“Precisamos pensar o Brasil a longo prazo”, diz Robson Andrade

O empresário Robson Braga de Andrade explica que o Brasil precisa ser pensado a longo prazo, levando mais em conta os interesses da nação e da população do que interesses paroquiais ou setoriais

homem grisalho de terno e óculos olha e sorri
Nota editorial: os porta-vozes da Confederação Nacional da Indústria (CNI), SENAI (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e SESI (Serviço Social da Indústria) foram entrevistados para edição de outubro da Revista da Indústria, publicada originalmente em 31/10/2023, por isso os cargos refletem a organização do Sistema Indústria até esta data.

Após 13 anos como presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o empresário Robson Braga de Andrade deixou o cargo no final de outubro, com uma longa folha de serviços prestados à indústria e ao país.

Nessa entrevista exclusiva para a Revista da Indústria Brasileira, ele fala sobre os principais avanços da indústria no período. “Graças à alta qualificação das equipes da CNI, contribuímos para a aprovação de diversos projetos que ajudaram a melhorar o ambiente de negócios no país. Além disso, conseguimos colocar a inovação no centro das estratégias das empresas”, destaca.

Ele ressalta, também, a rede de institutos e inovação e tecnologia criada pelo SENAI e a modernização do sistema de ensino do SESI. “Tenho a sensação do dever cumprido, mas sei que há ainda muito a fazer, sobretudo a implementação de uma política industrial que aumente a competitividade do setor”, afirma. “Para isso, é essencial que nossas lideranças políticas e empresariais tenham visão de futuro e levem mais em conta os interesses da nação e da população”.

Quais os principais desafios enfrentados pela indústria ao longo do período em que o senhor esteve à frente da presidência da CNI?

O principal foi o inóspito ambiente de negócios, especialmente a complexidade do sistema tributário e a insegurança jurídica. Além de afugentar investimentos, esses fatores impedem o fortalecimento da indústria, que propaga efeitos positivos sobre o restante da economia, cria mais empregos e paga mais impostos e melhores salários. Em função disso, o crescimento do Brasil se reduziu drasticamente nas últimas décadas. A título de comparação, nos anos de 1970, crescemos a uma média anual de 8,6%, índice 1,4 vezes maior do que a média anual de crescimento da China.

Nos últimos 10 anos, a situação se inverteu de forma expressiva. Nesse período, o PIB brasileiro cresceu a uma média anual de apenas 0,5%, índice 12 vezes menor do que o crescimento de 6,2% da China. Para desenvolver de forma sustentável, precisaríamos crescer a uma média de, pelo menos, 4% ao ano. Eis um exemplo concreto de como ficamos para trás: hoje, o Brasil produz as mesmas 40 milhões de toneladas de aço que produzia na década de 1970.

A China, por sua vez, aumentou sua produção anual de 20 milhões para 800 milhões de toneladas. O fabuloso crescimento chinês se deveu aos maciços investimentos que o país fez em tecnologia, inovação e educação, incluindo a formação de engenheiros e técnicos, fundamentais para o desenvolvimento industrial.

Nas últimas décadas, o Brasil passou por um intenso processo de desindustrialização. O que precisa ser feito para viabilizar a retomada do setor?

Precisamos de uma política de desenvolvimento produtivo, com amplo apoio às indústrias, para que elas tenham condições de competir de igual pra igual com concorrentes de outros países e aproveitar as janelas de oportunidade abertas pela transformação digital e pela economia verde.

As principais economias do mundo já estão fazendo isso, com a mobilização de recursos bilionários para redimensionar suas cadeias produtivas e aumentar a competitividade de suas empresas.

A boa notícia é que o atual governo está empenhado em avançar nessa agenda. O fato de termos o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, à frente do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços é um bom indicativo nesse sentido.

Que medidas o senhor considera prioritárias?

É essencial agilizar a aprovação da reforma tributária. O texto aprovado na Câmara e que tramita no Senado traz importantes avanços. É preciso também que haja financiamentos de longo prazo, com taxas de juros bem mais baixas. A indústria precisaria de um Plano Safra, como o que subsidia a agropecuária. O Agro é pop, em parte, porque paga apenas 1,8% de impostos.

Já a indústria paga 34%, a despeito de representar 24% do PIB. Além disso, é responsável por 69% das exportações de bens e serviços e contribui para a competitividade do agronegócio, uma vez que fornece insumos, máquinas e equipamentos com alta tecnologia para o setor. Outras prioridades são os acordos comerciais, com destaque para o Mercosul–União Europeia, e o aumento de investimentos em pesquisa, tecnologia e inovação.

É inconcebível que o Brasil, décima potência mundial, ocupe apenas a 49ª posição no ranking global de inovação.

Quais conquistas ocorridas ao longo da sua gestão na CNI o senhor destacaria?

Nesse período, graças ao qualificado trabalho desenvolvido pelas equipes da CNI, contribuímos para a aprovação de diversos projetos que ajudaram a melhorar o ambiente de negócios. Destacaria as reformas trabalhista e da previdência, a lei da biodiversidade e avanços na infraestrutura, como os marcos legais do saneamento, dos portos e do gás.

Conseguimos também colocar a inovação no centro da estratégia das empresas, graças ao trabalho da Mobilização Empresarial pela Inovação (MEI). Ainda nesse campo, destaco a criação, pelo SENAI, da rede de 26 institutos de inovação e 60 de tecnologia, que prestam inestimável apoio para indústrias de todos os portes e regiões. O SESI, por sua vez, tem hoje o melhor sistema de ensino fundamental.

Além de um modelo pedagógico avançado, todas as suas escolas estão equipadas com equipamentos de alta tecnologia e oferecem aulas de robótica, que estimulam o raciocínio dos alunos.

O que, na sua visão, está faltando para que o Brasil entre, finalmente, na trilha do desenvolvimento econômico e social?


A meu ver, falta espírito público e visão de futuro de grande parte das lideranças políticas e empresariais do país. Precisamos pensar o Brasil a longo prazo, levando mais em conta os interesses da nação e da população do que interesses paroquiais ou setoriais. Sem mudanças estruturais, dificilmente conseguiremos nos desenvolver de forma sustentável, reduzir desigualdades sociais e regionais, e ter uma maior inserção na economia global.


Acho inacreditável, por exemplo, quando um governador ou prefeito fica contra a reforma tributária e alguns segmentos da economia não conseguem enxergar que ela tornará o sistema mais simples e menos oneroso.

O novo modelo, certamente, propiciará atração de investimentos, crescimento maior da economia e geração de mais empregos e renda para a população, beneficiando todos os segmentos empresariais, e da arrecadação, que possibilitará mais investimentos públicos em áreas fundamentais para o desenvolvimento 
econômico e social do país.

E com relação à CNI, que futuro o senhor vê para a entidade?

Com certeza, o futuro da CNI é muito promissor. Todos os integrantes da nova diretoria conhecem bem os entraves que impedem nossa indústria de ser mais competitiva e o que é preciso ser feito para superar os diversos desafios. Destaco, especialmente, o novo presidente, Ricardo Alban, que fez um excelente trabalho à frente da Federação das Indústrias da Bahia e é um empresário moderno e empreendedor.

Além disso, ele tem uma grande capacidade de articulação e um ótimo relacionamento com autoridades dos poderes Executivo e Legislativo, fator fundamental para a viabilização das agendas de interesse da indústria

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