Mercosul precisa priorizar agenda econômica, afirma Carlos Abijaodi

Há uma convicção no meio empresarial de que o atual Mercosul não atende às necessidades das empresas, sobretudo em um mundo que vem experimentando importantes mudanças no sistema de comércio

Carlos Eduardo Abijaodi é diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI

Há uma convicção no meio empresarial de que o atual Mercosul não atende às necessidades das empresas, sobretudo em um mundo que vem experimentando importantes mudanças no sistema de comércio.

Duas importantes tendências vêm alterando a governança do comércio mundial e deveriam ter influência sobre a formulação de políticas no Brasil: a fragmentação da produção em cadeias globais de valor e a negociação de mega-acordos regionais que visam, mais do que acesso a mercados, incorporar disciplinas e marcos regulatórios inovadores.

A participação reduzida do Brasil nas cadeias globais de valor e a falta de acordos relevantes que incorporem temas como serviços, investimentos e barreiras não tarifárias, faz aumentar os obstáculos para que as empresas brasileiras se inseriram mais e melhor no comércio mundial.

O Mercosul não tem conseguido dar respostas a esses desafios. Nos últimos anos, as dificuldades foram agravadas por problemas institucionais vividos com a suspensão do Paraguai, com a imprevisibilidade na gestão venezuelana e com os efeitos do contexto econômico da Argentina, que contribuíram para estagnar o comércio e acentuar a descrença sobre o bloco. Como resultado, o Mercosul não avança na agenda interna de liberalização e nem na externa de celebração de novos acordos.

No entanto, para a indústria brasileira não há como refutar a sua importância como destino de venda de bens industrializados e investimentos das empresas multinacionais. Neste primeiro ano do segundo mandato de Dilma Rousseff, há uma janela de oportunidade para revisão da agenda externa que ajude na melhoria desse quadro.

Surge daí naturalmente a pergunta: qual Mercosul interessa ao Brasil? Certamente um bloco que priorize uma agenda econômica e deixe em segundo lugar os temas políticos. Também um Mercosul que admita revisão de objetivos, para que sejam viáveis e não apenas peças de retórica, e que seja ambicioso em sua agenda de negociações, para melhor integrar-se ao comércio global.

O bloco que interessa é aquele que se prepara para apoiar os negócios, de forma a permitir a constituição de cadeias regionais de valor a partir de grandes empresas da região. Aquele que admita um nível de liberdade de políticas condizentes com a realidade econômica e comercial dos sócios.

Esse é Mercosul que atenderia ao setor privado e contribuiria mais para um maior desenvolvimento econômico do Brasil. A manutenção de metas difíceis de alcançar relativas ao Mercado Comum, e sobretudo da União Aduaneira, vem comprometendo, além da imagem e credibilidade, a capacidade de resposta institucional do bloco aos problemas do mundo dos negócios.

Durante a presidência do Brasil, no primeiro semestre deste ano, é imprescindível olhar de frente e com pragmatismo as dificuldades de convivência entre países com diferenças de políticas e de estratégias de desenvolvimento e partir para uma agenda realista. E não se trata de retrocesso.

Uma área de livre comércio que funcione, a celebração do protocolo de compras governamentais, normas e regulamentos técnicos harmonizados, liberdade na prestação de serviços intrarregionais e, sobretudo, uma área mais integrada ao mundo, são objetivos que, se atingidos, darão um importante salto de qualidade para o Mercosul. O Mercosul precisa, efetivamente, rever suas prioridades e de mais pragmatismo nas suas escolhas.

Artigo publicado nesta quinta-feira (28) no jornal Folha de S. Paulo

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