Pesadelo para muitos empresários, a fiscalização do trabalho gera inúmeras dúvidas e multas suntuosas. Trata-se de um assunto que o setor industrial tem muito a desmitificar a fim de – investindo em ações preventivas, bem como no setor pessoal – poder atuar sem grandes dores de cabeça e crescer com mais competitividade no mercado.
De acordo com o advogado trabalhista empresarial e consultor da CNI, Eduardo Pastore, que ministrou o curso “Como Atender a Fiscalização do Trabalho”, pela FIEAC, no período de 13 a 16 de maio em Rio Branco e Cruzeiro do Sul para os setores de alimento, panificação, construção civil, cerâmica, extração mineral e pavimentação, por meio do Programa de Desenvolvimento Associativo (PDA), a maioria dos empresários tem as mais básicas dúvidas a respeito do tema. E também comete erros primários. Na entrevista a seguir, Pastore reitera a importância da força do sindicato patronal para defender os interesses comuns dos empresários e lutar pela modernização dessas leis.
“Quando os empresários começarem a entender que os sindicatos podem ser um veículo de comunicação para ajudá-los a resolver os problemas de forma coletiva, aí vamos começar a viver um pouco mais de segurança jurídica na área trabalhista”, alerta.
Este tema tem atraído muito a atenção dos empresários. A que o senhor atribui isso? Quais as maiores dúvidas que os empresários apresentam durante os cursos?
Eduardo Pastore – As dúvidas são básicas. Como atender? Os empresários não sabem como atender o fiscal. O que o fiscal pode pedir de documento? O que ele não pode pedir? Qual a competência dele? Até onde ele pode ir? Ele pode interditar uma máquina? Então, são essas perguntas que respondo no curso. São as mais primárias, mesmo, para poder esclarecer o público.
Qual o objetivo de uma fiscalização trabalhista? A que o fiscal visa quando chega a uma empresa?
EP – Ela quer saber se a empresa está cumprindo ou não as leis trabalhistas. Então, o fiscal já entra numa empresa para ver o que ela está fazendo de errado, e não o certo. Ele vai se preocupar com aquilo que a empresa não cumpre, por exemplo, se o ambiente está seguro, se está bem iluminado, se os trabalhadores possuem os equipamentos de proteção devidos, se estão se protegendo dos riscos de acidentes. Também observa a questão documental da empresa, se ela está recolhendo o Fundo de Garantia (FGTS), o INSS... Então, a gama de fiscalização é bem grande.
Quais têm sido os maiores erros ou flagrantes que as empresas têm apresentado durante uma fiscalização?
EP – As empresas cometem erros de todos os tipos. Às vezes são erros primários, como falta de documentação. Às vezes, a empresa não está com o livro de inspeção do trabalho. O livro tem que estar lá, não pode estar com o contador, então, já toma multa. Às vezes, não anota direito a jornada de trabalho do empregado, a hora que entra e a hora que sai. Não cumpre as normas de segurança do trabalho, que envolve acidentes, então toma multa. Uma gama de erros dos mais variados. Mas eu vejo que a área de acidente de trabalho, hoje, tem sido o foco mais importante da fiscalização. É onde as empresas precisam prestar muita atenção, não só com relação aos equipamentos de proteção individual (EPI), mas também à proteção nas máquinas, para poder evitar acidentes.
Como o senhor aconselha que o empresário deva receber um fiscal do trabalho?
EP – O que os empresários devem entender é que o fiscal do trabalho pode entrar na empresa e fiscalizar tudo. E, sendo assim, os empresários é que têm que começar a se preparar para a fiscalização. E aí, a gente nota que a fiscalização passa muito pela questão comportamental. Ela não é só técnica. Uma boa fiscalização depende muito da maneira como o empresário recebe o auditor. Por exemplo, se a empresa recebe o fiscal do trabalho e o deixa esperando meia hora para ser atendido, ele já entra nervoso. Então, as empresas não se atentam muito a isso. Se o empresário percebesse que recebendo o fiscal com tranquilidade e tratá-lo bem na entrada, o comportamento dele muda, com certeza teria muito menos problemas. Fiscalização do trabalho é uma questão comportamental, tanto do fiscal, quanto da empresa, mas quem tem muito para mudar são as empresas.
Existe um limite para a aplicação de multas?
EP – As multas variam muito. A CLT estabelece uma tabela para elas, há, também, umas portarias do Ministério do Trabalho. Então, elas variam de um mínimo até um teto máximo. De uns R$ 5 mil, pode ir duplicando, se a empresa não corrigir o erro, indo para R$ 14 mil a até milhões. Depende muito da empresa, se ela toma providências para se corrigir.
Qual o critério para a empresa receber a visita de um fiscal?
EP – As visitas são aleatórias, surpresa. A denúncia pode ser feita pelo trabalhador, pelo Ministério Público, juiz do trabalho ou o fiscal pode ir porque a empresa está muito exposta. A visita é inesperada e tem que ser assim, o fiscal não vai avisar que está indo para que a empresa tenha tempo de se organizar. Já as empresas que têm muito acidente de trabalho recebem visitas frequentes, são mais visadas.
Pela sua experiência, ao longo dos cursos, os empresários demonstram mais preocupação com o quê?
EP – Encontro de tudo. Desde aqueles empresários que tomam as precauções e que têm baixíssimos índices de acidente de trabalho, e tem o empresário com altos índices por vários motivos. Um dos motivos, porque ele mesmo não se atenta para as medidas preventivas. É um dos maiores fatores de acidente do trabalho, não olhar para as medidas preventivas. E, principalmente, a dificuldade que vejo nas empresas em geral, é que elas não se atentam para uma condição importante e que sempre repito em todos os meus cursos. Já é um mantra: grande parte dos problemas trabalhistas das empresas não é jurídica, é de gestão de pessoas. Se os empresários entendessem que é preciso valorizar mais o setor de RH (recursos humanos), investissem mais nas questões preventivas e olhassem mais para as pessoas lá dentro, você pode ter certeza de que teria muito menos problemas trabalhistas. É que os empresários acreditam que os problemas trabalhistas são só jurídicos. Eles se transformam em um problema jurídico depois, mas não nascem assim. E a fiscalização do trabalho passa muito pela gestão, também. Se você treina bem o RH para receber o fiscal, você não vai ter passivo trabalhista lá.
Como os procedimentos de fiscalização podem impactar a competitividade da indústria?
EP – Isso é grave. O dinheiro que o empresário gasta com essas multas que o Ministério do Trabalho aplica, ele poderia estar investindo em qualificação, melhorando sua produtividade, comprando máquinas, mas está gastando com multa. Isso impacta profundamente na questão da competitividade das indústrias, atrasa o seu desenvolvimento, elas vão ficando para trás, gastando dinheiro com advogado... A atividade-fim do empresário não é essa, contratar advogados, ficar lidando com fiscais do trabalho. É ganhar dinheiro e investir na sua empresa. O dinheiro que vai para a multa deixa de ir para a produção, é um dinheiro perdido.
E como os empresários podem agir coletivamente para defender a simplificação e a modernização de alguns aspectos e normas da fiscalização?
EP – O que vislumbramos é o seguinte: os empresários têm problemas comuns, e não coletivos. Só existe uma maneira de transformar o teu problema comum em coletivo: através do sindicato. Então, quando os empresários começarem a entender que os sindicatos podem ser um veículo de comunicação para ajudá-los a resolver os problemas de forma coletiva, aí vamos começar a viver um pouco mais de segurança jurídica na área trabalhista. Independente de mudança de lei. É que os empresários não valorizaram ainda a questão do associativismo. Não entenderam ainda o quão importante é o sindicato patronal nessa hora, porque é o sindicato que vai brigar com os fiscais do trabalho em nome da empresa. Estamos tentando estimular os empresários a valorizar o sindicato patronal para eles entenderem que é a única saída que têm. Os trabalhadores têm discurso coletivo, hoje. Os empresários, não. Então, quer viver melhor? Com menos complicação? A lei trabalhista é complicada e muito burocrática? Você vai fazer o quê? É ir para o sindicato, para ele brigar por você, coletivamente.