Uma coalizão pela melhoria da segurança jurídica no Brasil

Índice recém-lançado mostra cenário preocupantes para o ambiente de negócios no país, mas aponta uma oportunidade para o futuro para aqueles que acreditam no Brasil

martelo do juiz na mão juízes é colocado em uma mesa no escritório do advogado e é frequentemente usado antes de veredictos são lidos para os queixosos, e réus no tribunal

A segurança jurídica é condição essencial para que um país possa crescer com consistência. Sem ela, o risco se torna um fator dominante nas decisões de investimento, planejamento e inovação.

No Brasil esse pilar fundamental encontra-se em um nível preocupante - e não há solução simples para revertê-lo. Como lembram os professores Paulo Furquim Azevedo e Luciana Young, do Insper, referências na análise econômica do direito, decisões estratégicas de empresas e indivíduos se baseiam, sobretudo, em avaliações de risco.

Portanto, qualquer país que almeja um cenário de desenvolvimento contínuo, bom ambiente de negócios e investimentos relevantes de médio e longo prazos, necessita de segurança jurídica. Nesse contexto, ganha destaque o recém-lançado Índice de Segurança Jurídica e Regulatória (Insejur), desenvolvido pelo JOTA com base em metodologia robusta e inspirada na análise econômica do direito.

O índice oferece um panorama inédito - e necessário - sobre a qualidade do ambiente institucional brasileiro. Com apenas 35 pontos em uma escala de 0 a 100, o Brasil ainda está longe do patamar desejável para um país que almeja protagonismo global em desenvolvimento sustentável, inovação e atração de capital de longo prazo.

Esse resultado acende um sinal de alerta. Ele não apenas evidencia a fragilidade da segurança jurídica no país, como também indica riscos reais à estabilidade institucional e à previsibilidade regulatória — elementos fundamentais para a construção de um ambiente de negócios saudável.

Na prática, quando regras são alteradas de forma arbitrária ou imprevisível, a capacidade de planejar e investir é severamente afetada. Em uma metáfora clara: muitas vezes, as regras do jogo são incertas ou mudam com a partida em andamento. É isso que chamamos de insegurança jurídica.

A gravidade desse cenário é confirmada pelos dados do Insejur, que foi construído com base em 350 respostas de representantes das maiores empresas em atuação no Brasil. A pesquisa mostra que 87% dos executivos afirmam que a insegurança jurídica compromete o planejamento de longo prazo. Ou seja, ao invés de concentrar esforços na construção do futuro, as empresas se veem obrigadas a reagir às incertezas do presente — um custo alto para toda a sociedade. São dados preocupantes, mas também um convite à ação.

Uma das raízes desse cenário está no próprio processo legislativo. Mesmo após mais de 35 anos de vigência, a Constituição Federal ainda carece de regulamentação em cerca de 40% de seus dispositivos. Ao mesmo tempo, o país convive com um excesso de leis e com contradições frequentes entre normas federais, estaduais e municipais.

O Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) revela que, entre 1988 e outubro de 2016, foram editadas mais de 5,4 milhões de normas no Brasil — uma média de 769 por dia útil. Esse número expressivo, somado à frequência com que leis são consideradas inconstitucionais, contribui para a sensação de confusão e incerteza jurídica.

Esse cenário é percebido com clareza pelo setor produtivo. Segundo o Insejur, 86% dos respondentes apontam que o Legislativo contribui para a insegurança jurídica ao produzir normas pouco claras. Essa crítica encontra eco no deputado Marcos Pereira, primeiro vice-presidente da Câmara dos Deputados.

De acordo com artigo de Pereira, dados do Supremo Tribunal Federal reforçam a gravidade do problema. Em 2015, de cada dez leis analisadas, sete foram consideradas inconstitucionais. Em 2016, mais da metade das normas questionadas foram retiradas do ordenamento jurídico. Em 2017, oito em cada dez leis julgadas no mérito foram total ou parcialmente invalidadas. E, em 2018, das 200 ações analisadas, 134 foram consideradas procedentes. Ou seja, para cada norma validada, duas foram consideradas incompatíveis com a Constituição.

É como costumamos escutar muito, infelizmente, de boa parte do nosso empresariado: no Brasil até o passado é incerto.

A boa notícia é que esse cenário representa, também, uma oportunidade para o país. Quase 80% dos respondentes do Insejur afirmam que o fortalecimento da segurança jurídica atrairia mais investimentos para o Brasil. O Brasil tem ativos únicos, capital humano qualificado e enorme potencial de transformação.

Garantir a previsibilidade institucional é um requisito decisivo nessa jornada, afinal a previsibilidade jurídica é condição essencial para enfrentar os desafios das transformações tecnológicas e das novas dinâmicas sociais e econômicas.

Diante disso, é urgente estabelecer uma agenda estruturada que meça e, por meio do aprimoramento da segurança jurídica, promova estabilidade, clareza normativa e confiabilidade das decisões estatais.

Convidamos empresas, representantes do Estado e da sociedade civil, em um gesto de responsabilidade e visão de futuro, a se juntarem à coalizão formada para a melhoria da segurança jurídica no país, em um movimento de protagonismo por uma nova etapa de desenvolvimento sustentável. O futuro não pode mais esperar, o momento de agir é agora.

O artigo foi assinado por: 
* Alexandre Vitorino Silva é diretor jurídico da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

* Marcelo Lacerda é diretor de relações governamentais do Google.
* Renato Porto é presidente da Interfarma.
* Rodolfo Araújo é diretor jurídico e tributário do IFood.
* Vicente de Chiara é diretor jurídico da Febraban.

O artigo foi publicado no Estadão, no dia 25 de julho.

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