transporte do produto. Ocorre que essa infraestrutura está próxima do limite e, segundo os planos da Petrobras, não há planos de investimentos na área. "A manutenção do monopólio representa um risco de abastecimento de GLP no médio e no longo prazo", alerta a CNI.
Recomendações da CNI para garantir a competitividade dos combustíveis:
• Privatizar os ativos de distribuição de gás natural dos governos estaduais.
• Promover a venda dos ativos de distribuição da Petrobras ao maior número possível de novos compradores no processo de desinvestimento.
• Incentivar os estados a avançar no processo de liberalização do mercado.
• Aproveitar o interesse da Petrobras em vender seus ativos na área de refino, para promover a atração de novos investimentos privados e a desconcentração do segmento.
• Monitorar o mercado nacional de combustíveis, visando inibir práticas abusivas, em particular a cobrança de preços acima dos praticados internacionalmente, o que deve ocorrer mediante a manutenção da política de liberdade preços, sem interferência do governo federal.
• Revisar a política tributária para o mercado de gás e combustíveis.
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