O Brasil não pode mais errar

Em artigo publicado no site da revista Exame, Robson Braga de Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), fala sobre a agenda da indústria para que o Brasil retome o desenvolvimento econômico e social no próximo governo

Robson Braga de Andrade é empresário e presidente da CNI

O eleitor brasileiro assistiu à disputa eleitoral de 2014 polarizar-se em torno de um tema central nos debates políticos, com dois discursos desenhando quadros opostos sobre o real estado da economia nacional. Não demorou muito para que a eclosão da pior crise da República escancarasse o óbvio, levando a um ajuste inevitável que ainda cobra da sociedade o seu preço. Em 2018, a economia brasileira tem o mesmo tamanho que ostentava há sete anos e, hoje, pairam mais dúvidas do que certezas no horizonte de cidadãos e das empresas.

Agora, a poucos meses das eleições, chegou a hora de refletirmos sobre o que desejamos e podemos fazer para tirar o Brasil desse estado de inércia e desesperança. Não apenas para os próximos quatro anos, mas com olhos voltados para o país que queremos construir para as futuras gerações. Certo é que não podemos adotar as mesmas fórmulas para os antigos entraves à nossa competitividade. Estamos diante da quarta revolução industrial. O jogo mudou. Precisamos fazer mais e melhor, buscando resistir à tentação das escolhas fáceis e imediatistas, que pouco ou nada contribuem para o desenvolvimento econômico e social do país.

Há uma vasta e complexa agenda a ser enfrentada e a indústria brasileira está empenhada em dar sua contribuição para esse necessário debate. Seguindo esse espírito, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) está entregando aos candidatos à Presidência da República um documento que reúne as propostas do setor para o crescimento econômico e o desenvolvimento sustentável do país. Em uma tradição que se repete desde o pleito de 1998, a CNI realizará um encontro com os principais presidenciáveis no dia 4 de julho, em Brasília, no qual os candidatos serão sabatinados por representantes da indústria sobre seus planos de governo, tendo em vista as prioridades do setor produtivo.

As propostas do setor industrial foram elaboradas com base no Mapa Estratégico da Indústria 2018-2022, que apresenta os principais desafios a serem superados pelo Brasil nos próximos cinco anos. Essa agenda preconiza a consolidação de uma indústria competitiva, inovadora, global e sustentável, ao mesmo tempo em que identifica entraves e deficiências do inóspito ambiente de negócios do país, que afeta toda a cadeia produtiva nacional.

Uma das prioridades identificadas é que os governos gastem com mais eficiência a imensa carga de impostos que arrecadam. Restabelecer a previsibilidade e a solidez do ambiente macroeconômico é também uma premissa básica. O debate em 2018 não admitirá diversionismos ou pós-verdades sobre este tema, como vimos há quatro anos. Se seguirmos nessa rota, corremos o risco de enfrentar uma recaída cujos efeitos sobre a atividade produtiva, a renda, o emprego, a estabilidade política e a própria coesão social poderão nos fazer descobrir que o fundo do poço pode, sim, ser bem mais profundo.

Neste contexto, enfrentar o debate da reforma da Previdência Social - e a resistência de camadas privilegiadas da sociedade - é inevitável. A indústria continuará a sensibilizar a opinião pública sobre a importância desse tema. Não se reverte a escalada insustentável da dívida pública, que abocanhou 74% de toda a riqueza produzida pelo país em 2017, sem revisitar e redefinir a estrutura de benefícios do atual sistema de aposentadorias. Essa é uma agenda de Estado que terá de ser enfrentada pelo próximo presidente da República, não importa a qual partido ou corrente ideológica pertença. Não podemos correr o risco de replicar em escala nacional o quadro que observamos em estados com Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul - e esse risco é real.

A recente crise envolvendo caminhoneiros apenas reforçou a necessidade de incorporarmos uma cultura permanente de disciplina fiscal. Se o Estado brasileiro - União e governos estaduais -, tivesse seguido o princípio elementar de que só se deve gastar o que se arrecada, os governantes teriam à mão um leque maior de opções para lidar com a alta no preço dos combustíveis. Certamente, haveriam alternativas ao aumento de impostos, ao tabelamento de preços de fretes e à transferência do ônus para quem efetivamente gera emprego e renda no país.

Ainda antes de enfrentar filas nos postos de gasolina e a falta de produtos nos supermercados, decorrentes desse apagão logístico, a população brasileira já se dava conta de que o Estado tem de caber em suas receitas. Pesquisa da CNI sobre qual deve ser a prioridade do próximo presidente da República, divulgada em março, revelou que 92% dos entrevistados consideram importante ou muito importante que o candidato defenda o controle dos gastos públicos. É uma constatação alentadora, pois mostra que os cidadãos brasileiros, em sua grande maioria, já perceberam que a conta do desgoverno com as finanças públicas sempre é, inevitavelmente, repassada para o bolso do contribuinte.

O setor produtivo quer um país cuja infraestrutura contribua para a competitividade de seus produtos - e não que os torne mais caros. O episódio dos caminhoneiros voltou a escancarar as deficiências nacionais em infraestrutura e logística. Não que seja novidade que o Brasil sucateou sua malha ferroviária e colocou praticamente todos os ovos na mesma cesta do transporte rodoviário. Certo é que não conseguiremos competir sem uma malha diversificada e integrada, que permita a circulação e a entrega eficiente de insumos e a distribuição de mercadorias de forma eficiente e segura.

É fundamental também que o próximo governo entenda a importância do investimento e do empreendedorismo para o desenvolvimento do país, proporcionando segurança jurídica para quem produz. Não se promove um ambiente capaz de estimular aportes em setores estratégicos da economia com o atual emaranhado de normas e regulações que trazem pouquíssima clareza sobre que regras devem ser seguidas pelo investidor. A atividade produtiva é incapaz de prosperar em meio à incerteza e à imprevisibilidade. Se o Brasil não fizer a lição de casa nessa área, potenciais investidores certamente buscarão outros países com condições mais adequadas e seguras.

A indústria defende que o próximo governante também terá de promover importantes avanços na redução da burocracia e na consolidação de um Estado mais eficiente. Aprimorar a governança e a qualidade da gestão pública são medidas fundamentais para oferecer à população um retorno mais justo diante de uma das mais altas cargas tributárias do planeta. Temos políticas públicas desenhadas para enfrentar quase todos os desafios do Brasil, mas poucas se traduzem em programas e serviços públicos que funcionam e entregam os resultados pretendidos. Faltam padrões mínimos de gestão, e o país ainda carece de uma cultura institucional voltada para a oferta de benefícios concretos aos cidadãos e às empresas.

Os descaminhos políticos e econômicos dos últimos anos prenunciam um mandato desafiador para o próximo presidente do Brasil. A agenda de reformas deve ser o carro-chefe desse novo tempo. E o que já foi realizado não deve ser revogado ou desfigurado, sob pena de retrocedermos nos poucos avanços conquistados até agora. O setor produtivo está fazendo a sua parte e as propostas da indústria para quem vier a ocupar o Palácio do Planalto até 2022 servem de bússola para o longo caminho ainda a ser percorrido. A crise nos ensinou como não se deve fazer. Mais do que nunca, é fundamental que os brasileiros escolham governantes que estejam verdadeiramente comprometidos com a retomada do desenvolvimento econômico e social do país. O Brasil não pode mais errar.

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