Com o início do governo do democrata Joe Biden, Brasil e Estados Unidos encontram a oportunidade histórica para lançar uma agenda ambiciosa de acordos visando preparar o empresário brasileiro para um livre comércio.
Altamente integrados, os dois países têm diante de si um momento de convergência não apenas no cenário econômico, pela reciprocidade de valores e interesses, mas também no geopolítico. Com a disputa comercial e tecnológica cada vez mais acirrada com a China, é estratégico para o governo americano manter o Brasil, único país do BRICS nas Américas, como um aliado próximo.
“Temos duas economias integradas e com uma cadeia de valor sofisticada. É a primeira vez que temos uma janela como esta, de convergência do interesse geopolítico americano com os interesses econômicos dos setores privados dos dois países. O Brasil precisa ser pragmático e negociar os principais acordos com os Estados Unidos”, afirma Carlos Eduardo Abijaodi, diretor de Desenvolvimento Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
O setor privado tem grande expectativa para o início das negociações dos acordos para evitar a dupla tributação e de investimentos. Também defende o diálogo para a remoção de barreiras ao comércio e aos investimentos entre os dois países. Ao mesmo tempo, trabalha seguindo um roadmap de ações para se preparar para as negociações de um acordo de livre comércio.
Estudo da CNI elenca 350 produtos que o Brasil gostaria de começar a exportar ou ampliar suas vendas para os Estados Unidos, o que reflete a importância de um acordo com este país.
Os números mostram que, para 55% desses bens, os americanos impõem alguma barreira, sob a forma de tarifas ou cotas. Esses produtos estão distribuídos em diferentes setores, desde alimentícios e químicos, passando por automotivos, até madeira, couro e calçados.
Os Estados Unidos também têm um mercado significativo em compras governamentais e o acesso a esse mercado, com a eliminação de margens de preferência, seria outro passo importante na relação com o Brasil.
A CEO da Câmara Americana de Comércio (Ancham Brasil), Deborah Vieitas, afirma que o primeiro passo para a celebração de um acordo comercial mais amplo foi dado, em outubro, com o anúncio dos acordos de facilitação de comércio e de boas práticas regulatórias.
A seu ver, embora importantes, esses compromissos não esgotam a pauta de negociação com os Estados Unidos. Deborah cita pautas não tarifárias, como barreiras sanitárias e fitossanitárias, compras públicas, propriedade intelectual e comércio eletrônico.
“É fundamental que haja vontade política tanto dos governos quanto do Congresso brasileiro para avançarmos em temas não tarifários e caminharmos para o livre comércio”, afirma.
Para Deborah, o Brasil também tem a oportunidade para desenvolver a cooperação com os americanos em temas como bioeconomia, saúde e defesa. “Temos campos excepcionais de cooperação com os Estados Unidos”, afirma.
Brasil precisa de estratégia de longo prazo para internacionalização das empresas
Para Marco Stefanini, CEO e fundador da Stefanini IT Solutions e co-presidente do setor privado brasileiro no Fórum de Altos Executivos Brasil-Estados Unidos, o estreitamento dos laços com os Estados Unidos deve começar de uma postura da própria indústria brasileira.
A seu ver, as empresas precisam aprimorar seus processos e investir em tecnologia para se tornar mais competitivas. Stefanini considera que avançar nessa agenda demanda uma visão de longo prazo no que diz respeito à estratégia de internacionalização das empresas.
“É fundamental também desenvolvermos nosso marketing como país e como setor empresarial. Grande parte de nossas exportações é de commodities. Para avançar no mercado americano, precisamos consolidar um nome, uma marca para a nossa indústria.
Por exemplo, nos Estados Unidos, eu não trabalho subcontratado para outra empresa, eu tenho a minha própria marca”, diz Stefanini. A empresa tem três centros de serviços e atende cerca de 80 clientes em solo americano.
Brasil e Estados Unidos são parceiros importantes e de longa data nas áreas de comércio e de investimentos. Apenas em 2019, os dois países registraram uma corrente de comércio de US$ 59,8 bilhões.
Os Estados Unidos são o principal destino das exportações brasileiras de industrializados desde 2014. Ao todo, o país é destino de 24% dos produtos manufaturados brasileiros. Manufaturados de ferro ou aço, aviões e celulose figuram entre os principais itens vendidos para os americanos.
O investimento estrangeiro direto dos Estados Unidos no Brasil, no acumulado de 2015 a 2018, foi de US$ 421 bilhões. No mesmo período, o Brasil aportou US$ 76 bilhões no país americano.
Os números mostram ainda que cada US$ 1 bilhão exportado para os Estados Unidos sustenta, ao longo de toda a cadeia de produção, nada menos que 32,6 mil empregos por ano no mercado brasileiro.