O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, afirmou que a reforma administrativa é importante, mas que não deve ser colocada à frente da reforma tributária. Dito isso, Andrade defende que o foco da reforma administrativa deve ser modernizar e tornar o Estado mais eficiente. Para o setor industrial, a prestação de serviços públicos de qualidade deve ser o principal objetivo da reforma.
“Precisamos de uma gestão pública mais eficiente, que atue em parceria com o setor privado e ofereça serviços de melhor qualidade aos cidadãos. Ela também é importante para sinalizar aos investidores estrangeiros que o Brasil está avançando para criar um ambiente de negócios mais propício ao investimento, à renda e ao emprego”, afirmou o presidente da CNI durante debate online sobre reforma administrativa realizado em parceria com o Fórum Estadão Think, nesta terça-feira (3/8).
“Temos um Congresso reformista e, devemos ir além do que é possível fazer, porque não vamos ter outra oportunidade tão cedo”, acrescentou.
Também participaram o presidente da Câmara dos Deputados, deputado Arthur Lira (PP-AL); o relator da reforma administrativa na Comissão Especial, deputado Arthur Maia (DEM-BA); o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, Caio Mario Andrade; e a head da consultoria Oliver Wyman no Brasil, a economista Ana Carla Costa. A jornalista Anne Warth conduziu o debate.
Brasil tem um dos maiores custos com servidor no mundo
De acordo com o presidente da CNI, entre os pontos a serem observados na reforma administrativa está o controle do gasto público. Em 2019, por exemplo, os gastos com pessoal representaram 21,7% do total das despesas primárias do governo federal. Segundo o Tesouro Nacional, com base em dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), em 2019, a despesa com pessoal de todos os entes (União, estados e municípios) foi equivalente a 12,9% do PIB. Assim, o país é o sétimo que mais gasta com servidores no mundo.
No Brasil, as despesas obrigatórias são responsáveis por parte significativa dos gastos públicos e sua participação na despesa total têm crescido, o que reduz a capacidade de investimento do governo em áreas cruciais como saúde, educação e segurança.
O grande problema do crescimento e da rigidez das despesas obrigatórias é que elas consomem parte cada vez maior do orçamento e acabam comprometendo as despesas não obrigatórias, nas quais se encontram os investimentos públicos, fundamentais para o desenvolvimento do país.
“O controle dessas despesas fará com que sobrem mais recursos para os investimentos públicos, diretamente relacionados ao crescimento econômico”, explicou Robson Andrade.
Governo gasta R$ 8,2 bilhões com 69 mil cargos considerados extintos
O secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, Caio Mario Andrade, defendeu a flexibilização da estabilidade dos servidores públicos, principalmente para corrigir distorções, que foram criadas nas últimas décadas.
“O interesse dos lobbies das corporações é legítimo. Olho para o setor produtivo, para a sociedade civil, para o mercado financeiro e também para o bom servidor público, mas temos que pensar se algumas coisas fazem sentido”, afirmou o secretário.
Ele relatou que, entre 2014 e 2015, o governo contratou afinadores de instrumento digital e datilógrafos, que devem permanecer na folha de pagamento por mais 53 anos, em média. No entanto, em 2019, o próprio governo extinguiu esses cargos.
Segundo Caio Mario de Andrade, o governo gasta anualmente R$ 8,2 bilhões para manter 69 mil servidores ativos em cargos considerados extintos.
O valor representa 22% a mais do que o orçamento anual do Ministério da Infraestrutura, que é de R$ 6,7 bilhões.
O secretário afirma que o país seria outro se o Estado fosse mais eficiente. “Será que não vamos dar uma chance de o Brasil ser outro daqui a 20 anos? Espero que o texto aprovado pelo Congresso contemple a necessidade”, afirma.
Reforma administrativa vai focar no serviço público e não no servidor, garante presidente da Câmara
O presidente da Câmara, Arthur Lira, afirma que a reforma administrativa venceu a etapa mais difícil, quando aprovou o fim dos altos salários. Segundo ele, o projeto não vai atacar qualquer direito adquirido, mas estará focado nos novos serviços públicos, para tornar o Estado mais ágil e com regras diferentes. No entanto, o presidente da Câmara defende que a reforma fique concentrada apenas nos servidores do Executivo e do Legislativo e não alcance o Judiciário. “Temos o limite constitucional e o Judiciário não encaminhou o projeto deles. Vamos fazer reforma possível para desenhar um estado mais leve sem atacar nenhum direito adquirido”, afirmou.
O relator da proposta, deputado Arthur Maia, tem outro entendimento. “Eu tenho uma divergência com o que pensa o presidente Arthur Lira sobre não incluir o Judiciário na reforma. Hoje, na minha lógica, o Judiciário estaria incluído. Se depender de mim, todo mundo vai entrar na reforma”, afirma. Ele diz que é necessário avançar no projeto para prestar um serviço de melhor qualidade e não ficar só no discurso.
“Nos próximos 10 anos, com maior inserção da inteligência artificial, teremos uma transformação no serviço público maior do que o que ocorreu nos últimos 500 anos. Vamos avançar para que a avaliação de desempenho dos serviços públicos incorpore essa inteligência artificial e tenha avaliação próprios usuários dos serviços. Também temos que pensar em gestão de desempenho, para que cada órgão tenha uma estratégia de forma continuada”, explica Arthur Maia.
O deputado também defendeu a necessidade de manter exceções e a estabilidades para carreiras exclusivas de Estado, como, por exemplo, policial, juiz, promotor e diplomata. “Essas pessoas precisam ter condições diferentes. Esses cargos exclusivos de estado, precisam ter estabilidade”, diz.
Reforma administrativa deve alcançar os servidores atuais, afirma economista
Chefe da consultoria Oliver Wyman no Brasil e sócia nas práticas de Finanças & Risco e Políticas Públicas, a economista Ana Carla Costa diz que as novas regras para os serviços públicos deveriam alcançar os atuais servidores, principalmente porque não vão afetar os direitos adquiridos. Parte do processo, diz, é a mudança cultural dentro do serviço público e diferenciar o bom do mal serviços.
“Isso gera um incentivo positivo. O mal avaliado vai ser objeto de treinamento, mudança de posição. A avaliação de desempenho, incluída na reforma de 1998, só depende do projeto de lei para ser regulamentada. Não faz sentido incluir só os novos servidores. A reforma não vai mexer com direitos adquiridos, mas deve atuar em privilégios adquiridos, que não encontram justificativa para o momento atual do país, como férias de 60 dias, por isso é importante levar o Judiciário, as promoções automáticas que são injustas, os retroativos sistemáticos que majoram o salário... E não há na Constituição, a vedação para a demissão no setor público”, explica.