"Ética é a arte de tomar decisões que nos permitem viver dignamente"

Em conferência para educadores do SESI, Bernardo Toro defende a solidariedade nas relações sociais como caminho para formar cidadãos mais justos

Filósofo Bernardo Toro

Filósofo e um dos mais importantes pensadores sobre educação e democracia da América Latina, o colombiano Bernardo Toro propõe uma definição bastante simples para ética. Segundo ele, é a arte de tomar decisões que nos permitem viver dignamente e contribuir para a dignidade humana.

Convidado para fazer a conferência de abertura do seminário Ética na Educação Básica, realizado pelo Departamento Nacional do SESI nesta quinta-feira (21) em Brasília (DF), Toro afirma que a solidariedade das relações sociais nos espaços públicos, inclusive a escola, é fundamental para a formação ética dos cidadãos.

Ele defende a substituição do que chama inteligência guerreira pela lógica do altruísmo, na qual países, instituições e pessoas possam juntos obter vantagens das transações de que participam. Na visão do especialista, ser um país solidário e manter-se competitivo não é necessariamente uma contradição.

“Se ser competitivo significa criar condições para que cada vez mais gente viva dignamente”, ressalta. Depois da conferência, da qual participaram representantes das escolas do SESI de todo o Brasil, Bernardo Toro conversou com a equipe do Portal Indústria. Veja a seguir os principais trechos da entrevista:

O senhor poderia retomar o conceito de ética com o qual iniciou a conferência?
Defino ética como a arte de selecionar ações que nos permitam viver dignamente. O papel da ética é apoiar a tomada de decisões no meio de incertezas, contradições ou dilemas. O que nos diz a ética é: “tome a decisão que contribua para a dignidade humana”. E entendemos que dignidade humana é trabalhar ou criar condições para que os direitos humanos sejam possíveis para todos.

Na opinião do senhor, qual o papel da escola na construção de uma sociedade ética?
Todos nós nos formamos não pelo discurso ético, mas a partir de como ocorrem as transações econômicas, políticas, sociais, emocionais e espirituais. A formação de uma pessoa ética significa que o que ocorre à sua volta – na escola, em casa, nos outros espaços públicos – deve ser orientado para que as pessoas vivam dignamente. O problema é que existe muita contradição nessas transações. Uma criança ouve: “nunca minta, sempre diga a verdade”. Mas, se o pai não quer falar com alguém ao telefone, ela ouve: “diga que não estou”.

Se a criança não pode enfrentar essa contradição, nasce um dualismo de comportamento. Aqui, digo sim, porque me convém. Aqui, digo não, porque me convém. Assim, se perde a integridade ética. A dificuldade de formação ética de uma sociedade é que a escola vai por um caminho, as empresas vão por outro, as famílias por outro e os jovens não sabem o que fazer. Eles estão confusos por isso.

O senhor defende a substituição de um comportamento competitivo por um comportamento solidário. Como o ensino da ética na educação formal pode contribuir para isso?
Nós precisamos aprender a passar da inteligência guerreira para a inteligência altruísta. A primeira se caracteriza pelo coeficiente intelectual. É um conceito de excelência excludente. Essa inteligência é um bem privado, um bem para dominar ou eliminar o outro. Ela conduz aos atos de ataque e destruição do outro. Na inteligência altruísta, os líderes se caracterizam por saber pedir e oferecer ajuda. E parte do princípio que a inteligência é um bem social, que os outros têm com o que contribuir comigo.

Dar ajuda e pedir ajuda é o maior símbolo dessa realidade. Isso permite criar redes emocionais e sociais. A cada vez que você pede ajuda, faz o reconhecimento do outro. A cada vez que você recebe ajuda, o outro reconhece você. Isso gera vínculo e não pode ocorrer fora da inteligência altruísta, solidariedade, cooperação.

A inteligência guerreira gera admiração, mas não amor. Gera inveja, mas não colaboração. É uma inteligência destruidora.

Na opinião do senhor, é possível ser um país competitivo e importante no cenário mundial e ser pautado pela ética da solidariedade?
Se ser competitivo significa ganhar dos outros, não é possível. Se ser competitivo significa criar condições para que cada vez mais gente viva dignamente, é possível para qualquer país. Ter o maior PIB ou mais exportações que os outros é uma forma de ver o mundo que, creio eu, vai passar.

De que serve ser um país com importância no mundo se a pobreza interna continua igual? O que aconteceu com nossos países na América Latina? A riqueza tem crescido e a iniquidade também, porque tudo está construído em transações em que um perde e o outro ganha. Se mudarmos para modelos de transações ganhar/ganhar poderíamos ganhar mais riqueza e, ao mesmo tempo, alcançar mais equidade.

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