Novo Marco legal do saneamento e o futuro da infraestrutura no país

Em artigo publicado nesta sexta-feira (17), no jornal Valor Econômico, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, explica propostas essenciais para impulsionar a infraestrutura e proporcionar o início de um novo ciclo de crescimento econômico

Os empreendimentos em infraestrutura serão decisivos para a retomada da economia brasileira após a pandemia da Covid-19. Porém, para atrair novos investimentos privados, é fundamental que sejam destravadas algumas amarras que, historicamente, têm impedido o Brasil de avançar nessa área. É preciso, por exemplo, aprovar os cerca de dez projetos de lei que atualizam marcos legais do setor, primordialmente na área de licitações e outorgas. A redução dos riscos legais, regulatórios e relativos ao ambiente de negócios também é essencial para atrair capital privado.

Um importante passo nessa direção foi a aprovação, pelo Congresso Nacional, do novo marco legal do saneamento básico, que viabilizará um choque de eficiência nas diversas empresas estatais de saneamento, que, atualmente, são responsáveis pelo atendimento de água e esgoto de mais de 90% dos municípios brasileiros. Além disso, abre espaço para a iniciativa privada atuar na exploração do setor, e institui um regime de licitações, com potencial para atrair grandes investimentos e a geração de, pelo menos, um milhão de empregos em cinco anos.

O modelo atual, baseado em contratos celebrados sem licitação entre estados e municípios, não tem sido capaz de expandir a prestação dos serviços de maneira satisfatória. O novo marco legal melhora a qualidade das regras, ao estabelecer a Agência Nacional de Águas (ANA) como responsável pela regulação do setor, e aumenta a segurança jurídica, ao esclarecer a titularidade nos casos de interesse comum.

Outra medida urgente é a continuidade dos programas de concessões e Parcerias Público-Privadas (PPP) da União e dos estados. No âmbito federal, a carteira tem mais de 100 projetos, com destaque para a concessão de 22 aeroportos, duas ferrovias, oito rodovias e 12 terminais portuários, além da privatização das companhias Docas de Santos (SP) e do Espírito Santo. A retomada de obras públicas paradas é também uma grande oportunidade para resolver gargalos existentes.

O Brasil investe pouco em infraestrutura, e parte dos investimentos acaba imobilizada em obras paralisadas, que consomem vultuosos recursos e não geram benefícios para a população que as financia por meio do pagamento de impostos. De acordo com o governo federal, atualmente existem cerca de 6 mil obras públicas federais interrompidas ou com início adiado. São projetos em diversos setores, como saneamento básico, transportes, energia e urbanização, que somam investimentos da ordem de R$ 42 bilhões.

No campo da energia elétrica, existem três importantes propostas tramitando no Congresso Nacional. O atual modelo apresenta claros sinais de desgaste, com problemas no planejamento e na gestão dos mercados, que desestabilizaram o segmento, gerando custos adicionais, crescente judicialização e passivos financeiros que recaem sobre os consumidores. O Projeto de Lei 232/2016 propõe um marco legal e estabelece normas para ampliar o mercado livre de energia e viabilizar uma nova estrutura de negócios.

Já o Projeto de Lei 3.975/2019 visa solucionar o problema sistêmico do risco hidrológico, que impõem riscos excessivos aos agentes do setor elétrico, devido às diferenças entre suas obrigações contratuais e as respectivas produções de energia. Tal exposição a liquidações no mercado de curto prazo causa grandes passivos e sujeita empresas a processos judiciais. Segundo o Ministério de Minas e Energia, em 2019 esse problema gerou um custo de R$ 11 bilhões. Outra prioridade nessa área é o PL 5.877/2019, que permite a capitalização da Eletrobras, um projeto muito importante para o país, porque a companhia precisa ter a possibilidade de investir sem as amarras do controle público e com a agilidade do setor privado. 

No setor de gás natural, o mercado aguarda a aprovação do PL 6.407/2013, que quebra monopólios vigentes. O texto nos aproxima dos padrões de competição e de preço internacionais. Em 2019, a média da cotação do gás, no Brasil, foi de US$ 12 a 13,50 por milhão de BTUs – mais do que o triplo dos US$ 3,50 nos Estados Unidos, e quase o dobro dos US$ 7 na Europa. Os valores aqui são mais altos até mesmo do que os do Japão, que importa 100% do gás que consome. Lá, a média está em torno de US$ 9.

As legislações estaduais do gás natural também devem ser alteradas para viabilizar a quebra do monopólio na distribuição. Também significativo para a modernização da infraestrutura, o PL 3.178/2019 propõe alterações no regime de partilha de produção de petróleo em áreas do Pré-sal. O texto moderniza a legislação atual, ao revogar o direito de preferência da Petrobrás nas licitações do regime de partilha de produção. O projeto prevê, entre outras medidas, a realização de outorgas de concessão.

No setor de transportes, os investimentos federais vêm caindo desde 2010. Em 2019, o total aportado nesse segmento foi de apenas R$ 8,3 bilhões em todo o Brasil. Somos um país rodoviário, com 24% da malha federal pavimentada em estado ruim ou péssimo – situação que deve piorar com a crise gerada pela pandemia. No setor ferroviário, o PLS 261/2018 permite a realização de outorgas de autorização para o funcionamento de ferrovias, especialmente em trechos curtos e conectados à malha atual. A operação dessas ferrovias, conhecidas como shortlines, aumentaria os investimentos, a integração e a utilização da malha. Nos EUA, existem 550 trechos de shortlines, que somam 80 mil km de extensão ou quase 30% da rede do país.

Na área ambiental, o PL 3.729/2004 estabelece regras claras e dá mais agilidade ao licenciamento. O projeto traz soluções para alguns dos principais problemas nessa área, como excesso de procedimentos e superposição de competências, falta de clareza na condução dos processos e atuação discricionária dos agentes. Por fim, a proposta tenta combater a atual insegurança jurídica, que afeta os empreendimentos mesmo após a obtenção das licenças.

Todas essas propostas são essenciais para impulsionar a infraestrutura e proporcionar o início de um novo ciclo de crescimento econômico. Adicionalmente, como são projetos que utilizam mão de obra intensiva, poderão também ajudar a reduzir os elevados índices de desemprego. A solução dos atuais obstáculos, entretanto, passa pelo aumento da participação da iniciativa privada, tanto nos investimentos quanto na gestão da operação. Temos certeza de que o Congresso Nacional dará seguimento à discussão e à aprovação dos diversos projetos, contribuindo para a melhora do ambiente de negócios e a recuperação da economia no pós-pandemia.  

O artigo foi publicado no jornal Valor Econômico, nesta sexta-feira (17).

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