A negociação coletiva entre empresas e trabalhadores, consagrada na Constituição de 1988, permite a adequação das condições de trabalho a realidades específicas. Atende aos interesses de empresas e de empregados conforme as necessidades diretas das duas partes, buscando maior competitividade, com efeitos positivos na manutenção e na oferta de emprego. Trata-se, portanto, de um jogo de ganha-ganha.
As organizações sindicais vinculadas ao setor industrial firmaram, em 2012, mais de 3 mil convenções coletivas (acertos entre sindicatos de trabalhadores e sindicatos de empresas) e as empresas, mais de 18 mil acordos coletivos (acertos entre sindicatos de trabalhadores e cada empresa específica). Acertaram centenas de milhares de cláusulas que tratam das condições de trabalho e das necessidades operacionais das empresas.
Os números comprovam o poder de negociação dos trabalhadores. Não se busca, na negociação coletiva, suprimir direitos trabalhistas ou reduzi-los, mas estipular condições de trabalho em conformidade com as circunstâncias de um determinado período.
A Justiça do Trabalho, contudo, insiste em interferir nos instrumentos coletivos, invalidando as negociações e, dessa forma, desestimulando um mecanismo eficaz das relações de trabalho e criando enorme insegurança jurídica. Intromete-se em contratos livremente negociados inspirada numa argumentação anacrônica: a premissa da chamada hipossuficiência do trabalhador, isto é, a de que ele tem pouca ou nenhuma condição de negociar.
Essa premissa podia ser válida há 70 anos, quando foi criada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Passadas sete décadas, o Brasil se transformou na 7.ª economia mundial, as entidades sindicais se fortaleceram a tal ponto que deram um presidente da República eleito por dois mandatos e a organização da produção mudou radicalmente. Continua, porém, a prevalecer nos legisladores trabalhistas nativos a velha e ultrapassada premissa da hipossuficiência.
Casos frequentes da interferência indevida da Justiça do Trabalho em contratos coletivos ocorrem, por exemplo, na fixação da pausa para o almoço, conhecida na lei como intervalo intrajornada para repouso. A CLT o estabelece em no mínimo 1 hora e no máximo 2 horas nas jornadas superiores a 6 horas, e permite a redução por autorização do Ministério do Trabalho. Em duas portarias o ministério concorda com a redução por negociação coletiva. É do interesse do trabalhador largar mais cedo e da empresa organizar da melhor forma possível a linha de produção. É, pois, comum as duas partes fixarem, em acordo coletivo, o intervalo que melhor atende todos, muitas vezes no limite de até meia hora.
O Tribunal Superior do Trabalho (TST), contudo, tem anulado esse dispositivo em nome da segurança e da saúde do trabalhador. Na prática, acaba atuando contra a vontade dos próprios trabalhadores que alega proteger. Ou seja: dá um tiro no pé. Essa contradição é tão flagrante que o ministro do Trabalho, Manoel Dias, e as centrais sindicais foram, juntos, à presidência do TST, em junho do ano passado, solicitar que o tribunal não interferisse nesse tipo de cláusula.
Outro exemplo do desestímulo às negociações coletivas é a alteração da Súmula 277 do TST, dispondo que as cláusulas dos instrumentos coletivos integram os contratos individuais de trabalho e só poderão ser modificadas ou suprimidas mediante nova negociação coletiva. Esse entendimento, além de contrariar texto de lei, pois a CLT dispõe de forma expressa, no artigo 614, que os instrumentos coletivos têm vigência determinada (até dois anos), é um grande retrocesso.
O respeito às negociações coletivas livremente estipuladas é essencial à modernização das relações trabalhistas e absolutamente necessário num país inserido na globalização e, por isso, impelido à guerra feroz da competitividade. A Justiça trabalhista precisa também modernizar sua tutela.
*Alexandre Furlan é empresário e presidente do Conselho de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
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